
A Justiça de São Paulo condenou sete empresas e seis pessoas por improbidade administrativa pelo acidente ocorrido em 2007 na obra do Metrô da Linha 4-Amarela – privatizada – na Estação Pinheiros, Zona Oeste da capital paulista, em janeiro de 2007. A decisão é da 5ª Vara da Fazenda Pública da capital paulista e foi divulgada nesta sexta-feira (16). Cabe recurso.
A tragédia foi registrada no dia 12 de janeiro. Sete pessoas morreram soterradas e mais de 90 imóveis tiveram que ser demolidos devido a danos estruturais causados pelo desmoronamento. As empresas condenadas, conforme o Tribunal de Justiça (TJ), são as construtoras responsáveis pela obra e os dirigentes do metrô na época.
As empresas Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Camargo Côrrea, Andrade Gutierrez e Alstom, que formavam o consórcio Via Amarela que implantou o projeto, foram condenadas a ressarcir a Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) em R$ 6,5 milhões; pagar indenização a título de danos morais coletivos no valor de R$ 232 milhões; e pagar indenização a título de danos patrimoniais difusos no valor de R$ 1,2 milhão.
O juiz Marcos de Lima Porta, da 5ª Vara de Fazenda Pública, condenou Luiz Carlos Frayze David, presidente do Metrô à época, Marco Antonio Buoncompagno, gerente da obra, José Roberto Leito Ribeiro (chefe do departamento de construção da Linha 4), Cyro Guimarães Mourão Filho (coordenador, Jelson Antonio Sayeg de Siqueira e German Freiberg, que eram engenheiros que fiscalizavam a obra.
As sanções aplicadas pela Justiça implicam ainda na perda da função pública dos condenados, suspensão dos direitos políticos por cinco anos e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo mesmo prazo.
O juiz Marcos de Lima Porta, autor da sentença, considerou que houve indícios de irregularidades na condução da obra. “As perfurações foram executadas no local já fragilizado, e os suportes de sustentação previstos não foram colocados de imediato. Tal procedimento revelou-se além de perigoso, negligente e claramente expôs o local ao risco iminente de colapso”, escreveu o magistrado.
A decisão aponta também que “ficou configurado que as perfurações foram decorrentes de uma tentativa de adiantar o processo da obra, o que afasta a alegação de falta de conhecimento dos requeridos e a imprevisibilidade do incidente”. “Era de conhecimento geral a existência de ‘não conformidades’ e do recalque abrupto do maciço; ainda que esses tenham sido deliberadamente subestimados, a conduta adotada é inaceitável diante de uma obra grandiosa, de vulto social importante e de relevante repercussão para a coletividade”, destacou o juiz.
TRAGÉDIA
Em 2007, o acidente ocorreu no local onde estava sendo construída a Estação Pinheiros. Morreram soterrados o motorista de um caminhão que trabalhava na construção do Metrô, o motorista e o cobrador de um micro-ônibus tragado pela cratera, dois passageiros do coletivo e dois pedestres que passavam pelo local.
Quatorze funcionários da Linha 4 e do Metrô tornaram-se réus na Justiça, mas ninguém foi condenado. A Justiça absolveu, em novembro de 2016, todos os responsáveis pela obra. Dez anos depois da maior tragédia em uma obra do metrô no país, ainda havia casas com problemas na região.
Na ocasião, 55 imóveis foram interditados – 10 deles foram condenados e 3 tiveram que ser demolidos e 79 famílias foram desalojadas. O Consórcio Via Amarela e o Metrô só se responsabilizaram por danos causados a habitações que ficam em um raio de 50 metros do centro da cratera.
“O apartamento em que eu morava, na época, valia uns R$ 300 mil e a prefeitura me deu R$ 90 mil”, relatou ao iG o corretor de imóveis Antônio Manuel Dias Teixeira. “Depois, o Metrô me deu R$ 10 mil ou R$ 20 mil pelos móveis que eu perdi.”
O valor da indenização não garantiu a compra de outro imóvel pelo corretor. “Como resultado, não consegui comprar nada, perdi meu apartamento e hoje eu pago aluguel. A minha mulher não quis ficar no lugar que eu estou ficando, porque é um cubículo, foi embora e voltou para a cidade dela no interior com a minha filha. Minha vida virou de cabeça para baixo”, acrescenta.
Zelma Fernandes Marinho, outra moradora da área próxima às obras, disse ao portal que as grandes fissuras que surgiram nas paredes da casa onde ela morava começaram ainda durante a construção da estação. Ela disse ainda que relataram o problema aos responsáveis, mas nada foi feito. “As rachaduras apareceram logo que as obras foram iniciadas, por volta de agosto ou setembro de 2006. Nós procuramos o pessoal do Metrô, que encaminhou a gente para falar com os responsáveis pela Linha Amarela e comunicamos o que estava acontecendo.”
“A Defesa Civil nunca mais se interessou em procurar os moradores para ver como é que está a situação ou o que aconteceu, então está tudo parado. Nós abrimos um processo contra o Metrô e a Linha Amarela”, conta Zelma. “A ação já foi julgada e eles foram condenados, mas grandes empresas têm o aval de continuar com recursos, então estamos aguardando.”
As rachaduras nas paredes do dormitório e dos fundos da casa continuaram aumentando devido ao abalo causado pelos trens. Um quarto da residência foi interditado na época pela Defesa Civil e até 2022 permanecia do mesmo jeito.
CONTRATO PORTEIRA FECHADA
O Metrô de São Paulo afirmou que a obra estava “completamente segurada, possibilitando a cobertura a todos os prejuízos causados pelo acidente ocorrido em 2007 e também a indenização a todas as pessoas e empresas prejudicadas por parte do consórcio de empreiteiras responsável pelas obras”. A Companhia disse ainda que “todo o processo foi acompanhado e intermediado pelo Governo do Estado que, assim como o Metrô, não foi parte do processo judicial”.
Á época, o presidente do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Altino Prazeres, denunciou que o afastamento do Metrô no monitoramento das obras enfraqueceu o rigor na fiscalização, inclusive das obras da Linha Amarela. “Antes, todas as obras eram fiscalizadas pelos metroviários. Agora, parte das obras dos monotrilhos e mesmo da linha Amarela ficam sob fiscalização da própria empreiteira que está operando. E onde ainda podemos atuar, nosso poder de fiscalização foi bastante reduzido”, afirmou.
O laudo do Instituto de Criminalística (IC) sobre o desabamento constatou que vários fatores contribuíram para a tragédia, mas a causa determinante, segundo os peritos, foi a não interrupção das obras um dia antes do acidente, quando foram identificadas anormalidades no terreno. Outro laudo, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), solicitado pelo Metrô, também revelou falha nas análises e sondagens do terreno, que começou a ceder com o avanço das escavações no fim de dezembro de 2006. Apesar disso, as obras foram aceleradas e as detonações de explosivos não pararam.
A Linha 4-Amarela foi inaugurada em 2010, com 12,8 quilômetros de extensão e 11 estações, ligando a Estação da Luz, no centro de São Paulo, ao bairro da Vila Sônia, na zona oeste.