
A decisão da Quarta Auditoria da Justiça Militar de São Paulo afirma que o pisão de um PM no pescoço de uma mulher negra, ocorrido em maio de 2020, durante uma ocorrência na Zona Sul de São Paulo, foi um procedimento “não criminoso e é necessário”, que não produziu “qualquer lesão na vítima”.
“Também foi considerado que, embora tecnicamente incorreta, e passível de apreciação administrativa-disciplinar, a postura do acusado Servato em colocar o pé sobre as costas/pescoço [da vítima] não produziu qualquer lesão na civil, nem mesmo um edema ou eritema. Tal procedimento é indesejável mas, ante as condições de inferioridade numérica dos policiais, foi avaliado como não criminoso e necessário em razão de tudo o que ali ainda estava ocorrendo e que não foi filmado”, diz um trecho da decisão.
O policial militar que pisou na mulher foi absolvido. A decisão, de 30 páginas, foi publicada na última terça-feira (30). Os oficiais que votaram a favor de absolver o policial militar disseram em seus votos que aquela “foi a forma que, em virtude de um desgaste físico e emocional, apresentou-se para o policial cumprir a sua missão de conduzir a mulher negra para o Distrito Policial”.
Para Felipe Morandi, advogado da vítima, a alegação sobre o desgaste físico e emocional do policial é estapafúrdia e excede os limites do razoável.
“O policial é (ou deveria ser) treinado física e psicologicamente para lidar com situações de enfrentamento que envolvam qualquer que seja. Não podem usar um suposto desgaste físico para praticar uma brutalidade como aquela, sem qualquer necessidade ou razão aparente”, diz.
Morandi afirma que a tese defendida pelos oficiais a favor da absolvição, na verdade, ridiculariza a corporação. “É um acinte à inteligência do leitor”, disse.
O caso foi registrado em 30 de maio de 2020, durante uma abordagem em Parelheiros, no extremo sul da cidade de São Paulo. Após o julgamento, a vítima relatou o dano psicológico causado pela violência e disse ter vergonha de ser brasileira por conta da injustiça.
O Ministério Público Estadual tem, por lei, até a próxima segunda-feira (5) para interpor recurso, o que já anunciou que fará, logo após o julgamento, no dia 23.
GEORGE FLOYD
A mulher negra imobilizada disse na época que, quando estava no chão sendo imobilizada por um policial, achou que iria ser sufocada e morrer naquele momento como morreu George Floyd em uma ação policial nos Estados Unidos.
“Achei que iria ser morto como ele [George Floyd]. Eu estava no chão e lembrava daquela cena dele. Achei que iria morrer ali”, disse a mulher.
Floyd morreu em 25 de maio de 2020. O policial Derek Chauvin apertou o pescoço da vítima com o joelho durante 9 minutos e meio e matou Floyd. O homem era suspeito de pagar uma conta com uma nota de US$ 20 falsificada.
O assassinato de Floyd, um homem negro, provocou protestos em cidades ao redor do mundo contra a brutalidade policial e o racismo.
A condenação de Chauvin foi vista como uma repreensão histórica ao uso desproporcional da força policial contra os negros norte-americanos.