“Antes do pré-sal, a Petrobrás descobriu ao longo de sua história cerca de 20 bilhões de barris de petróleo convencional. Hoje [28/09], eles entregaram o equivalente a todo o esforço do que foi feito desde 1953, de 65 anos de esforço do povo brasileiro. Em um governo de marginais, no estertor da sua existência, tiveram a ousadia de perpetrar esse crime contra o país”, afirmou ao HP o vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP e ex-diretor de Gás e Energia da Petrobrás, professor Ildo Sauer, ao avaliar a 5ª rodada de licitação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), sob regime de partilha no pré-sal.
No último dia 28/09, o governo Temer entregou 15,71 bilhões de barris de petróleo do pré-sal para o controle das multinacionais, de um total estimado em 17 bilhões de barris, localizados em quatro áreas nas bacias de Campos e Santos (Saturno, Titã, Pau Brasil e Sudoeste de Tartaruga Verde), no 5º leilão de privatização no pré-sal.
A Petrobrás ficou com apenas 1,29 bilhão de barris de óleo, de Sudoeste de Tartaruga Verde. A maior parte ficou com as norte-americanas ExxonMobil e Chevron, a anglo-holandesa Shell e a britânica BP, do cartel internacional do petróleo.
“É um dia de luto para o povo brasileiro. Não é aceitável que um governo ilegítimo, que não tem a mínima aceitação da população, faça isso a sete dias das eleições presidenciais. É uma ousadia que só gângsters e criminosos são capazes de perpetrar. É submissão aos interesses estrangeiros, que tira e violenta a possibilidade de qualquer governo legítimo exercer uma soberania mínima sobre este recurso [petrolífero] e coordenar a atuação do Brasil junto a demais países para obter o máximo de benefícios econômicos e sociais que o excedente de petróleo pode permitir”, acrescentou.
Para o professor da USP, a estatal teve um “papel retraído” no 5º leilão: “Foi uma vergonha”.
Segundo Sauer, “a maior parte das estimativas do pré-sal é subestimada. Quando se perfura dá sempre mais. São leilões criminosos e têm de ser anulados”.
Ele alertou para o poder político “que essa gente” vai adquirindo com o poderio do domínio do petróleo: “Eles passam a atuar com seus braços políticos, financiados por essas empresas para subjugar o Congresso, para subjugar a oposição e subjugar qualquer movimento de autonomia. O crime maior não está só no crime econômico de entregar a reservas e subtrair de um governo legítimo o exercício de soberania sob a sua produção, mas está no fato em que em todos os países em que as empresas petrolíferas atuam elas utilizaram qualquer recurso para fazer valer o seu interesse. Basta ver o que foi feito com Mossadegh no Irã”.
Com efeito, em 1953, a Inglaterra e os Estados Unidos derrubaram o governo democraticamente eleito de Mohammed Mossadegh, após este ter nacionalizado o petróleo dois anos antes.
“Quanto mais se abre espaço, mais elas [multinacionais] crescem. Então, um governo criminoso está não só hipotecando o futuro econômico do petróleo, mas o futuro político do Brasil, que terá dificuldades, que nós já antevemos, de lidar com a força política que o poder econômico de quem comanda reserva desse tipo faz”, frisou Sauer.
“Estão criando um mostro econômico e político a partir do poderio econômico que essas empresas [múltis do petróleo] vão passar a exercer aqui dentro, criando seus vassalos, colocando em tudo que é lugar da política, do Congresso, dos ministérios e na imprensa, para defender essa visão de mundo. Quanto mais se entrega o petróleo, mais se perde a autonomia e a soberania do povo brasileiro”.
“Um governo decente que surgir depois das eleições tem a obrigação de reverter isso tudo”, concluiu Sauer.
VALDO ALBUQUERQUE