A moral que prevalece na 2ª turma do STF
Para ele, “são réus que não apresentam nenhum perigo à ordem pública”
Ao votar – na terça-feira, 21, em sessão da segunda turma do Supremo Tribunal Federal (STF) – por manter soltos o petista José Dirceu e o pepista João Cláudio Genu, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou o seguinte:
“São réus que não apresentam a menor periculosidade, não apresentam nenhum perigo à ordem pública, não quebraram a paz social.”
Lewandowski é um notório representante do PT no STF, especialista em torcer a lei – como se viu durante o julgamento de Dilma no Senado –, dos modos mais toscos e bizarros, em prol dos interesses de seu grupo.
Esse “fundamento” para manter fora da cadeia Dirceu e Genu – dois ladrões do dinheiro público, sobre os quais não pairam dúvidas a respeito de sua culpa – é típico da moralidade petista, e, por consequência, da teoria jurídica (cáspite!) de mesmo cunho. Fazer política e roubar são a mesma coisa. Não foi isso o que Lula disse (“eles [os procuradores da Lava Jato] não sabem como é fazer política“)?
Dirceu foi condenado, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), a 30 anos e 9 meses de cadeia por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Ficou provado, pelas transferências de dinheiro e pelas confissões – inclusive dos donos da Engevix, sem qualquer “delação premiada” – que Dirceu recebeu R$ 15 milhões (quinze milhões de reais) em propinas, oriundas do sobrepreço e superfaturamento imposto à Petrobrás. Um dos repasses de propina montou a R$ 1 milhão.
Por isso, foi condenado, em primeira e segunda instâncias. Segundo a jurisprudência aprovada três vezes pelo STF, a condenação em segunda instância demanda a sua prisão para cumprimento da pena.
Mas foi exatamente isso que o trio da segunda turma do STF – Lewandowski, Dias Toffoli e Gilmar Mendes – atropelou: a lei e o Supremo.
Além disso, Dirceu instalou, em conluio com a quadrilha de Sérgio Cabral, um esquema de corrupção nos fundos de pensão das estatais, através de seu chefe de gabinete, Marcelo Sereno, também secretário nacional de comunicação do PT.
Quanto à João Cláudio Genu – que, com o falecido deputado Janene (PP-PR), controlava a diretoria de Abastecimento da Petrobrás (através de Paulo Roberto Costa) – foi condenado, também em primeira e segunda instância, por corrupção passiva e associação criminosa.
Genu recebeu R$ 3 milhões (três milhões de reais) em propinas, no assalto à Petrobrás.
O TRF-4 condenou-o a 9 anos e 4 meses de cadeia, que, também, já deveria, segundo a jurisprudência do próprio STF, estar cumprindo.
Porém, Lewandowski – e seus cúmplices na segunda turma do STF, Dias Toffoli e Gilmar Mendes – considera que Dirceu e Genu “são réus que não apresentam a menor periculosidade, não apresentam nenhum perigo à ordem pública, não quebraram a paz social”.
Deveriam, portanto, receber uma medalha por roubar o povo.
CRIMES
Dirceu foi condenado, especificamente, por receber propinas da Engevix nos seguintes contratos da Petrobrás:
1) Contrato para construção dos módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas, em Linhares, Espírito Santo.
2) Contrato para obras na unidade de propeno, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas, em Araucária, no Paraná.
3) Contrato para obras nas unidades de recuperação de enxofre e de tratamento de gás na Refinaria Presidente Bernardes, em Cubatão, São Paulo.
4) Contrato para obras de implementação das tubovias e interligações da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves, no Recôncavo Baiano.
5) Contrato para a execução de obras na “unidade de reforma catalítica” da Refinaria Presidente Bernardes.
As propinas para Dirceu foram comprovadas por dezenas de repasses de dinheiro da Engevix.
Esses repasses continuaram, inclusive, quando Dirceu estava na cadeia, condenado pelo caso denominado “mensalão”. Isso fez o juiz Moro, que o condenou em primeira instância, escrever:
“O mais perturbador, porém, em relação a José Dirceu de Oliveira e Silva consiste no fato de que recebeu propina inclusive enquanto estava sendo julgado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal a Ação Penal 470, havendo registro de recebimentos pelo menos até 13/11/2013. Nem o julgamento condenatório pela mais Alta Corte do País representou fator inibidor da reiteração criminosa, embora em outro esquema ilícito. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada, o que também deve ser valorado negativamente.”
IMPUNIDADE
No último dia 27 de junho, o trio petucano da segunda turma do STF – Lewandowski, Toffoli e Gilmar Mendes – concedeu habeas corpus “de ofício” (ou seja, sem que a defesa solicitasse) para soltar José Dirceu.
A proposta foi de outro petista, o ex-advogado de Lula, Dias Toffoli, atropelando, inclusive, um pedido de vistas do ministro Luiz Edson Fachin (v. Tripé do crime no STF solta Dirceu, Genu e livra Paulo Bernardo).
Toffoli, como já dissemos aqui, foi funcionário de José Dirceu durante anos, como assessor jurídico da liderança do PT na Câmara, advogado de três campanhas de Lula e subchefe para assuntos jurídicos do próprio Dirceu, quanto este era ministro da Casa Civil.
Mas não achou que estava impedido ou era suspeito para soltar Dirceu.
O pretexto do trio para soltá-lo foi que havia “plausibilidade” em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde corre um “recurso especial” da defesa, poderia reformar a “dosimetria” da sentença (isto é, os anos a que Dirceu foi condenado).
Toffoli, Lewandowski e Gilmar Mendes não discutiram a culpabilidade de Dirceu, até porque sabem que nem o STJ nem o STF podem abordar tal questão.
Estranhamente (ou não), o trio não explicou porque Dirceu não poderia esperar o julgamento do “recurso especial”, pelo STJ, na cadeia.
Acontece que o “recurso especial” sobre a pena não existe mais, desde o último dia 8 de agosto, quando o TRF-4 não o admitiu (um “recurso especial”, ao STJ, somente pode ser apreciado por este se o tribunal de segunda instância o admite).
O TRF-4 admitiu apenas a parte do “recurso especial” em que Dirceu recorre quanto à quantidade de dinheiro que tem de devolver, daquilo que roubou.
Foi exatamente isso o que disse, na terça-feira, o ministro Celso de Mello, decano do STF, que – com o ministro Fachin – votou contra a manutenção da soltura de Dirceu e Genu: “Admitiu-se apenas em pequenina extensão o recurso especial, no que diz respeito à fixação do valor mínimo para reparação dos danos causados”.
Portanto, a “plausibilidade” alegada por Toffoli, e aprovada por Lewandowski e Gilmar Mendes, que, supostamente, motivara a soltura de Dirceu, não existia mais na terça-feira, nem mesmo formalmente.
Pois, apesar disso, o trio manteve Dirceu – e Genu – soltos.
Segundo Gilmar Mendes, o problema é que “no Brasil, às vezes, inusitada é a ignorância dos próprios parâmetros que usamos”.
Mendes não tem razão. No país, não há ignorância – nem dúvida – sobre os seus parâmetros para soltar corruptos. Bastaria a sua intimidade com Temer, Barata Filho e outros pais da pátria.
Quanto à Toffoli, fez uma justificativa do “habeas corpus de ofício” concedido a Dirceu e Genu: “esse tipo de concessão veio do Código de Processo Penal do Império”.
Trata-se de uma injustiça. No “Código de Processo Criminal” (Toffoli errou o nome) do Império não há uma palavra sobre soltar corruptos e criminosos usando um “habeas corpus de ofício”.
O pessoal daquela época era escravagista, mas não era idiota.
C.L.