Relatórios da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontam a escalada da violência no campo
Três casos de mortes envolvendo lideranças sem-terra e indígenas nos estados do Pará e do Mato Grosso do Sul, evidenciaram o aumento dos ataques no campo por parte de latifundiários do agronegócio às populações em situação de “conflito”, como pequenos produtores rurais, trabalhadores sem-terra e povos indígenas.
Segundo o relatório de Conflitos no Campo Brasil de 2017, realizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), mostra um grande aumento nos conflitos e mortes, ocorridas pela disputa da terra.
A íntegra do relatório da CPT foi divulgada no início de outubro e compara os dados até o fechamento do ano de 2017, ano em que foram 71 assassinatos contabilizados, 16,4 % maior que no ano de 2016, com 61 assassinatos. O número das mortes só não é maior que em 2003, quando se contabilizou 73 assassinatos a trabalhadores do campo. Já, os conflitos registrados correspondem a 1.431 casos, correspondendo a um assassinato a cada 20 conflitos.
E não foram só os assassinatos que cresceram. Em relação ao ano anterior, as tentativas de assassinato de lideranças rurais passaram de 74 para 120. Uma tentativa a cada três dias. As ameaças de morte aumentaram de 200 para 226 ameaças, o número de pessoas torturadas passou de 1 para 6 e o de presos foi de 228 para 263.
De acordo com o CPT, se observam ao menos, 708 mil pessoas envolvidas diretamente com os conflitos ocorridos. Sobre a terra, sendo ocupações, assentamentos, povoados, vilas, além de povos quilombolas e indígenas, contabilizaram-se 1168 conflitos e 530.900 pessoas envolvidas, sendo 36% maior que o ano anterior. Sobre os conflitos em relação a água, como a expropriação dos grandes produtores a açudes e barragens , somaram 197 conflitos, envolvendo 177.090 pessoas, representando 14,5% a mais que o ano anterior.
Em relação ao trabalho análogo a escravidão, principalmente com o extrativismo, pecuária e desmatamento, somaram 66 conflitos e 530 pessoas envolvidas.
RETROCESSOS RURALISTAS
O relatório da Pastoral da Terra destaca ainda que os ruralistas e latifundiários do agronegócio têm responsabilidades no aumento da violência e dos conflitos acontecidos, mas infelizmente, poucos são responsabilizados pela massiva agressividade realizada aos trabalhadores e povos rurais.
Em 2017, a bancada do agronegócio no Congresso propôs grandes retrocessos em decorrência a seus favorecimentos, como a Medida Provisória – MP 759 que possibilitava o pagamento em dinheiro de terras desapropriadas para Reforma Agrária, quando a legislação vigente determinava o pagamento em títulos da dívida agrária, a serem pagos em até 20 anos e permitia regularizar áreas até 2,5 mil hectares, quando o limite era de 1,5 mil hectares.
Em seguida, a MP logo se tornou o Projeto de Lei de Conversão, PLV 12/2017, ao serem introduzidas pelo relator mudanças na redação original. Trata-se da regularização fundiária e de alterações estruturais em legislações sobre terra rural e solo urbano, visando favorecer os interesses da própria bancada ruralista e do capital imobiliário, retirando empecilhos para que áreas sejam subtraídas e destinadas ao mercado.
Com isso, o PLV 12/2017 consolida a legalização da grilagem de terras (falsificação de documentos para tomar posse ilegalmente de terras) na Amazônia que já vinha sendo feita pelo Programa Terra Legal. Como tal põe em risco o patrimônio ambiental e hídrico do país e do planeta.
POVOS INDÍGENAS
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) divulgou um novo relatório sobre a violência contra os povos indígenas. A maioria dos assassinatos tem como causa conflitos no campo. O estudo mostra em números a tensão envolvendo índios, invasores e produtores rurais.
As informações sistematizadas pelo Cimi incluem dados de 2017, mas que, conforme reconhece a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) são parciais e podem ser ainda maiores.
Segundo o Cimi a questão indígena continua dramática e os dados de violência são altos. Foram registrados 110 casos de assassinatos de indígenas envolvidos nas violações ao direito à terra tradicional e à proteção delas, no ano de 2017.
Os números de mortalidade infantil (702 casos) e de suicídios (com 128 casos), também são alarmantes.
DEMARCAÇÃO
Ainda, o estudo do Cimi, constata que o governo Temer não homologou nenhuma terra indígena em 2017. Em sua gestão, o Ministério da Justiça assinou apenas duas Portarias Declaratórias e a Fundação Nacional do Índio (Funai) identificou somente seis terras como sendo de ocupação tradicional indígena.
“Das 1.306 terras reivindicadas pelos povos indígenas no Brasil, um total de 847 terras (o que representa 64%) apresentam alguma pendência do Estado para a finalização do processo demarcatório e o registro como território tradicional indígena na Secretaria do Patrimônio da União (SPU). Destas 847, um volume de 537 terras (63%) não teve ainda nenhuma providência adotada pelo Estado”, destaca relatório do Cimi.
TIAGO CÉSAR
Clique e leia o relatório da Comissão Pastoral da Terra
Clique e leia o relatório do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)