
Morte de pai de três filhos revela negligência da concessionária ViaMobilidade que controla a linha-5 Lilás. No entanto, linhas estatais do Metrô possuem o sistema
O vão entre o trem e a porta da plataforma das estações da Linha 5-Lilás do metrô, administradas pela concessionária privada ViaMobilidade, não possui sensores de presença, que evitam esmagamento. A tecnologia pode detectar a presença de uma pessoa nesse espaço e impedir que o trem continue viagem.
A indagação veio após o incidente registrado na última terça-feira (6), onde passageiro morreu após ficar preso no vão entre a porta do trem e a da plataforma da estação Campo Limpo. A vítima era Lourivaldo Ferreira Silva Nepomuceno, de 35 anos, que deixou três filhos.
A ViaMobilidade, responsável pela linha, informou que a empresa tem apenas sensores nos trens, para impedir acidentes e que eles partam com as portas abertas. As linhas operadas pela estatal possuem o mecanismo.
As portas de plataforma começaram a ser implantadas em São Paulo em 2010. Hoje, 28 estações das Linhas 1-Azul, 2-Verde, 3-Vermelha e 15-Prata contam com o equipamento, e os sensores em operação. Essas portas criam uma barreira física que evita quedas no vão, além de bloquear o acesso aos trilhos.
SENSORES SÓ EM 2026
Em entrevista à TV Bandeirantes, a ViaMobilidade afirmou que pretende instalar sensores nos vãos das plataformas até fevereiro de 2026.
“Nossa engenharia já vem trabalhando nesse projeto. E nós teremos até fevereiro de 2026, portanto, nos próximos meses, e agora a tendência é que a gente busque até adiantar esse projeto, é a instalação de sensores de presença nesses espaços, entre a porta do trem e a porta da plataforma. Com isso, qualquer objeto, qualquer pessoa, qualquer coisa que esteja ali, será detectado e a porta não fechará”, disse Francisco Pierrini, presidente da empresa, em entrevista à Band.
Antes dos sensores, o presidente afirmou que vai instalar barreiras físicas, como hastes metálicas. Ele afirmou que esse tipo de proteção evitaria a morte de Lourivaldo.
“Até lá [a instalação dos sensores], nós vamos implantar um sistema de barreira física, que são hastes de metal nas plataformas. Em todas as plataformas, nas portas internamente. Para que tenha também uma posição de obstrução quando do fechamento das portas, qualquer objeto, ou pessoa, ou que tiver na frente, ele vai bloquear e não vai fechar”, afirmou.
LINHAS ESTATAIS SÃO MAIS SEGURAS
Segundo Luis Kolle, engenheiro do Metrô de São Paulo e presidente da Associação de Engenheiro e Arquitetos de Metrô (AEAMESP), a Linha 3-Vermelha tem sensores no vão entre o trem e as portas automáticas da plataforma para evitar acidentes.
“O vão da porta de plataforma tem que ter um sensor. Os que têm são os da Linha 3-Vermelha. Tenho certeza, pois estudos e pesquisas de modernização foram feitos”, afirmou.
Em nota, a estatal Metrô, operada pelo governo de São Paulo, afirmou que as portas contam com dispositivos para evitar que pessoas fiquem presas entre o trem e a porta de plataforma após o fechamento.
“As portas funcionam de forma sincronizada com os trens e o sistema de sinalização: o trem só parte após a confirmação do fechamento completo e seguro das portas da composição e das PSDs. Todas contam com dispositivos para evitar que pessoas fiquem presas entre o trem e a porta de plataforma após o fechamento.
Para o vice-presidente da Federação Nacional dos Metroferroviários (Fenametro), Alex Santana, os trens do Metrô têm mais dispositivos de segurança do que os trens da ViaMobilidade.
“Nas nossas linhas existem sensores de presença nos vãos, borrachões pra evitar que alguém fique ali, entre outras questões do sistema e procedimentos operacionais. No caso da L5 [ViaMobilidade] não há sensores de presença e a borracha que tem não é suficiente. O vão praticamente não tem visibilidade para monitoramento, e a falta de funcionários nas plataformas acaba dificultando a prevenção dessa ocorrência”, diz.
LOURIVALDO
Lourivaldo Ferreira Silva Nepomuceno, foi o trabalhador que foi prensado entre a porta do trem e a porta de segurança da plataforma por volta das 6h, horário de pico do transporte público na capital.
A perícia técnica foi acionada e deverá esclarecer as circunstâncias do acidente. Lourivaldo, que residia em Taboão da Serra, na Grande São Paulo, trabalhava como repositor em um supermercado e estava próximo de realizar um sonho: concluir a graduação em Educação Física ainda neste ano. A rotina diária no transporte público era algo habitual para ele, segundo relatos da família.
O pai da vítima, Lourivaldo dos Santos Nepomuceno, concedeu entrevista emocionada à CNN e relembrou momentos com o filho. “A gente ia fazer um churrasco no dia 23, para comemorar o aniversário dos dois. Ele faria 36 anos no domingo (11), e eu faço 62 logo em seguida”.
O clima é de consternação entre os familiares e amigos. Lourivaldo deixa esposa e três filhos, dois pequenos e uma adolescente de 17 anos. O pai expressou indignação ao comentar o ocorrido. “Não entendo como ele ficou preso. Era muito ativo e acostumado a andar de metrô. Acredito que houve alguma falha”.
A ViaMobilidade, responsável pela operação da Linha 5-Lilás, divulgou nota oficial lamentando o ocorrido e informando que está colaborando com as investigações. Testemunhas relataram que não ouviram o sinal sonoro dos sensores de segurança da porta da plataforma, o que levanta suspeitas sobre uma possível falha técnica.
A prima da vítima, Cecília Nepomuceno, prestou depoimento à Delegacia de Polícia do Metropolitano (Delpom), que está à frente da apuração do caso. Ela estava na estação no momento do acidente, acompanhada de um amigo, e só mais tarde descobriu que a vítima era seu parente. “A gente ouviu o barulho e os gritos, mas nunca imaginamos que fosse alguém da família”, contou.
O amigo que a acompanhava, Rogério Evangelista, também foi ouvido pela polícia. Ele relatou ter presenciado cenas de desespero. “As pessoas estavam chorando, desesperadas. Eu vi o sangue no vidro”. O laudo da perícia e as investigações da Delpom serão fundamentais para determinar se houve falha humana, técnica ou ambos.
Enquanto isso, familiares tentam lidar com a dor da perda repentina de um homem jovem, trabalhador e cheio de planos. A memória de Lourivaldo será marcada não apenas pela fatalidade, mas também pelo sonho interrompido de um futuro que estava prestes a se concretizar.