O ambiente político do Brasil sob o governo Jair Bolsonaro (PSL), marcado por “crises permanentes e confrontação”, dará a tônica das eleições municipais de 2020. Mas, na disputa do voto, o bolsonarismo será impactado por sua incapacidade de enfrentar “as grandes dificuldades econômicas” e “a forte crise social”. Esta é a opinião que a presidenta nacional do PCdoB, Luciana Santos, apresentou na sexta-feira (27), na reunião da Comissão Política Nacional comunista, em São Paulo.
Segundo Luciana, a um ano da eleição 2020, o PCdoB deve intensificar sua atuação política nos municípios e estados com dois objetivos em perspectiva: 1) persistir na construção de uma frente ampla e heterogênea, mas com um programa democrático mínimo, em oposição a Bolsonaro; 2) preparar projetos eleitorais mais ousados, que planeje o lançamento de candidaturas a prefeito e a formação de chapas competitivas a vereador, sobretudo nos grandes centros.
“É preciso ter claro que 2020 será peça central da disputa de rumos para a eleição presidencial de 2022”, diz Luciana. “Com a realização das conferências municipais e estaduais do PCdoB neste ano, devemos já armar o Partido para a disputa que está por vir. O jogo começou.”
“Peão no tabuleiro”
Em seu informe à Comissão Política, a presidente do PCdoB – que também é vice-governadora de Pernambuco – destacou o peso do cenário internacional sobre a realidade brasileira. Para Luciana, “o País está sujeito às marcas e contradições inerentes do capitalismo contemporâneo, como a hegemonia do rentismo e o ataque ao trabalho. A agenda econômica está em contradição com a esfera democrática”.
A crise do capitalismo, iniciada em 2007/2008, não é revertida – ao contrário, vira “motivo de novas tensões e divisões no seio das elites mundiais”. O relatório da Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) – lembra Luciana – “reafirma o perigo claro e presente de recessão em 2020”, prevendo “tempos turbulentos.
Nesse cenário, Bolsonaro e seu governo reduzem o Brasil a um “peão no tabuleiro dos interesses geopolíticos norte-americanos” – um “portador de posicionamentos dos EUA”. Até mesmo o discurso de Bolsonaro à Assembleia das Nações Unidas “foi carregado de uma retorica ideológica e beligerante, com as tintas da guerra fria, rompendo a tradição construtiva da política externa brasileira”.
A crise como fator objetivo
A agenda liberal-conservadora, em curso no Brasil desde o golpe de 2016, foi impulsionado com a eleição de Bolsonaro, que faz uma gestão atípica na Presidência. “É um governo-movimento, em campanha permanente. O presidente vai neutralizando adversários, invertendo pautas, buscando coesionar seu eleitorado mais fiel”. Em vez de um projeto para o País, “o que existe são improvisações – um projeto de poder de feições autoritárias, retrógado nos costumes e antinacional”.
A política econômica, sob a liderança do “superministro” Paulo Guedes, avança na trilha da austeridade, com propostas de venda dos ativos nacionais, abertura indiscriminada, desindustrialização, desmonte do sistema de Ciência & Tecnologia e contração do papel do Estado. Pautas centrais do governo, como a reforma da Previdência e a retirada de direitos, tramitam no Congresso – que já debate a proposta de desvinculação dos recursos do orçamento.
“O quadro é desolador. Apesar do desemprego, da crise social e econômica que o País vive, não se propõe uma única medida concreta direcionada para o enfrentamento desses problemas. A crise é o fator objetivo do governo Bolsonaro”, analisa Luciana.
Derrotas no Congresso
Do ponto de vista político, Bolsonaro padece de reveses como a perda de popularidade (apesar de uma resiliência em torno de 30% dos brasileiros) e a relação mais tumultuada com o Congresso Nacional. “Há mais unidade e governabilidade na agenda econômica liberal, que tem o apoio de pelo menos dois terços dos parlamentares. Mas, antes de completar um ano, o governo soma uma série de vetos derrubados e medidas provisórias que perdem validade.”
A gestão Bolsonaro, de fato, acumula derrotas significativas – e o PCdoB se destaca nesse processo. “Nossa bancada, conduzido pelo líder Daniel Almeida, somado ao trabalho da Jandira na liderança da Minoria, conquista vitórias importantes, mesmo sob cerco. O esforço de construção dirigido a buscar iniciativas com o Centro garantiu, por exemplo, a recuperação de recursos para a educação, a instalação da CPI da Fake News e a aprovação do projeto de lei que coíbe o abuso de autoridade”, enumera Jandira.
Outro feito dos comunistas e da oposição foi o esvaziamento do “pacote anticrime” do ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública). “Aqui, nesse êxito, sobressaiu o empenho do nosso deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), em especial na derrubada do chamado ‘excludente de ilicitude’ – que, na prática, representava uma ‘licença para matar’.”
Projetos em disputa
Passados nove meses do governo Bolsonato, as forças políticas se reorganizam. Na direita, nomes como os dos governadores João Doria (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ) tentam se projetar como contrapontos menos extremados ao bolsonarismo. O apresentador global Luciano Huck procura se apresentar ao debate, enquanto Sergio Moro ostenta índices de popularidade superiores aos de Bolsonaro e pode ser o expoente do “partido da Lava Jato”. É o campo conservador e antipetista em disputa.
Já na esquerda, um dos desafios é evitar a dispersão. “A defesa do ‘Lula Livre’ – da liberdade do presidente Lula – é fundamental, mas não pode ser o único flanco de luta”, diz Luciana. O PCdoB conclama com firmeza que “as saídas políticas estão na conformação de uma ampla frente”, que derrote o bolsonarismo já nas eleições de 2020. O governador Flávio Dino (MA) e a candidata a vice-presidenta nas eleições 2018, Manuela D’Ávila, são os porta-vozes mais conhecidos do Partido e ajudam a levar essa batalha adiante.
“Historicamente, foram as grandes construções políticas, heterogêneas em sua natureza, que produziram saídas para os momentos de impasse no Brasil, como as Diretas Já”, diz Luciana. “Estamos sob um impasse desse tipo, com a democracia abalada por um governo de caráter autoritário. Iniciativas como o movimento Direitos Já devem ser estimulados, pois têm grande potencial para se tornar uma expressão desse sentimento de indignação e de busca de saídas.”
Rumo às eleições
Com o início do processo de conferências partidárias, os comunistas precisam levar em conta essas preocupações e valorizar, sobretudo, a preparação para a disputa eleitoral de 2020. “É necessária muita convergência e habilidade para construir um campo democrático de oposição ao governo Bolsonaro”, afirma a presidenta do PCdoB. “O projeto eleitoral de 2020 é parte importante da nossa estratégia para 2022. Nosso tempo político são as eleições de 2020. A formação de chapas completas é uma realidade”
Ao consolidar a “integração plena dos quadros oriundos do PPL” e atrair forças para “fazer frente aos gigantescos desafios políticos e eleitorais”, o PCdoB deve, desde já, ter como centro de sua ação uma “intensa agenda” e a articulação dos organismos de direção” – das bases aos comitês estaduais. As direções a serem eleitas nas Conferências Estaduais de 2019 serão, segundo Luciana, “as regentes da promoção das atualizações da construção partidária. Que sejam direções capazes, unitárias, dinâmicas e impregnadas da linha partidária em todos os terrenos da luta social, política e de ideias”.
ANDRÉ CINTRA
FONTE: VERMELHO