“Não há nenhum sentido da energia do Amapá ser mais cara do que as de outros Estados”, disse o presidente. “Bolsonaro privatizou a energia no Amapá e permitiu o maior absurdo tarifário de todos os tempos”, acrescentou
O presidente Luís Inácio Lula da Silva criticou na quinta-feira (3), em entrevista a um pool de emissoras de rádio do Norte do Brasil, os preços abusivos cobrados pela empresa Equatorial Energia, responsável pelo Estado do Amapá após a privatização da distribuidora de energia na região.
Ele foi informado pelo jornalista Luiz Melo, do Sistema Diário de Comunicação, durante a entrevista, de que no Estado do Amapá o consumidor paga a maior tarifa energética do país. De início o presidente mostrou-se surpreso, mas, ao receber uma mensagem do Ministro de Minas e Energia, ele criticou decisões tomadas pelo governo passado.
“O [Jair] Bolsonaro privatizou a energia no Amapá e permitiu o maior absurdo tarifário de todos os tempos. Vou estudar com carinho a informação que recebi, mas a empresa que privatizou a energia do Amapá fez um assalto ao povo, colocando coisas no passado na questão tarifária”, argumentou.
“Não há nenhum sentido da energia do Amapá ser mais cara do que as de outros Estados. Eu não estou sabendo disso, mas saindo daqui vou ligar para o ministro das Minas e Energia e me inteirar do assunto”, prometeu Lula, ressaltando que não sabe qual o preço da luz no Estado, mas como uma unidade republicana que gera energia elétrica o preço com certeza tem que ser baixo.
O presidente já havia criticado também, na mesma entrevista, a interrupção, pelo governo anterior, do contrato de compra de energia da Venezuela para abastecer o Estado de Roraima.
A privatização da empresa de energia do Amapá se deu em 2021 e integrou o Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) do Governo Bolsonaro. A transmissão já havia sido vendida em 2009. A empresa pública do Amapá foi arrematada pelo valor simbólico aproximado de R$ 50 mil.
Pouco antes de ser privatizada, ela recebeu um aporte de R$ 400 milhões, que deveriam ser usados para renovar equipamentos e estabelecer outras melhorias para o fornecimento do serviço.
APAGÕES
O Amapá viveu uma série de apagões em 2020 e 2021 causados pela empresa Linhas de Macapá Transmissora de Energia (LMTE), controlada pela holding Gemini Energy, e que havia assumido transmissão no trecho do Linhão de Tucuruí, entre Jurupari (PA) e Laranjal do Jari (AP). Na ocasião, a Eletrobrás, ainda estatal, foi acionada para resolver a lambança feita pela empresa privada responsável.
O especialista em energia, Ildo Sauer, ex-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP), afirmou, à época, que o episódio revelou “a ponta de um iceberg, que está latente”.
“É claro que o episódio direto do Amapá tem uma responsabilidade da empresa que em 2009 ganhou a licitação”, disse Ildo Sauer. “Essa empresa, uma empresa espanhola, ganhou a licitação, construiu a rede e não cumpriu com suas obrigações. Foi à falência, foi substituída por um fundo de investimento, uma empresa nitidamente sem familiaridade com a tecnologia”.
“Então, a responsabilidade direta é dessa empresa, que quase um ano atrás, retirou de funcionamento um transformador para manutenção, ele não retornou até agora. A metodologia de confiabilidade é que tendo três transformadores, dois são suficientes para atender a carga – são mais ou menos 150 MW cada um deles, a carga é 240 MW, então dois atendem a carga simultaneamente e o terceiro fica de reserva. Esse terceiro foi para manutenção, não retornou. Houve um outro problema que provavelmente está vinculado à ausência de manutenção preventiva centrada em confiabilidade. O segundo transformador teve um incêndio e esse incêndio promoveu também a danificação do terceiro transformador. Então ficou sem nada”.
Segundo Sauer, há problema de projeto e há responsabilidade da empresa, mas “há também responsabilidade do órgão que tem que fiscalizar e garantir que as empresas cumpram suas obrigações. Esse órgão se chama Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e em paralelo também o Operador Nacional do Sistema (ONS), que é quem comanda a operação das usinas, o fluxo de carga para atender as regiões, devia estar notificado de que aquela subestação não estava com o nível de confiabilidade aceitável”.
O especialista em energia Roberto D´Araújo, diretor do Instituto Ilumina, também comentou a crise de energia do Amapá. “O Amapá está na fronteira do Brasil e, em qualquer rede que interligue o país, ele estará na periferia desse circuito. Por isso mesmo, os equipamentos e subestações que exercem essa conexão precisam de cuidados especiais. Ali não há outro caminho. Tudo se passa como se fosse um território isolado por um abismo físico com o resto e, portanto, uma ponte que o interligasse teria que ser muito bem construída e monitorada”, avaliou.
“Certamente, esse não foi o caso da subestação LMTE (Linhas de Macapá Transmissora de Energia), concessão vencida pela empresa privada espanhola ISOLUX, em 2008”, acrescentou.
“Com certeza houve defeitos de projeto, tais como aterramento insuficiente, disjuntores incorretamente ajustados e buchas de má qualidade. Também houve falha de manutenção e ausência de equipamentos de redundância, como transformadores e equipes extras. Entretanto, raios caem sobre linhas e subestações quase todo dia e, se o padrão do nosso sistema fosse a da ISOLUX, nós estaríamos no escuro”, disse D´Araújo.
Leia mais