Sobre a frase do chileno, em entrevista, de que “hoje é a Ucrânia, mas talvez amanhã poderia ser conosco”, Lula apontou a falta de experiência do jovem colega. “É uma visão dele. Eu não tenho porque concordar com o Boric”, destacou
O presidente Lula afirmou, em entrevista coletiva nesta quarta-feira (19) na Bélgica, que o presidente do Chile, Gabriel Boric, estava muito afobado na reunião da CELAC/UE ao tratar da questão da guerra.
A afirmação do líder brasileiro foi em relação à reclamação do chileno de que “os líderes latino-americanos ficaram dois dias debatendo se a guerra era na Ucrânia ou contra a Ucrânia”. Ele também disse que “hoje é a Ucrânia, mas talvez amanhã poderia ser conosco”.
Lula esclareceu que, “primeiro, não se passou dois dias discutindo a Ucrânia. Sabe, todos nós sabemos o que pensa a Europa do que está acontecendo entre Ucrânia e Rússia. Todos nós sabemos o que pensa a América Latina. Eu não tenho porque concordar com o Boric. É uma visão dele. Eu acho que a reunião foi extraordinária. Foi extraordinária a reunião”.
“Possivelmente, sabe, a falta de costume de participar dessas reuniões faça com que um jovem seja mais sequioso. Mais apressado. Mas as coisas acontecem assim”, acrescentou o presidente. “A reunião foi, do meu ponto de vista, extraordinária. A mais madura reunião que eu participei entre Mercosul e União Europeia. Entre América Latina e União Europeia. Foi a mais importante reunião que eu participei. Mais madura. Onde se discutiu os temas que precisava se discutir. E se chegou a um documento que foi extremamente razoável, de interesse de todo mundo”, disse Lula.
“Eu já tive a pressa do Boric. Eu, no meu primeiro ano de mandato, ia para uma reunião do G7, que eu fui convidado em Évian. E eu queria que as coisas fossem decididas tudo ali naquela hora. Não, tem que decidir porque o Brasil precisa. Tem que decidir. Mas ali não é só interesse do Brasil. Ontem a gente estava discutindo a visão de 60 países”, explicou Lula.
“Portanto, a gente tem que compreender que nem todo mundo concorda com a gente, nem todo mundo tem a mesma pressa, tem a mesma visão sobre qualquer coisa. Então eu acho que a reunião foi muito importante. Eu acho que a reunião sobre a Ucrânia foi, sabe, no momento certo, no tempo certo, não teve nada que a gente já não soubesse”, avaliou o presidente brasileiro.
“Eu, sinceramente, possivelmente, porque deve ter sido a primeira reunião do Boric numa reunião com União Europeia e América Latina, ele tenha um pouco mais de ansiedade do que os outros. Só isso”, completou.
Lula seguiu defendendo que se busque a paz no conflito envolvendo a OTAN e a Rússia. “Veja, o Brasil assinou um documento no seu voto na ONU condenando a invasão territorial da Ucrânia nos primeiros dias da guerra. Isso não é nenhuma novidade. O que o Brasil quer é… A guerra começou. E se a guerra começou, alguém precisa tentar chamar a atenção dos dois países para discutir a questão da paz. E a retirada faz parte do acordo de paz”, afirmou.
“É preciso sentar na mesa. O que nós queremos é que pare a guerra. Depois que parar a guerra, senta-se numa mesa e discute-se. É isso que nós queremos. E nós nem sabemos se vamos participar de acordo, não sabemos quem serão os mediadores. O dado concreto é que a condição sine qua non para se discutir a paz é parar a guerra. Enquanto tiver tiro, não tem conversa. É isso que está acontecendo”, destacou o líder brasileiro.
Leia os trechos da entrevista de Lula sobre a guerra da OTAN contra a Rússia e as sanções dos EUA
Marieta, Bloomberg: Minha pergunta: ontem o presidente do Chile, Gabriel Boric, disse que foi triste que os líderes latino-americanos ficaram dois dias debatendo se a guerra era na Ucrânia ou contra a Ucrânia. Ele também disse que hoje é a Ucrânia, mas talvez amanhã poderia ser conosco. Você compartilha dessa visão dele sobre a reunião? Você entende que foram dois debatendo essa questão?
Lula: Primeiro não se passou dois dias discutindo a Ucrânia. Sabe, todos nós sabemos o que pensa a Europa do que está acontecendo entre Ucrânia e Rússia. Todos nós sabemos o que pensa a América Latina. Eu não tenho porque concordar com o Boric. É uma visão dele. Eu acho que a reunião foi extraordinária. Foi extraordinária a reunião. Possivelmente, sabe, a falta de costume de participar dessas reuniões faça com que um jovem seja mais sequioso. Mais apressado. Mas as coisas acontecem assim. A reunião foi, do meu ponto de vista, extraordinária. A mais madura reunião que eu participei entre Mercosul e União Europeia. Entre América Latina e União Europeia. Foi a mais importante reunião que eu participei. Mais madura. Onde se discutiu os temas que precisava se discutir. E se chegou a um documento que foi extremamente razoável, de interesse de todo mundo.
Eu já tive a pressa do Boric. Eu, no meu primeiro ano de mandato, ia para uma reunião do G7, que eu fui convidado em Évian. E eu queria que as coisas fossem decididas tudo ali naquela hora. Não, tem que decidir porque o Brasil precisa. Tem que decidir. Mas ali não é só interesse do Brasil. Ontem a gente estava discutindo a visão de 60 países. E, portanto, a gente tem que compreender que nem todo mundo concorda com a gente, nem todo mundo tem a mesma pressa, tem a mesma visão sobre qualquer coisa. Então eu acho que a reunião foi muito importante. Eu acho que a reunião sobre a Ucrânia foi, sabe, no momento certo, no tempo certo, não teve nada que a gente já não soubesse. Eu, sinceramente, possivelmente, porque deve ter sido a primeira reunião do Boric numa reunião com União Europeia e América Latina, ele tenha um pouco mais de ansiedade do que os outros. Só isso.
Sérgio Utti, SBT, SBT News: A gente viu na resolução final vários avanços da CELAC. Vários pontos que são importantes para o Brasil, para os outros países latinos e caribenhos na resolução final, mas eu queria tocar num ponto sobre a Ucrânia. Aqui na Europa, as coisas são vistas muito como preto no branco. A neutralidade às vezes é entendida como uma posição pró-Rússia. O senhor acha que esse assunto tomou um espaço além do necessário, além do que deveria ser tomado nas discussões? O senhor acha que hoje a União Europeia tem uma compreensão melhor da posição da América Latina nesse sentido?
Lula: Eu acho que tem. Acho que tem muita gente que estava muito nervosa e muito afobada há seis meses que agora está precisando encontrar alguém que signifique a possibilidade de encontrar o caminho da paz. O Brasil tem feito isso desde o começo. Nós temos conversado com a China, temos conversado com a Indonésia, temos conversado com parceiros nossos da América Latina. É preciso que a gente construa um grupo de países capaz de, no momento certo, convencer a Rússia e a Ucrânia de que a paz é o melhor caminho.
Obviamente que não posso perder de compreender o nervosismo da União Europeia, afinal de contas você tem países que têm fronteiras com a Ucrânia. Eu pedi para o Celso Amorim fazer uma viagem como enviado especial à Rússia e à Ucrânia… Para ir à Ucrânia ele teve que descer, andar 12 horas de trem para ir, 12 horas para voltar. E as pessoas assustadas. É normal que as pessoas que estão ali tenham uma preocupação maior do que a minha que estou a 14 mil quilômetros de distância. Mas é exatamente pelo fato de a gente estar distante que a gente pode ter a tranquilidade de não entrar no clima que estão os europeus e tentar criar um clima de que: olha, vamos construir a paz. Por enquanto, nem o Zelensky nem o Putin querem falar em paz, porque cada um deles pensa que vai ganhar. Mas está havendo um cansaço. O mundo começa a cansar. Os países começam a cansar. Então vai chegar o momento em que vai ter paz. E aí vai ter que ter um grupo de países capaz de conversar com a Rússia e com a Ucrânia.
Eu acho que a reunião não tomou tempo demais nenhum. Tomou o tempo necessário. Nós precisamos, quando a gente vai para uma reunião, a gente tem que estar preparado para discutir os temas que interessam a outros partidos, ou seja, a outros países. Tem muitos interesses. Nós fizemos uma reunião sobre a questão da Venezuela, sabe, entre o Macron, a Argentina, o Brasil, os dois representantes da Venezuela, a vice-presidenta, o Petro da Colômbia. E qual é a conclusão que nós chegamos? A conclusão que nós chegamos é que a situação da Venezuela vai ser resolvida quando os partidos na Venezuela, junto com o governo, chegarem à conclusão da data da eleição e chegarem à conclusão das regras que vão estabelecer as eleições.
E, com base nisso, o compromisso de que as punições impostas pelos Estados Unidos comecem a cair. Sanções absurdas, em que a Venezuela não pode mais lidar com dinheiro seu que está nos bancos de outros países. Então, o que eu sinto: sinto que depois de tanto tempo de briga, todo mundo está cansado. Todo mundo. Eu sinto que a Venezuela está cansada. O povo quer encontrar uma solução. Porque é bom você brigar um mês, dois meses, três meses, dois anos, três anos, quatro anos, mas a vida inteira? Então eu acho que nós estamos chegando nesse clima. Eu gostei da reunião. Eu não esperava resultado da reunião. Eu esperava que a gente tivesse a compreensão de que a solução dos problemas da Venezuela é uma questão do povo venezuelano. Se eles se entenderem com relação às regras e às datas das eleições, eu acho que nós temos autoridade moral de pedir o fim das sanções. É isso. Mas foi também numa boa, em que não houve nenhum problema maior que pudesse trazer qualquer nervosismo na reunião. Eu sei que as pessoas que estavam lá saíram felizes com o resultado da reunião.
Gonzalo Lira, cidadão chileno, está encarcerado pelo regime de Kiev, por crime de opinião. A conduta desse presidente do Chile tem deixado a desejar.