Procuradora-geral, Raquel Dodge:
‘Nefasto esquema ilícito’ com ‘grau de perversão moral inédito’
Lula está preso por crime comum: roubou dinheiro do povo, recebendo propinas para acobertar o assalto de um cartel contra a Petrobrás. No processo em que já foi condenado, essas propinas assumiram a forma de um triplex à beira de uma praia em Guarujá, lenda de todo novo-rico em São Paulo.
Como o nosso sistema de recursos judiciais tem como limite (ou falta de limite) o dinheiro do condenado, Lula continua fazendo um recurso atrás do outro.
O último – o 79º (septuagésimo nono) recurso de Lula no processo da propina do triplex – foi respondido pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, no dia 25, e divulgado no dia 31 (v. Procuradora-geral demole alegações da defesa de Lula).
Dessa vez, trata-se de um “recurso extraordinário” (um recurso ao Supremo Tribunal Federal), com um pedido de suspender a pena.
O que é completamente ilegal, de acordo com o Código de Processo Penal:
“Art. 637. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo”
Além do mais, existem duas súmulas do STF (nº 634 e nº 635) que somente permitem que o STF aceite um “recurso extraordinário”, se ele for considerado admissível pelo tribunal de origem, que, no caso do processo da propina do triplex, é o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Acontece que o TRF-4 já considerou que o “recurso extraordinário”, no caso do triplex, é inadmissível.
Logo, como diz a procuradora, esse recurso, por parte de Lula, é ilegal.
Apesar disso, e apesar do ministro Luiz Edson Fachin já ter decidido que esse recurso é ilegal (“inadmissível”), ele acabou no pleno do STF.
O limite para essa chicaneria é, como dissemos, o dinheiro que Lula tem à sua disposição para recorrer infinitamente – e abusar da paciência dos juízes e do público.
MANIPULAÇÃO
Na página 8 desta edição, condensamos a resposta da procuradora-geral, enviada ao STF (v. Procuradoria-Geral da República: ambição desmedida levou Lula ao crime).
Além da ilegalidade da suspensão da pena, também é ilegal tentar mudar o mérito de uma decisão através de um recurso ao STF – que é, exatamente, o que a defesa de Lula pretende. Porém, o STF cuida apenas de transgressões à Constituição, e não há nenhuma no processo em que Lula foi condenado.
É óbvio que Lula e sua defesa sabem de tudo isso. Os recursos continuados e infinitos são apenas para uso político, totalmente manipulatório.
Daí as acusações de que a condenação de Lula foi política – exatamente porque quem está usando politicamente o processo é Lula.
Por várias razões. Mas a principal, ou a mais básica, é esconder seus crimes. Ladrões que saem gritando “pega ladrão!”, para não serem apanhados, não são coisa rara, em qualquer país do mundo.
No entanto, como ressalta a procuradora-geral, Lula “não apenas orquestrou todo o esquema de arrecadação de propinas oriundas da Petrobrás por diversos partidos, como também atuou para que seus efeitos se perpetuassem, nomeando e mantendo em cargos de direção da mencionada empresa estatal pessoas comprometidas com atos de corrupção e que efetivamente se corromperam e se omitiram em seu dever de ofício de impedir o resultado criminoso.
“Ao usar o cargo para obter vantagem financeira, e, em contrapartida, viabilizar a ocorrência de um dos maiores esquemas de corrupção da história mundial, Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou desprezo pelos ideais republicanos que prometeu cumprir como Chefe de Estado e, com isso, frustrou as expectativas de milhões de brasileiros, que nele depositaram confiança ao o elegerem”.
Observa a procuradora que Lula “foi eleito para o mais alto cargo do Executivo Federal com um ferrenho discurso anticorrupção, alardeando sua honestidade e prometendo combate aos dilapidadores dos cofres públicos. Elegeu-se em virtude de sua retórica de probidade e retidão.
“Ademais, em face da posição que ocupava e da alta remuneração percebida, [Lula] estava numa posição social muito privilegiada dentro da sociedade brasileira. E, ciente de que a propina que recebeu era parte de um esquema de corrupção na Petrobrás.
“Além disso, e o mais importante: apesar de se estar diante, aqui, de um crime de corrupção passiva e de um crime de lavagem de dinheiro, é certo que eles são parte integrante de um cenário criminoso muito maior, a saber, de um nefasto esquema ilícito que vitimou a Petrobrás e outros órgãos da Administração Pública Federal por anos e que alcançou – em grau de sofisticação, em magnitude do dano, em impacto social, em grau de perversão moral – dimensões inéditas na história do mundo.
“É evidente que o motivo dos crimes constituiu a ambição de enriquecimento desmedido e manutenção no poder, comprometendo o correto funcionamento do processo decisório da Petrobrás, bem como interferindo e promovendo o desequilíbrio no sistema econômico e político do país.
“No entanto, não se pode desconsiderar que os crimes de corrupção e lavagem de capitais praticados por Luiz Inácio Lula da Silva, sendo parte de um cenário criminoso maior, têm também uma outra motivação: manter o esquema de cartel e corrupção na Petrobrás funcionando.
“Assim, os crimes se retroalimentavam, com motivações cíclicas: a corrupção era importante para que o cartel existisse; o cartel era importante para conseguir recursos para pagar a propina”.
Sobre a alegação de que a pena – a chamada “dosimetria” – sentenciada pelo TRF-4 foi excessiva, Raquel Dodge lembra algo que deveria ser óbvio, se não fosse o relaxamento moral dos sequazes de Lula:
“Não há como se sustentar que os desvios praticados pelo presidente da República devam ser tratados, sob o ponto de vista da censurabilidade e consequências que dele decorrem, do mesmo modo que os desvios incorridos por qualquer outro agente público. A responsabilidade e o poder associados à figura do presidente da República não apenas sugerem, mas impõem que eventuais crimes de corrupção por ele praticados sejam punidos com um rigor acima da média”.
A procuradora-geral resume as provas materiais, nas quais a condenação de Lula se baseou, que confirmaram os depoimentos. Por exemplo, o do presidente da OAS, José Adelmário Pinheiro Filho, conhecido por Léo Pinheiro:
“… o apartamento era do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da BANCOOP [a cooperativa dos bancários, que era proprietária do condomínio em Guarujá, depois passado para a OAS pelo seu presidente, e tesoureiro do PT, João Vaccari Neto], já foi me dito que era do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de sua família, que eu não comercializasse e tratasse aquilo como uma coisa de propriedade do presidente”.
Raquel Dodge acrescenta que havia o “intuito de conquistar o apoio de grandes bancadas na Câmara dos Deputados e de contemplar os interesses arrecadatórios e escusos do Partido dos Trabalhadores – PT”.
Rigorosamente, a propina era o que Lula chamava (e chama) de “fazer política”. Mas só achava isso porque lhe interessava achar que o normal, em política, é agasalhar propinas.
C.L.
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Acredito que o esquema “Petrobras” formou grande parte da sociedade deste país.