O presidente da França, Emmanuel Macron, renomeou Sébastien Lecornu como seu primeiro-ministro na tarde de sexta-feira (10), após ter aceitado no início da semana a renúncia dele do cargo, com seu fracasso em formar o quinto governo em dois anos e com o país ainda sem orçamento aprovado.
O primeiro governo Lecornu, inaugurado em 5 de outubro, durou apenas 14 horas antes de renunciar em 6 de outubro.
Apenas 14% dos franceses ainda aprovam a presidência de Macron e, após a primeira renúncia de Lecornu, aumentou no país o clamor pela antecipação das eleições com dissolução do parlamento, ou renúncia do próprio Macron.
O partido França Insubmissa reagiu ao anúncio, chamando-o de “um tapa na cara dos franceses dado por um homem irresponsável embriagado de poder”.
Em sua rede X, Lecornu citou que aceitou ser recontratado “por dever” e prometeu cumprir o pedido feito por Macron de elaborar “um orçamento para o final do ano” para solucionar a crise econômica a qual Paris está enfrentando.
Assim, o primeiro-ministro reconduzido terá de comparecer perante a Assembleia na segunda-feira com o projeto de orçamento para 2026, de acordo com o que o seu ministro da Economia demissionário havia anunciado .
O primeiro-ministro anterior a Lecornu, François Bayron, havia sido destituído pelo parlamento através de voto de desconfiança e em rechaço ao corte de gastos sociais de 44 bilhões de euros.
A “missão” de que Lecornu foi incumbido é de enfiar goela abaixo dos franceses esse orçamento projetado para atender aos especuladores e para desviar dinheiro para o rearmamento, com as mínimas concessões possíveis.
A oposição de esquerda exige a suspensão da reforma da previdência, para elevar a idade mínima de 62 anos para 64 anos e a principal central sindical, a CGT, vem exigindo um aumento imediato de 200 euros no salário mínimo e denunciado que os servidores públicos estão com os salários congelados e perderam 24% em 20 anos 23% do poder aquisitivo.
Lecornu, ex-ministro da Defesa de Macron, é próximo da direita tradicional dos Les Républains, que prometeu apoiar, mas não participar do governo macronista.
O Partido Socialista anunciou, como condição para não votar pela censura de Lecornu-2, que se comprometa em suspender a implementação da reforma da Previdência até à eleição de 2027.
Os ecologistas – que participaram da Nova Frente Popular nas eleições intermediárias, ao lado dos insubmissos, dos comunistas e dos socialistas – também reagiram à arrogância de Macron. “Isso tudo vai acabar muito mal”, criticou Marine Tondelier, secretária nacional do partido, que se declarou “triste e zangada pela França “
“Emmanuel Macron é o principal responsável pelo impasse do país”, manifestou-se o PCF, que lembrou que há um ano, apesar da derrota de seus apoiadores nas eleições legislativas de 2024, foi ele quem, com o apoio da base comum, decide recusar qualquer mudança de direção política”.
“Ele disse não à nomeação de um primeiro-ministro de esquerda, não à revogação da reforma da Previdência, não ao aumento de salários e pensões, não à tributação dos mais ricos e do capital, não à transformação das ajudas públicas às empresas, não ao desenvolvimento dos serviços públicos e a um verdadeiro debate sobre o seu financiamento”, acrescentou o partido, chamando a derrotar o macronismo e a extrema-direita.
Qualquer que seja a composição do segundo governo de Lecornu, o Rally Nacional “obviamente censurará imediatamente esta equipe sem futuro, cuja única razão de existir é o medo da dissolução, ou seja, do povo”, escreveu Jordan Bardella, presidente do partido, no X, na sexta-feira à noite.
Esta posição não é surpreendente: Marine Le Pen anunciou desde segunda-feira, dia da renúncia do próprio Lecornu, que censurará todos os futuros governos, de esquerda, de direita, macronistas…
Também a mídia francesa se escandalizou com a renomeação de Lecornu. “Da renúncia inesperada de Lecornu à sua recondução pelo Presidente, a história de uma semana louca no governo Macron”, registrou o Libération. “Lecornu renomeado: a dissolução está se tornando inevitável?”, questionou o Humanité. Em editorial, o Figaro analisou a “pantomina francesa”. “Emmanuel Macron mantém Sébastien Lecornu em Matignon, apesar da hostilidade dos partidos”, afirmou, salomonicamente, Le Monde.
Para Alain Minc, ex-assessor próximo de Macron, o presidente “tornará a França muito pior” e “o Reagrupamento Nacional [de Marine Le Pen] está à beira do poder”. “Os erros de Macron estão se acumulando e ele se tornou “politicamente radioativo… e adicionou erros aos erros”, acrescentou.
O ex-assessor também apontou o abismo entre o governo Macron e a realidade econômica: “As pessoas não estão consumindo, os empreendedores não estão investindo, os atores estrangeiros não querem mais vir até nós.”