Maior greve dos ferroviários em 30 anos paralisa Inglaterra

Ferroviários ingleses se manifestam nas estações exigindo "cortes nos lucros não nos empregos" (Morning Star)

40 mil trabalhadores ferroviários param em meio à maior inflação em 40 anos

Diante da maior inflação em 40 anos, há três anos sem reajuste e sob ameaça de 2.900 demissões compulsórias, 40 mil trabalhadores das ferrovias britânicas estão realizando a maior greve do setor no Reino Unido em 30 anos, que teve início na terça-feira (21) e irá alternadamente até sábado (25).

Na quinta-feira (23), foi a vez dos funcionários da British Airways [aviação] aprovarem uma paralisação no maior aeroporto inglês, Heathrow, em Londres, em meio a alertas de que o país está diante de um “verão do descontentamento” à medida que a inflação já chegou a 9%.

 “Os trabalhadores britânicos precisam de um aumento salarial”, alertou Mick Lynch, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores Ferroviários, Marítimos e de Transporte (RMT), à Sky News, sobre a greve na Network Rail, empresa que cuida da manutenção da malha ferroviária.

O sindicato orientou os passageiros a não usar trens, a menos que seja absolutamente necessário durante toda a semana, com apenas um em cada cinco serviços funcionando, começando no final da manhã e terminando no início da noite, por volta das 18h30, por exigência legal.

Os piquetes do RMT têm recebido a solidariedade de outros sindicatos, ativistas populares e alguns parlamentares. A paralisação vem sendo observada com atenção por várias categorias, que também estão se mobilizando contra a carestia, que foi agravada pelas sanções decretadas pelos países da Otan contra a Rússia.

As convocações à greve vêm se espalhando como um rastilho: professores, médicos, enfermeiros, garis, aeronautas, trabalhadores dos correios e das telecomunicações.

“Nossos membros estão liderando o caminho para defender todos os trabalhadores que tentam obter um aumento salarial e alguma segurança no emprego”, afirmou Lynch. Ele acrescentou que numa economia moderna, “os trabalhadores precisam ser devidamente recompensados pelo seu trabalho, gozar de boas condições e ter a tranquilidade de que o seu emprego não lhes será tirado”.

O secretário de Transportes, Grant Shapps, tem se pronunciado contrário a qualquer concessão ao sindicato e inclusive ameaçou mudar a lei de greve para permitir a contratação temporária de fura-greves.

Lynch exigiu que Shapps, ou sente à mesa de negociações, ou saia do caminho, para que o sindicato possa fechar um acordo com a Network Rail. “O que não podemos aceitar é que milhares de trabalhadores ferroviários sejam jogados no lixo depois de serem elogiados como heróis durante a Covid. A RMT continuará sua mobilização até que um acordo seja alcançado.”

Ferroviários advertiram ainda que o corte de pessoal planejado ameaça a própria segurança dos usuários dos trens, já que é o trabalho de manutenção da rede que impede descarrilamentos e acidentes com vítimas.

NO LIMITE

A primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, pediu ao governo Johnson que tenha “respeito” pelos trabalhadores, e resolva a disputa que está “paralisando” os trens e o Reino Unido.

Segundo a Reuters “um aumento no custo de alimentos e combustível está empurrando muitos orçamentos domésticos para o limite, levando os sindicatos a exigir aumentos salariais mais altos para seus membros”, enquanto o governo pleiteia “contenção salarial para evitar uma espiral inflacionária”.

De Ruanda, para onde foi participar de reunião da Commonwealth [Comunidade Britânica] o primeiro-ministro Boris Johnson classificou a greve como “desnecessária”.

O deputado conservador Tobias Ellwood, presidente do comitê de Defesa do parlamento inglês, chamou aos trabalhadores em greve de “amigos de Putin”, exigindo que a paralisação seja suspensa para não  atrapalhar o socorro de Londres ao regime de Kiev e seus neonazis.

“Acho que a Rússia deve estar gostando dessa distração auto-infligida, satisfeita em ver que o único governo na Europa que está realmente enfrentando Putin está completamente distraído dessa maneira … ‘por favor, não seja amigo de Putin, volte às negociações hoje para que possamos colocar o país em movimento novamente’”, insistiu Ellwood, que está entre os possíveis candidatos a candidato nas hostes conservadoras em caso da queda do festeiro Johnson.

Por sua vez o líder do Partido Trabalhista no parlamento, o blairista de carteirinha Keir Starmer, proibiu a bancada de ir aos piquetes de greve manifestar apoio, ameaçando de punição a três deputados que já foram. Ele tem exortado o público britânico a “fazer sacrifícios” diante da “dor econômica”, aliás agravada pelas sanções contra a Rússia.

O secretário-geral adjunto da RMT, Eddie Dempsey, disse ao programa Today da Rádio 4 : “Onde quer que estejamos lidando com alguém que não seja diretamente controlado pelo [Departamento de Transportes], estamos progredindo: metrô de Londres 8,5%; Docklands Light Railway, temos um acordo a par com a inflação [9%]; Crossrail, mesma coisa; Transporte para o País de Gales, estamos negociando algo lá agora; Merseyrail, 7,1%.”

Se as negociações não avançarem, já há a sugestão de nova data de greve na Network Rail, 9 de julho.

Outras 11 operadoras do fragmentado sistema de trens britânico já têm datas de votação de indicação de greve até 11 de julho. A Network Rail está oferecendo 3% – na prática, com a maior inflação em décadas, uma redução de salário.

ARROCHO DOS SERVIDORES PÚBLICOS

De acordo com o jornal Times, de Londres, o governo Johnson está intransigente em manter o arrocho salarial sobre os servidores públicos, com o Tesouro determinando aos ministros que “quaisquer aumentos salariais para funcionários do setor público devem vir de seus orçamentos existentes”, o que significa que qualquer financiamento extra implicará em cortes de gastos. “Isso define um aumento salarial máximo em todo o setor público de apenas 3% já orçados – um corte de fato de mais de 10% até o outono devido à inflação”.

Também na privatizada British Telecom (BT) o arrocho anunciado poderá provocar a primeira greve desde 1987.

PESSOAL DOS CORREIOS

Na próxima semana, será a vez dos 115 mil trabalhadores dos privatizados Correios começarem a votar indicativo de greve nacional, cujo resultado deve ser divulgado em 19 de julho.

A empresa só quer dar 2% de reajuste, com adicional de 1,5% condicionado à aceitação do trabalho obrigatório aos domingos, à redução no pagamento de auxílio-doença e subsídios, a trabalho flexível sem horários fixos de término ou horas extras e uma força de trabalho de dois níveis com novos iniciantes com salários e condições mais baixas. Os 2% restantes dependeriam de metas de produtividade adicionais.

A indignação do pessoal dos correios também cresceu muito com a revelação de que o executivo-chefe dos Correios, Simon Thompson, que quer encolher o poder aquisitivo de seus funcionários, concedeu a si mesmo um bônus de £ 143.000, elevando seu pacote anual para cerca de £ 753.000 (+ 19%!).

Ao ser informado na reunião com o Royal Mail na semana passada de que o reajuste seria de 2%, a ser implementado por “decisão executiva”, o secretário-geral adjunto do sindicato dos Correios, Terry Pullinger advertiu a patronal que corria o risco de provocar “o maior voto de sim que este sindicato já teve” em uma votação de greve.

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