Operação Estrela Cadente foi deflagrada na quinta-feira, com mandado de busca e apreensão na sede do BTG Pactual em São Paulo
O depoimento de Antônio Palocci sobre o fornecimento de informação privilegiada do governo ao então mandachuva do BTG Pactual, André Esteves, tem uma característica: o relato coincide inteiramente com os fatos – e até ajuda a explicar um fenômeno extraordinário que, até agora, estava envolto em mistério, apesar das versões à boca pequena.
Em 2011, um fundo administrado pelo BTG Pactual, o Fundo Bintang, teve uma rentabilidade de 402%, com apostas sobre a taxa básica de juros (a Selic, estipulada pelo Banco Central).
A média dos fundos do mesmo tipo, em 2011, foi 25%.
O resultado do fundo administrado pelo BTG foi anômalo em vários sentidos: um deles foi o comprometimento de quase todo o patrimônio do fundo em apostas sobre qual seria a taxa básica de juros, algo, em princípio, arriscadíssimo.
Outro, é que o fundo acertou quando todos erraram: em 31 de agosto de 2011, quando o BC fez uma reunião de seu Comitê de Política Monetária (Copom) para estabelecer a taxa básica de juros, as empresas financeiras previam que ela seria mantida, tal como estava, em 12,5%.
Por exemplo, diz uma matéria jornalística de alguns meses depois: “todas as 73 instituições financeiras consultadas em uma pesquisa da Agência Estado esperavam que a taxa seria mantida nos 12,5%” (cf. Leandro Modé, Fundo administrado pelo BTG rende 400% em 2011 com aposta em juros, OESP 28/04/2012).
No entanto, a taxa básica, nessa reunião do Copom, foi reduzida – de 12,5% para 12% – e o fundo do BTG Pactual ganhou muito dinheiro, porque acertou, enquanto os outros erraram a previsão.
Essa multiplicação de dinheiro do Fundo Bintang, na roda do cassino financeiro, era o fenômeno extraordinário que mencionamos acima.
Agora, em seu depoimento, Palocci relata:
“Em agosto de 2011, Dilma Rousseff se reuniu com Guido Mantega, então Ministro da Fazenda, e Alexandre Tombini, então presidente do Banco Central.
“No encontro, Alexandre Tombini informou que o Banco Central, no mês seguinte, contrariando a posição que vinha tendo, no sentido de aumentar a taxa de juros Selic, iria baixar a taxa de juros, de 12,42% para 11,90%.
“A taxa de juros seguia uma tendência de alta, desde 2009. E foi justamente neste mês que se alterou a tendência e houve uma guinada dos juros para baixo, pela primeira vez após cerca de dois anos.
“Segundo Alexandre Tombini, essa alteração no curso da taxa de juros era necessária por causa da volta da crise na Europa e do consequente resfriamento da atividade econômica que atingiria todo o mundo, inclusive o Brasil, como de fato acabou acontecendo.
“De posse dessa informação privilegiada, Guido Mantega foi até André Esteves e informou este que a taxa de juros do Banco Central iria ser alterada para menos.
“André Esteves, por intermédio do BTG Pactual, realizou diversas operações no mercado financeiro, obtendo lucros muito acima da média dos outros operadores financeiros.
“Tratou-se de operações do Fundo Bintang, administrado pelo BTG Pactual. Essas operações, contrariando todos os operadores do mercado, apostaram nas oscilações para baixo da taxa básica de juros e renderam mais de 400% de lucro no ano. (…)
“Esta operação gerou depósito no fundo destinado a LULA.
“Só para se ter uma ideia, entre 31 de agosto e 1º de setembro, dia de inflexão da taxa de juros, o Fundo Bintang saltou de 252,84% de rentabilidade acumulada para 335,76%. Num só dia!
“Enquanto isso, a rentabilidade do CDI variou de 11,81% para 11,87%.
“Diante dessa operação atípica do BTG Pactual, a qual contrariou a própria expectativa do mercado no sentido de se continuar ou manter o aumento da taxa de juros do Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários chegou a instalar uma investigação e comentou-se intensamente que André Esteves tinha, finalmente, por intermédio de Guido Mantega, conseguido ‘grampear o Banco Central’.
“Como contrapartida à informação privilegiada de Guido Mantega, André Esteves pagou R$ 9,5 milhões como doação oficial de campanha de Dilma Rousseff nas eleições de 2014, além de rentabilizar as vantagens indevidas de Luiz Inácio Lula da Silva nos fundos que mantinha no BTG.
“Vale dizer que, com relação ao fundo Bintang, foi aprovisionado para Luiz Inácio Lula da Silva 10% em vantagens indevidas sobre o lucro que o fundo obteve com as informações privilegiadas fornecidas por Guido Mantega.”
O BTG Pactual está sendo investigado na Operação Estrela Cadente, deflagrada na quinta-feira (03/10). Mais especificamente, anunciou o Ministério Público Federal:
“A investigação, instaurada a partir de colaboração premiada de Antônio Palocci, apura o fornecimento de informações sigilosas sobre alterações na taxa de juros Selic, por parte da cúpula do Ministério da Fazenda e do Banco Central, em favor de um fundo de investimento administrado pelo BTG Pactual, que, com elas, teria obtido lucros extraordinários de dezenas de milhões de reais.”
O relato de Palocci sobre o BTG Pactual está no anexo 9 de sua confissão (ao todo, são 84 anexos).
C.L.