O presidente discursou na abertura da reunião do XXVI Foro de São Paulo, realizado em Brasília, e defendeu que a esquerda deve aprender com seus erros para garantir os avanços da democracia e as conquistas sociais
O presidente Lula discursou na solenidade de abertura da reunião do XXVI Foro de São Paulo, realizada em Brasília nesta quinta-feira (29). Ele fez um histórico de toda a trajetória do movimento desde a sua fundação até hoje e disse que não se sente ofendido quando a direita o chama de comunista.
“Eles nos acusam de comunistas, achando que nós ficamos ofendidos com isso. Nós não ficamos ofendidos, nós ficaríamos ofendidos se nos chamassem de nazistas, de neofascistas, de terroristas, mas de comunista, de socialista, nunca”, disse Lula, lembrando das primeiras iniciativas de reunir a esquerda no continente. Ele lembrou da primeira conversa que teve com Fidel sobre a criação do foro e a não permissão para a participação de Hugo Chávez no segundo encontro.
“O companheiro Chávez, no segundo encontro que nós tivemos, em El Salvador, o Chávez quis participar do Foro de São Paulo e nós não deixamos. Nós não deixamos porque na época o Chávez tinha tentado dar o golpe na Venezuela, ele era coronel, era professor da academia militar na Venezuela. Tinha havido o Caracazo na Venezuela, tinham morrido 300 pessoas, o Chávez tinha tentado dar um golpe e quando chegou e em El Salvador, o Chávez quis participar”, contou o presidente.
Lula chamou a atenção para a necessidade de mais autocrítica dos erros e menos críticas a outros companheiros. “As mesmas pessoas que aplaudem a gente durante a campanha muitas vezes são as mesmas pessoas que vaiam a gente. E a gente ao invés de perguntar por que é que elas estão vaiando, a gente as trata como inimigas. E muitas vezes elas estão vaiando porque nós não fizemos aquilo que nós prometemos durante o processo eleitoral. Nós não cumprimos aquilo que nós dissemos que íamos fazer”, argumentou.
“Eu voltei a governar este país, primeiro para restabelecer o processo democrático deste país. A gente gosta de democracia, a gente gosta de ter gente protestando contra a gente, a gente gosta quando tem greve contra a gente, a gente gosta quando negocia’, disse Lula. “Nada disso é contra a democracia, tudo isso é resultado da democracia. A democracia não é um pacto de silencia, a democracia é uma sociedade em movimento, em busca de melhores dias, de melhores conquistas e de melhor qualidade de vida”, prosseguiu.
“Então”, continuou Lula, “a democracia não pode incomodar a nenhum dirigente”. “E eu sei o quanto nós perdemos no nosso continente. Eu sei o quanto foi triste a Argentina ter um presidente de direita há pouco tempo atrás. Eu sei o quanto foi triste a saída do Rafael Correa. Eu sei o quanto foi triste a direita chilena. Eu sei o quanto foi triste o golpe na Bolívia. Eu sei o quanto foi triste a gente ter a companheira Dilma Rousseff impichada aqui neste país”, afirmou.
“E nós, ao invés de ficarmos lamentando, temos que tirar lições. Aonde é que nós erramos? O que nós não conseguimos fazer? Por que aconteceu tal coisa conosco? Por que depois de 30 anos tentando fazer a revolução, a frente Farabundo Martí perde a eleição para a direita e na reeleição tem apenas 14% dos votos?”, argumentou o presidente.
“Então, é preciso que a gente aprenda a exercitar a democracia, o máximo possível que a gente possa exercitar. Porque a democracia, ela é muito importante na medida em que você estabelece uma alternância de poder. A democracia é um exercício constante, eu digo sempre que a democracia é como o casamento. Um casamento, se o marido e a mulher não fazem concessão um para o outro, todo santo dia, o casamento acaba”, destacou.
“Normalmente, quando uma pessoa chega à Presidência da República, as pessoas não ousam participar do Foro de São Paulo. A verdade é essa, os nossos companheiros, mesmo os nossos companheiros não gostavam muito de participar do Foro de São Paulo, porque muitas vezes a gente é eleito presidente da República e a gente não gosta de ouvir críticas”, acrescentou Lula.
O presidente afirmou que a esquerda tem que mudar o discurso. “Muitas vezes a direita tem mais facilidade do que nós com o discurso fascista. Aqui no Brasil, nós enfrentamos o discurso do costume, o discurso da família, o discurso do patriotismo, ou seja, aqui nós enfrentamos o discurso de tudo aquilo que a gente aprendeu historicamente a combater”, disse Lula.
“Na Europa, por exemplo”, prosseguiu o líder brasileiro, “a esquerda perdeu o discurso para a questão da migração. Ou seja, a esquerda não sabe defender a questão dos imigrantes. É a direita, que é contra de verdade, e muitas vezes a direita, como a Angela Merkel, tem uma posição política correta de aceitar milhares de imigrantes na Alemanha”.
“Nós precisamos tentar discutir os nossos erros, para que a gente possa corrigi-los. Eu não acho, companheira Gleisi, que a gente entre a esquerda aqui, possa um ficar fazendo crítica ao outro. Muitas vezes a gente tem o hábito de falar “ah, tal cara está errando, então a gente precisa punir, a gente não precisa conversar, nós não temos de conversar”. Não, entre amigos, a gente conversa pessoalmente. A gente não faz críticas públicas porque as críticas interessam à extrema-direita, não interessam ao povo”, defendeu Lula, lembrando que Fidel sempre criticava pessoalmente e elogiava em público.
Leia o discurso de Lula na íntegra!
Discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na abertura da reunião do Foro de São Paulo
Bem, a primeira coisa que eu queria pedir desculpa era de não precisar ler uma nominata aqui com os nomes dos companheiros que estão na mesa, porque já foi lido por três pessoas que falaram antes de mim e eu iria então tomar meu tempo de falar com a nominata. Como ninguém aqui é candidato a nada, entonces yo no preciso repetir os nomes.
Uma coisa que eu queria lembrar a vocês é que quem tem 43 anos hoje, eu tinha apenas 10 anos de idade, quando nós fizemos a primeira reunião do Foro de São Paulo. Eu quero crer que muitos de vocês que estão participando deste fórum não tinham mais do que 10 anos de idade em 1990.
E eu queria contar um pouquinho da história de por que nós criamos o Foro de São Paulo, por que nós discutimos a criação de um fórum. A primeira coisa é que em 1985 eu tinha consciência de que jamais a gente poderia chegar ao poder pela via do voto, pela via democrática. Essa era uma coisa que eu tinha na cabeça naquele momento: não é possível que um operário possa chegar à Presidência da República pela via do voto.
Eu tinha sido candidato a governador de São Paulo em 1982, eu imaginei que ia ganhar as eleições pela quantidade de gente que nós colocávamos na rua, mas quando chegou no resultado eleitoral, eu tive apenas 10% dos votos. Eu fiquei muito decepcionado, porque eu acreditava que trabalhador votava em trabalhador e constatei que não era tão verdadeiro assim. Era preciso que a gente criasse um mecanismo de fazer com que evoluísse a consciência política das pessoas para elas poderem votar na gente.
E teve as eleições de 89. O PT tomou a decisão de me lançar candidato a presidente em 89, numa eleição em que disputavam a presidência da República todas as grandes figuras públicas e históricas do meu país.
Eu era, entre todos os candidatos, uma coisa muito pequena, era um operário metalúrgico, criador de um partido político de apenas 8 anos de idade, disputando as eleições contra figuras importantes como Leonel de Moura Brizola, um grande companheiro que tinha sido cassado em 1964, que ficou no exílio e que voltou ao Brasil exatamente próximo da época de disputar as eleições.
Contra o doutor Ulysses Guimarães, que era presidente do maior partido político do Brasil, foi presidente da Constituinte e tinha um partido que tinha 23 governadores de estados e 306 deputados e senadores. Não havia quem não acreditasse que o Ulysses Guimarães não fosse presidente da República. Tinha um ex-governador de São Paulo, Mário Covas, que era uma figura pública muito importante no Brasil. Tinha o vice-presidente da República, Aureliano Chaves, e tinha muitas pessoas importantes da política brasileira disputando as eleições.
E eu imaginava que a gente não teria nenhuma chance de disputar aquela eleição, nenhuma chance. E aconteceu uma surpresa: eu fui para o segundo turno das eleições. E pela primeira vez, um operário metalúrgico de um partido de esquerda no Brasil, que tinha como aliado apenas o PC do B, nós conseguimos quase 47% dos votos e quase ganhamos as eleições.
A partir do resultado das eleições de 89, numa viagem a Cuba, eu e o companheiro Marco Aurélio começamos a conversar com os companheiros do Partido Comunista Cubano e com o companheiro Fidel Castro e aventamos a possibilidade de fazermos uma reunião com toda a esquerda latino-americana, que muitos na época lutavam em partidos muito pequenos tentando fazer a revolução.
E nós então resolvemos convidar todas as organizações para que, juntos, a gente pudesse discutir, através de muita organização dos trabalhadores e do povo em geral, a gente pela via democrática chegar a ganhar o poder nos nossos países. Foi assim que nasceu a ideia de a gente convocar o primeiro fórum de São Paulo. A gente queria que a esquerda da América Latina voltasse a conversar entre si e a gente queria que a esquerda da América Latina voltasse a disputar os espaços democráticos existentes nos seus países.
E aconteceu a primeira reunião em São Paulo, numa época de Copa do Mundo. Tinha país que tinha 15 organizações de esquerda, todas muito pequenas, mas todas muito cheias da verdade, todas muito conscientes que era através delas que ia acontecer a revolução no seu país. E nós então começamos a conversar pela primeira vez. Pouca gente se conhecia, pouca gente tinha relação de amizade, e a gente foi estabelecendo uma forma de conquistar confiança entre nós, para que a gente pudesse construir o que a gente chama hoje de Foro de São Paulo.
É importante vocês lembrarem. O companheiro Chávez, no segundo encontro que nós tivemos, em El Salvador, o Chávez quis participar do Foro de São Paulo e nós não deixamos. Nós não deixamos porque na época o Chávez tinha tentado dar o golpe na Venezuela, ele era coronel, era professor da academia militar na Venezuela. Tinha havido o Caracazo na Venezuela, tinham morrido 300 pessoas, o Chávez tinha tentado dar um golpe e quando chegou e em El Salvador, o Chávez quis participar.
Nós não deixamos o Chávez participar porque “olha, você não é democrático, você tentou dar golpe, você não vai participar do Foro de São Paulo”. E não foi apenas nós não, todo o Foro de São Paulo tinha essa consciência. Bom, depois a história vocês conhecem.
O dado concreto é que o Foro de São Paulo foi a primeira experiência latino-americana em que a esquerda resolveu se juntar sem precisar tirar as suas diferenças nem tampouco acabar com as suas divergências, mas ela resolveu discutir, do ponto de vista da organização democrática, disputar os espaços políticos do nosso continente.
E vocês sabem que a vitória foi muita nesse período. Vocês sabem que a América Latina, e sobretudo a América do Sul, viveu o seu melhor momento em 500 anos de 2002 a 2010. Foi a vitória na Argentina, no Chile, no Brasil, na Venezuela, no Equador. Foi a vitória inclusive de pessoas mais progressistas nos outros países que estiveram do nosso lado, além da vitória do nosso companheiro Chávez na Venezuela.
Nós vivemos um período de muita expansão, de conquista social e de participação política no nosso continente. Eu não creio que tenha havido um outro momento histórico em que a sociedade da América do Sul e da América Latina teve tantas conquistas e tantas políticas de inclusão social como tiveram nesse período de 2000 a 2010, 2012, até 2015, quando fizeram o impeachment da companheira Dilma Rousseff.
E vocês sabem quantas vezes nós fomos acusados, vocês sabem quanta difamação e quantos ataques pejorativos se faz contra a esquerda na América do Sul. Nós não somos vistos pela extrema-direita fascista, nem do Brasil e nem do mundo, como organizações democráticas. Eles nos tratam como se nós fôssemos terroristas, eles nos acusam de comunistas, achando que nós ficamos ofendidos com isso.
Nós não ficamos ofendidos, nós ficaríamos ofendidos se nos chamassem de nazistas, de neofascistas, de terroristas, mas de comunista, de socialista, nunca. Isso não nos ofende, isso nos orgulha, muitas vezes e muitas vezes nós sabemos que merecemos esses ataques.
Normalmente, quando uma pessoa chega à presidência da República, as pessoas não ousam participar do Foro de São Paulo. A verdade é essa, os nossos companheiros, mesmo os nossos companheiros não gostavam muito de participar do Foro de São Paulo, porque muitas vezes a gente é eleito presidente da República e a gente não gosta de ouvir críticas.
As mesmas pessoas que aplaudem a gente durante a campanha muitas vezes são as mesmas pessoas que vaiam a gente. E a gente ao invés de perguntar por que é que elas estão vaiando, a gente as trata como inimigas. E muitas vezes elas estão vaiando porque nós não fizemos aquilo que nós prometemos durante o processo eleitoral. Nós não cumprimos aquilo que nós dissemos que íamos fazer.
Então, é preciso que a gente aprenda a exercitar a democracia, o máximo possível que a gente possa exercitar. Porque a democracia, ela é muito importante na medida em que você estabelece uma alternância de poder. A democracia é um exercício constante, eu digo sempre que a democracia é como o casamento. Um casamento, se o marido e a mulher não fazem concessão um para o outro, todo santo dia, o casamento acaba.
Se numa família, o pai e a mãe não fazem concessão para os filhos, a relação fica ruim. Então a democracia é isso, a democracia é você estar fazendo concessão toda hora, conquista toda hora, derrota toda hora, mas estabelecendo uma forma democrática de viver democraticamente na adversidade. E nós não podemos criar problemas uns para os outros.
É importante a gente ter clareza disso. Eu, aqui no Brasil, é a primeira vez que um presidente governa este país pela terceira vez, é a primeira vez. Eu certamente, se tivesse juízo, não teria voltado a ser candidato a presidente da República, porque eu tinha deixado o meu segundo mandato com 87% de bom e ótimo neste país. Eu poderia utilizar esse capital histórico para os anais da história e não voltar.
Afinal de contas, eu tenho 77 anos de idade. Não parece, vocês estão vendo que eu estou aqui muito jovem. E eu digo todo dia, para mim acreditar, eu não digo para vocês acreditarem, eu digo para mim acreditar, a velhice só acontece quando a pessoa não tem uma causa. Se todo ser humano tiver uma causa para que ele se dedique, para que ele lute, a velhice não acontece, a velhice, as rugas podem aparecer o rosto, mas ela não aparece dentro da sua consciência. E aí você continua sempre novo, sempre disposto a lutar.
E eu voltei a governar este país, primeiro para restabelecer o processo democrático deste país. A gente gosta de democracia, a gente gosta de ter gente protestando contra a gente, a gente gosta quando tem greve contra a gente, a gente gosta quando negocia. Nada disso é contra a democracia, tudo isso é resultado da democracia. A democracia não é um pacto de silencia, a democracia é uma sociedade em movimento, em busca de melhores dias, de melhores conquistas e de melhor qualidade de vida.
Então, a democracia não pode incomodar a nenhum dirigente. E eu sei o quanto nós perdemos no nosso continente. Eu sei o quanto foi triste a Argentina ter um presidente de direita há pouco tempo atrás. Eu sei o quanto foi triste a saída do Rafael Correa. Eu sei o quanto foi triste a direita chilena. Eu sei o quanto foi triste o golpe na Bolívia. Eu sei o quanto foi triste a gente ter a companheira Dilma Rousseff impichada aqui neste país.
E nós, ao invés de ficarmos lamentando, temos que tirar lições. Aonde é que nós erramos? O que nós não conseguimos fazer? Por que aconteceu tal coisa conosco? Por que depois de 30 anos tentando fazer a revolução, a frente Farabundo Martí perde a eleição para a direita e na reeleição tem apenas 14% dos votos?
A gente não pode a vida inteira ficar criticando os outros. De vez em quando a gente tem que olhar para dentro de nós e saber o que nós fizemos de errado. Por que é que aconteceu aquilo? Por que é que teve o impeachment da presidenta Dilma? Foi só erro da extrema-direita ou nós temos erros enquanto partido político? De vez em quando, a gente tem que pensar, a gente tem que meditar, para que a gente consiga evitar que novos erros atrapalhem a caminhada da gente pela conquista da qualidade de vida do nosso povo.
Eu voltei a governar este país porque eu tenho uma missão. Não é nem compromisso de programa de governo, é uma missão. Nós precisamos acabar com a desigualdade no mundo, não é possível a gente continuar com a desigualdade na comida, no salário, na educação, na moradia, a desigualdade de gênero, a desigualdade racial, ou seja, todo santo dia a gente vê aumentar o número de pobres do planeta. Crianças morrem de fome enquanto os ricos tentam pagar passagem de foguete ou de submarino para procurar um novo mundo, quando o mundo deles é esse.
Então, companheiros e companheiras do Foro de São Paulo. Entre nós, já não tem mais muita gente que ajudou a fundar o fórum. Mesmo do PT, eu tava vendo, Zé, aparece ali naquele filme, aparece eu, o Marco Aurélio, você e o Gushiken. Marco Aurélio já morreu, o Gushiken já morreu, resta nós dois. Como eu pretendo viver até 120 anos, se prepare, porque eu vou continuar preparando os meus discursos aqui.
Aqui no Brasil eu costumo chamar a morte de Caetana e aonde a Caetana estiver eu tô longe. E eu até tomei uma decisão de não visitar mais cemitério, não visitar mais pessoas doentes no hospital, eu agora quero visitar só criança nascendo, só coisa nova brotando, sabe, porque se eu levantar a mão pode ser que alguém queira me pegar e me levar, e eu não vou permitir isso.
Eu quero dizer para vocês que o Foro de São Paulo é uma bênção que nós conseguimos criar na América Latina. A esquerda tem problemas no mundo inteiro. Eu não sei quantos companheiros europeus tem aqui neste encontro, mas é preciso que a gente rediscuta o discurso da esquerda. É preciso que a gente repense o que a gente quer e o que a gente tem que fazer para conquistar.
Muitas vezes a direita tem mais facilidade do que nós com o discurso fascista. Aqui no Brasil, nós enfrentamos o discurso do costume, o discurso da família, o discurso do patriotismo, ou seja, aqui nós enfrentamos o discurso de tudo aquilo que a gente aprendeu historicamente a combater.
Na Europa, por exemplo, a esquerda perdeu o discurso para a questão da migração. Ou seja, a esquerda não sabe defender a questão dos imigrantes. É a direita, que é contra de verdade, e muitas vezes a direita, como a Angela Merkel, tem uma posição política correta de aceitar milhares de imigrantes na Alemanha.
Nós precisamos tentar discutir os nossos erros, para que a gente possa corrigi-los. Eu não acho, companheira Gleisi, que a gente entre a esquerda aqui, possa um ficar fazendo crítica ao outro. Muitas vezes a gente tem o hábito de falar “ah, tal cara está errando, então a gente precisa punir, a gente não precisa conversar, nós não temos de conversar”. Não, entre amigos, a gente conversa pessoalmente. A gente não faz críticas públicas porque as críticas interessam à extrema-direita, não interessam ao povo.
Se nós tivermos algum problema com algum companheiro, a gente ao invés de criticá-los publicamente, a gente tem que conversar pessoalmente. Eu sou presidente da República, mas nenhum de vocês, nenhum, nem do PT, nem dos partidos brasileiros e nem dos partidos aliados da esquerda latino-americana, está proibido de fazer crítica a mim ou de chamar o PT à atenção por erro que eu possa cometer.
Porque, senão, a gente não é companheiro. Senão, a gente não é aliado de verdade. Aliado não é aquele que está toda hora agradando e alisando, muitas vezes o verdadeiro amigo é aquele que diz que você está errado. Muitas vezes, o verdadeiro companheiro é aquele que te chama a atenção.
E é por isso que eu aprendi, ao longo da minha vida, a respeitar e admirar o companheiro Fidel Castro. Porque desde 1985, em toda a relação que eu tive com o Fidel Castro, ele nunca deixou de fazer a crítica que ele tinha que fazer pessoalmente e nunca deixou de elogiar publicamente. Ele agia diferente, ele criticava pessoalmente e elogiava publicamente.
Muitas vezes, nós na esquerda latino-americana nos autodestruímos. Porque utilizamos muitas vezes os nossos adversários nos meios de comunicação para falar mal de nós, para tentar nos destruir, para mostrar os nossos defeitos. Porque as virtudes nunca são mostradas.
Então, queridos companheiros, eu queria terminar a minha fala dizendo para vocês. Eu, embora tenha 77 anos, a minha energia para fazer política é de 30. E vocês sabem das tarefas que nós temos a nível internacional. Esse ano, nós temos muitas tarefas. Primeiro, nós temos os BRICS na África do Sul, depois nós temos o G20 na Índia. Depois, nós temos a reunião da Celac com a União Europeia em Bruxelas, este mês.
Depois, temos a primeira reunião amazônica feita no estado do Pará, com todos os países amazônicos, inclusive estamos convidando a Guiana Francesa para participar. Estamos convidando a Indonésia e estamos convidando os dois Congos.
Mais ainda: nós vamos ter agora em Letícia na próxima semana, uma reunião com especialistas e cientistas para preparar a chamada Reunião de Belém. E mais importante, em 2025 a gente vai ter pela primeira vez, uma reunião para discutir a questão do clima sobre a Amazônia dentro da Amazônia, num estado amazônico, para as pessoas saberem o que é, efetivamente, a Amazônia.
E queremos construir com os 8 países da América do Sul uma política unitária, para que a gente possa chegar em dezembro ou quem sabe antes ainda, nos Emirados Árabes, para a COP28 com a posição correta em defesa dos países que mantém as florestas em pé como América do Sul, o Congo, o Congo Democrático e mais a Indonésia. A nossa tarefa é muito grande, é muito grande e nós não podemos perder um minuto de tempo, muito menos de espaço, senão a gente perde.
O Brasil ficou fora do mundo praticamente seis anos, seis anos em que o Brasil não era levado a sério em lugar nenhum do mundo. Nós voltamos e queremos voltar, não para o Brasil voltar a ter destaque, nós queremos voltar para que a América do Sul e a América Latina voltem a ter destaque.
Nós voltamos para brigar pela autonomia das Nações Unidas. A ONU não pode continuar com a mesma dimensão que ela teve em 45. É preciso aumentar os membros da ONU, com a África, com a América Latina, com os países asiáticos e é preciso mudar os membros permanentes do Conselho de Segurança. Porque são eles que produzem armas, são eles que produzem a guerra, sem passar pela decisão do Conselho de Segurança.
Então nós estamos numa trincheira, além de cuidar do nosso país, nós temos que cuidar de fortalecer o papel dos setores progressistas e democráticos da sociedade nesse mundo, porque a direita fascista, ela tem crescido. Tem crescido em muitos lugares, em lugares que a gente imaginou que ela voltava a crescer. Ela voltou a crescer.
Por isso eu queria fazer um apelo. Companheira Gleisi Hoffmann, presidente do PT, companheira do PC do B, companheiros dos partidos da América Latina. Nós não temos tempo a ficar brigando por coisas menores. Quem fazia crítica ao companheiro Tabaré ou quem fazia crítica ao companheiro Pepe Mujica sabe quanta falta fazem eles no poder para a gente poder fazer críticas.
Portanto, é muito melhor ter um companheiro da gente cometendo alguns equívocos para a gente criticar do que ter alguém de direita governando, que não permite sequer que a gente tenha espaço para fazer crítica. No Brasil, nós aprendemos. Quatro anos da extrema-direita neste país foi uma lição para todos nós.
Mas ou nós criamos juízo, ou nós nos organizamos e nós trabalhamos para resolver os problemas da sociedade brasileira, sobretudo com a inclusão social, ou a extrema-direita tá aí, contanto mentiras, utilizando fake news, violentando qualquer parâmetro de dignidade para voltar ao poder.
Por isso, eu quero que vocês saibam que vocês podem contar comigo. Enquanto este coração jovem estiver pulsando, eu estarei lutando para que a gente conquiste respeitabilidade, a dignidade do povo trabalhador da nossa querida América Latina.
Um abraço, querido, e bom congresso para vocês.