O Ministério da Educação (MEC) decretou, na terça-feira (20), as novas diretrizes do Ensino Médio. Com a mudança, fica autorizada a retirada de parte do currículo que o estudante deve cumprir de forma presencial, que será repassada para a modalidade à distância.
De acordo com o decreto, o estudante que cursar o Ensino Médio no período noturno, poderá ter sua grade presencial reduzida em até 30%. Em cursos diurnos a redução do ensino presencial será de 20%. Já para os alunos da Educação para Jovens e Adultos (EJA), o percentual é de 80% do curso.
De acordo com o MEC, a aprovação do documento foi realizada no início do mês por membros do Conselho Nacional de Educação (CNE) e da Câmara de Educação Básica (CEB). Essas diretrizes fazem parte da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) proposta pelo governo Temer. A reforma do Ensino Médio só passa a valer oficialmente após a aprovação da BNCC. A expectativa do governo é aprovar a BNCC até o fim deste ano.
A medida foi homologada pelo atual ministro da Educação, Rossieli Soares, no último dia 20. Mesmo dia em que recebeu a equipe de transição do governo de Bolsonaro, que já se manifestou a favor do ensino a distância na educação básica.
Rossieli Soares, que mesmo ocupando ainda a vaga de ministro da Educação, já foi anunciado pelo governador eleito de São Paulo, João Dória, para ocupar a Secretaria de Educação durante sua gestão, diz que a adesão dos estados ao ensino a distância é opcional. “O que foi aprovado pelo CNE (Conselho Nacional de Educação) é que a educação a distância é opcional. A rede fará ou não a oferta de acordo com seu desejo, a sua conveniência e o seu controle de qualidade”, disse.
De acordo com o texto aprovado pelo CNE, o ensino não presencial deverá contemplar “preferencialmente” a parte flexível prevista pela reforma do Ensino Médio, enviada por Temer ao Congresso por meio de Medida Provisória no ano passado. Como a decisão não fala em “obrigatoriamente”, está aberta brecha para que muitas escolas passem a ensinar pela internet também conteúdos da base comum, que corresponde a 60% de todo o currículo, e é composta pelas disciplinas de Matemática e Linguagens.
FORMAÇÃO
A medida tem gerado críticas. A educação básica engloba o Ensino Infantil, Fundamental e Médio, ela é de responsabilidade do Estado e de toda a sociedade, retirar da escola seu papel na formação do caráter, da formação do indivíduo enquanto cidadão é um retrocesso.
É na escola que a criança e o adolescente aprendem a trabalhar em equipe, a lidar com as diferenças, respeitar o próximo, o limite do seu espaço e o do outro. Lições essas que o computador não ensina, mas sim, a convivência, a experiência cotidiana que ensina.
A professora e vice-presidente da FETEMS (Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul), Sueli Veiga Melo, que tem 35 anos de experiência na área da educação, afirma que a educação básica precisa ser presencial.
“Quando você pega uma parte da educação e passa ela para ser a distância, você tira uma parte importante do conteúdo, a interação. Tira a possibilidade da discussão da matéria, que é fundamental nessa etapa do conhecimento, esse direito da integração professor com aluno, não adianta dizer que é igual, por que não é”, pontua Sueli sobre a medida.
De acordo com Sueli, esse período é um momento de formação geral do estudante, tanto para vida, quando para o mercado de trabalho ou universidade, “é inconcebível uma parte tão importante ser a distância”.
A professora e chefe de Divisão de Educação a Distância da SEDFOR (Secretaria Especial de Educação a Distância e Formação de Professores), Daiani Damm Tonetto, de 31 anos, argumenta que mesmo sendo uma defensora do ensino a distância, a medida é um “tiro no pé” da educação brasileira. “Ela não reflete a realidade do ensino público brasileiro, a gente não sabe como vai ser implementado, se forem disciplinas optativas, esses alunos vão ser prejudicados”, disse.
Entre os argumentos ressaltados pela profissional está a dificuldade de acesso a tecnologias e a falta de uma cultura de aprendizagem, que segundo ela ainda não existe no Brasil. “Se você vai trabalhar a distância, precisa garantir condições de acesso a internet a todos os alunos, eles não podem ser prejudicados pela falta de acesso, a maioria das escolas não tem acesso a internet, não tem computador, como eles vão passar por esses processos de formação, se não têm nem o básico? ”, argumenta a especialista.
Para o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, não existe justificativa para a educação a distância no Ensino Médio a não ser o interesse do empresariado do setor. “A EaD não cabe na educação básica, etapa que a relação entre professor e aluno e entre os próprios alunos é fundamental para se dar a aprendizagem. Aliás, as salas de aula são comunidades de aprendizagem e isso, esse espaço, não pode se perder para todas as disciplinas, porque não é possível ordenar sobre qual é mais ou menos importante”, afirmou.