
“Manter prisioneiros algemados por período indeterminado é, infelizmente, evento de rotina” e “os presos são alimentados por tubos, defecam em fraldas e são mantidos sob restrição constante, o que viola a ética médica e a lei”, relatou o médico em carta publicada pela imprensa.
Esta matéria, cujos principais trechos divulgamos, nos foi sugerida pelo deputado israelense Ofer Cassif, da coalizão Haddash-Taal, e devido a sua relevância a traduzimos e divulgamos. Ela foi originalmente publicada pelo jornal israelense Haaretz com o título “Doctor at Israeli Field Hospital for Detained Gazans: ‘We Are All Complicit in Breaking the Law’” (Médico em Hospital de Campo para detentos de Gaza: “somos todos cúmplices na quebra da lei”), o texto, publicado no dia 4, é de autoria de Hagar Shezaf e Hauser Tov*
Segue o texto:
Um médico em um hospital de campo instalado no centro de detenção Sde Teiman, criado para aprisionar detidos em Gaza, descreveu as condições que, segundo ele, podem comprometer a saúde dos presos e colocar o governo na condição de violação da lei, afirmações constantes em carta envida há uma semana aos ministros da Defesa e da Saúde e à procuradora-geral. [A matéria não revela o nome do médico].
“Esta semana mesmo, dois prisioneiros tiveram suas pernas amputadas devido a ferimentos causados por algemas. Manter prisioneiros algemados por período indeterminado é, infelizmente, evento de rotina”, disse o médico na carta.
Ele disse que “os presos são alimentados por tubos, defecam em fraldas e são mantidos sob restrição constante, o que viola a ética médica e a lei”.
O campo de Sde Teiman foi estabelecido imediatamente com o inídio do ataque a Gaza para pender elementos do Hamás, até que pudessem ser deslocados a prisões regulares.
Naquele momento, o Knesset [parlamento israelense] aprovou uma emenda à lei que determina as condições para a manutenção de presos. Desde o início da operação por terra na Faixa de Gaza, a maioria dos detidos aí são enviados para Sde Teiman, onde são interrogados.
“Desde os primeiros dias em que entrou em operação a unidade médica até hoje, eu tenho enfrentado sérios dilemas. Mais que isso, estou escrevendo esta carta para os alertar de que esta unidade de operação não está de acordo com uma única seção das que lidam com a saúde conforme posto na “Lei de Encarceramento de Combatentes Ilegais”, afirma o médico.
Ele destaca que todos os pacientes no hospital montado em Sde Teiman têm os quatro membros algemados, independente do risco que possam trazer. Todos são vendados e alimentados por tubos. “Nestas circunstâncias, na prática, até mesmo pacientes jovens e saudáveis perdem peso em uma ou duas semanas de hospitalização”, disse o médico. Ele acrescenta que o hospital não recebe de forma regular medicamentos ou dispõe de equipamento adequado.
O porta-voz da força militar respondeu a estas denúncias dizendo que os detentos “recebem alimento suficiente para suas necessidades de saúde”, têm acesso a sanitários de acordo com sua condição médica e, se precisam ser restritos, recebem fraldas.
De acordo com o medico [prossegue a matéria] assim que submetidos a cirurgias são rapidamente retornados à unidade que conta com apenas um médico e a equipe não é suficientemente treinada.
O procedimento de manter os detentos algemados e de olhos vendados segue instrução do Ministério da Saúde depois que um dos membros da equipe médica foi atacado por um paciente. Como já dito os que estão em Sde Teiman são mantidos algemados durante 24 horas por dia.
De acordo com o médico, é exatamente devido a esta manutenção com algemas por longos períodos que acabam fazendo ferimentos que levam a graves ferimentos e à necessidade de intervenções cirúrgicas.
Em adição às denúncias do médico, três outras fontes informaram ao Haaretz que no início da invasão um preso, cujas mãos foram feridas por ficar com algemas de plástico por período prolongado, teve uma mão amputada. Um porta-voz do exército israelense afirmou que o “incidente foi investigado”, mas “por não se ter presenciado nenhuma ofensa criminal, foi decidido não abrir uma investigação policial-militar”.
Outra fonte disse que muitos detentos estão em más condições físicas. Muitos ficaram feridos e suas condições pioraram devido às condições nas quais são mantidos presos e à falta de higiene em Sde Teiman. Os pacientes crônicos não têm acesso a medicamentos adequados e há diversos casos de ataques epilépticos entre os prisioneiros.
Além disso, há presos com problemas crônicos que não são levados para a unidade médica e são mantidos na prisão e tratados por enfermeiros e com parca medicação.
[Mais ainda: o campo de concentração de Sde Teiman não obedece nem mesmo as draconianas leis israelenses é o que descreve a carta do médico].
Segundo informa o Haaretz repercutindo a carta do médico, nenhuma das normas é cumprida, incluindo do direito a tratamento e equipamento de acordo com as condições médicas do detento, há o direito a condições de higiene e ao sono adequado e ainda a exercício físico por duas horas por dia.
Na carta, o médico alerta que muitos pacientes são devolvidos ao setor prisional logo após cirurgias, mesmo as que atuam em órgãos mais profundos “a exemplo de secções intestinais”.
“Isso termina em complicações e algumas vezes na morte dos pacientes”, acrescenta.
“Isto faz de todos nós – as equipes médicas, aqueles que estão encarregados da nossa população nos Ministérios da Saúde e da Defesa – cúmplices na violação das leis de Israel, e talvez o pior é conosco como médicos, na violação dos compromissos básicos com os pacientes, onde quer que estejam, como jurei quando me graduei 20 anos atrás”, declara o autor do libelo.
*A tradução é de Nathaniel Braia, assim como as inserções e observações entre colchetes