Cerca de 70 mil trabalhadores das ‘maquiadoras’ – as fábricas na fronteira com os EUA, que se dedicam a montar componentes importados, com salários de fome, para retornar aos EUA o produto final – de Matamoros, no estado de Tamaupilas, no México, estão em greve para exigir aumento salarial de 20% e pagamento de bônus de 32.000 pesos, luta que espocou em 12 de janeiro, se estendeu como rastilho a outras fábricas em paralisações selvagens, até o sindicato oficializar a greve na sexta-feira passada. A greve já começa a ter repercussões dentro dos EUA e até já paralisou algumas linhas de produção. Na greve, vem sendo enorme a participação das mulheres, que são uma porcentagem substancial da mão de obra das maquiadoras. A paralisação, iniciada na fábrica de autopeças Autoliv, agora atinge 45 empresas, especialmente do ramo elétrico e automotriz, em grande parte, múltis.
No último momento, quatro maquiadoras (Politech, CTS, Core e AFX) concordaram com o reajuste de 20% e o bônus de US$ 1.700. As empresas tentaram chantagear os trabalhadores para que recuassem, ameaçando fechar fábricas, remover máquinas e processar lideranças do movimento. Em muitas fábricas, os trabalhadores elegeram delegados.
O governo de López Obrador enviou o subsecretário do Trabalho, Alfredo Domingues Marrufo, que propôs um “adiamento de dez dias” para “novas negociações”, o que foi rechaçado nas assembleias. Uma fábrica anunciou que fecharia, deixando 1700 trabalhadores desempregados. Em uma dúzia de fábricas, gerentes tentaram impedir a adesão à greve, trancando os portões e mantendo detidos os operários.
Analistas apontam que uma semana de paralisação custou às empresas perda de US$ 100 milhões, a metade do que estava sendo pedido por um ano pelo aumento de salário mais o bônus – mas as corporações seguem intransigentes. Na segunda semana de paralisações, os trabalhadores marcharam até à fronteira, até a ponte que se dirige a Brownsville, no Texas, para chamar a atenção sobre suas reivindicações. Os manifestantes bradaram “venceremos, haja o que houver” e “trabalhadores unidos jamais serão vencidos”, além de “Acorda, gringo”.
O Jornal La Jornada, que considerou “a indústria de maquia … um avanço para a região da fronteira”, admitiu que atualmente “não passa de um território aonde campeia o abuso”. O diário acrescentou que as disposições recentemente promulgadas pelo novo governo (AMLO), que aponta a “fortalecer o desenvolvimento econômico e social” da região, encontrou pouco eco em um setor industrial “demasiado habituado a operar sem outra consideração que sua taxa de lucro”.
Mas a maquiadoras são, na essência, o mais genuíno fruto da anexação do México aos EUA, via Nafta, que levou o país a ter um dos mais baixos salários da América Latina. Para que as maquiadoras se instalassem, o governo mexicano teve de oferecer isenções ficais e outras benesses, reduzindo as verbas disponíveis para a saúde e educação. As maquiadoras compram, no mercado interno, menos de 10% dos seus insumos – principal razão para o apelido ter se consagrado -, e apesar do crescimento das exportações, a balança comercial é negativa, assim como as transações correntes.
Em 2017, déficit comercial de US$ 2,4 bi (exportações US$ 38,5 bi e importações US$ 40,9 Bi) e déficit nas transações correntes de US$ 5,0 bi. Seis em cada dez trabalhadores mexicanos não têm carteira assinada. A taxa de pobreza da população mexicana, que era de 52,4% em 1994, início do Nafta, evoluiu em apenas 0,1%, para 52,3%, dez anos depois, em 2014, contra uma diminuição, no mesmo período, de mais de 40% na América Latina. A agricultura também foi devastada, até o milho, base da alimentação, o desemprego grassou, milhões de mexicanos foram empurrados como refugiados econômicos para os EUA, onde são discriminados e perseguidos por racistas como Trump.