
Estudante brasileiro foi detido por agentes de imigração nos EUA, e colegas fazem manifestação. Marcelo Gomes foi abordado em carro que dirigia a caminho de treino de vôlei
A detenção de estudante brasileiro, de 18 anos, por agentes do ICE (Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas dos EUA), no último sábado (31), provocou onda de solidariedade em Milford, no Estado de Massachusetts.
Segundo Jamil Chade, do UOL, Marcelo Gomes, aluno da Milford High School, foi abordado a caminho do treino de vôlei e permanece detido em centro de imigração em Burlington, segundo a rede de TV CBS.
“Ele estava indo para o treino de vôlei e se despedindo da família. Ele está aqui há 13 anos, isso é tudo o que ele conhece. Milford e Massachusetts é tudo o que ele conhece”, afirmou a prima Ana Julia Araujo. “É de partir o coração. Marcelo é uma pessoa tão gentil, é a última pessoa com quem isso deveria acontecer, eu acho. Os irmãos dele são tão pequenos e estão fazendo perguntas como vão vê-lo de novo algum dia”.
CAÇADA AOS IMIGRANTES
A manifestação, no último domingo (1º), reuniu centenas de pessoas na Main Street, incluindo estudantes da turma de 2025, que marcharam com becas e capelos logo após a cerimônia de formatura. Gomes, que faz parte da banda da escola, estava escalado para tocar bateria na cerimônia.
“Marcelo era um bom garoto. Ele estava empolgado com o futuro, não fez absolutamente nada de errado. Ele estava indo inocentemente para um treino e foi alvo”, disse a namorada, Julianys Rentas. “Muitos estudantes estão vivendo com medo do ICE. Não há um padrão, então ninguém sabe quem será o próximo.”
Professores também participaram da mobilização. “Nossos alunos merecem se sentir seguros. E eles não se sentem. E prender alguns deles traumatiza todos”, disse a professora de inglês Cherie Peterson, que deu aula para Gomes. “Não consigo imaginar o quanto ele está assustado. Ele não sabe como lidar com esse sistema, eu mesma não saberia.”
APOIO DA GOVERNADORA E DOS LOCAIS
Motoristas que passavam pelo local demonstraram apoio buzinando durante o protesto. “Devastador isso estar acontecendo em nossa comunidade com crianças boas, que vão à escola e fazem a coisa certa”, afirmou Laurie Cunningham, mãe de um estudante.
“Fico muito grata por tantas pessoas terem aparecido por Marcelo”, disse Rentas à emissora WBZ-TV. “Me sinto muito grata, Deus é muito bom.” A governadora de Massachusetts, Maura Healey, divulgou nota em que cobra explicações do governo federal.
“Estou perturbada e indignada com os relatos de que um estudante da Milford High School foi preso pelo ICE a caminho do treino de vôlei ontem. Mais uma vez, autoridades locais e policiais ficaram no escuro, sem aviso prévio e sem respostas para suas perguntas.”
“Estou exigindo que o ICE forneça informações imediatas sobre porque ele foi preso, onde ele está e como seu devido processo está sendo protegido. Meu coração está com a comunidade de Milford em um dia que deveria ser de celebração. A administração Trump continua a espalhar medo em nossas comunidades e isso nos torna todos menos seguros.”
ALERTA EM ESCOLAS E AUTORIDADES
Segundo um estudante que estava no carro em que 4 alunos se dirigiam ao treino, eles foram abordados por 3 veículos sem identificação. Os agentes questionaram a documentação de todos e levaram apenas Gomes, que dirigia.
O jovem, que não quis se identificar, disse ser também indocumentado, mas foi poupado por ser menor de idade. Segundo ele, o grupo não cometeu nenhuma infração de trânsito.
O caso acendeu o alerta em escolas e autoridades locais. “Estamos todos consternados com essa notícia”, afirmou o superintendente Kevin McIntyre.
“As Escolas Públicas de Milford não participam de ações de imigração e apoiam todos os nossos alunos e famílias, incluindo os imigrantes. Eles são membros da comunidade, estudantes das nossas salas de aula, atletas que competem representando Milford, músicos, artistas, amigos e vizinhos.”
DIREITOS VIOLADOS
O chefe da polícia local, Robert Tusino, disse que só soube da prisão após o ocorrido. “Queremos um diálogo aberto com o governo federal sobre quem está sendo detido, porque está sendo detido. Não queremos pessoas sendo levadas embora apenas por estarem aqui ilegalmente”, afirmou.
“Esse aluno deveria estar em um treino de vôlei com os colegas”, disse Nick Molinari, presidente da Associação de Professores de Milford.
“Em vez disso, agentes do ICE o transformaram em alvo, num ato deliberado de crueldade, traumatizando sua família, amigos e colegas. Isso é imoral, desnecessário e deve ser amplamente condenado. Não vamos ficar calados enquanto os direitos e a humanidade dos nossos estudantes são violados.”
“PRESSÃO PSICOLÓGICA” PARA SE “AUTODEPORTAR”
Prisões arbitrárias e violações de direitos. Foi assim com Lucas dos Santos Amaral. Durante os 26 dias em que ficou preso nos Estados Unidos, várias perguntas sem respostas passaram pela cabeça do brasileiro, de 29 anos.
Seria deportado? Recomeçaria a vida no Rio de Janeiro? Ou voltaria para casa, no Estado de Massachusetts, na companhia da mulher grávida e da filha pequena?
No fim de fevereiro, Lucas, pintor de paredes e músico gospel, reencontrou finalmente a família no aeroporto de Boston, após passar por 3 prisões em 2 Estados diferentes, Massachusetts e Texas.
“Só caiu a ficha quando minha filha me abraçou forte no carro e disse: ‘papai, eu não te largo nunca mais’”, lembra o brasileiro.
Lucas havia sido preso no dia 27 de janeiro ao ser parado por policiais no caminho para o trabalho, apenas 7 dias após o presidente Donald Trump tomar posse e iniciar a caça a imigrantes nos EUA.
“Eles trabalham para forçar você a pedir deportação. Fazem de tudo para te quebrar psicologicamente e você falar ‘não quero mais, me manda embora’”, recorda o brasileiro sobre os dias na prisão.
Em 5 de maio, o governo Trump anunciou a oferta de mil dólares — cerca de R$ 5.688 —, e os custos da passagem para quem aceitasse deixar os EUA voluntariamente.
ALUNOS INTERNACIONAIS DE HARVARD
O governo Trump colocou a vida dos 7 mil estudantes internacionais da universidade em desordem, com alguns com medo de comparecer à formatura na semana, disse Maureen Martin, diretora de serviços de imigração de Harvard, em novo documento judicial na última quarta-feira (28).
Alguns estudantes estadunidenses estão reconsiderando a matrícula neste outono devido às ações do governo Trump, escreveu Maureen Martin na declaração sob juramento.
O corpo docente e a administração da Universidade de Harvard estão sendo “inundados com perguntas” de estudantes preocupados, e os alunos internacionais estão tão angustiados, que a saúde mental foi afetada, segundo ela.