Segundo a procuradora, Ricardo Barros pratica “desvio de poder” ao querer transferir a Hemobrás de Pernambuco para o Paraná, apenas para favorecer seu “reduto eleitoral”
O Ministério Público Federal em Pernambuco (MPF-PE) pediu à Justiça que determine o afastamento cautelar do ministro da Saúde, Ricardo Barros, sob a alegação de que ele está atuando para favorecer seu “reduto eleitoral” com a transferência de tecnologia da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) de Pernambuco para o Paraná.
Na ação civil pública, o MPF afirma que fica “clarividente o desvio de poder” de Barros, ao “assumir publicamente que possui interesse político em levar o “mercado de sangue” para o Estado do Paraná”.
A Hemobrás foi criada em 2004, com o objetivo de reduzir a dependência externa do país por hemoderivados, usados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para tratar pessoas com Hemofilia A, ao mesmo tempo, fomentar um pólo tecnológico na região Nordeste.
Segundo a procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes, o ministro tinha o propósito de retirar as instalações da Hemobrás de Pernambuco, transferindo a fabricação para seu o Paraná. A atuação do “Ministro de Estado visava redirecionar as atribuições institucionais da Hemobrás para o seu reduto eleitoral, em pública e notória violação aos princípios legais e constitucionais”, argumenta na ação civil pública, que completa, “o ministro busca esvaziar as atribuições institucionais da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia para atrair a seu estado, o Paraná, a produção e industrialização de hemoderivados essenciais ao Sistema Único de Saúde (SUS) e que, atualmente, são produzidos pela Hemobrás”.
Em julho, o Ministério da Saúde determinou a suspensão da PDP entre a Hemobrás e a Shire Farmacêutica Brasil, alegando problemas na transferência de tecnologia para a produção do “fator VIII recombinante”, medicamento essencial para portadores de hemofilia. As empresas atuariam juntas via Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) assinada em 2012, até o ano de 2022.
Paralelamente, o ministro articulava uma possível nova PDP entre a empresa pública Tecpar, ligada ao governo do Paraná, e a múlti suíça Octapharma. Embora ainda em análise pelo governo federal, Barros considerava a PDP no seu estado como a melhor alternativa.
A procuradora alegou que “diversos acontecimentos demonstram a deliberada atuação de agentes do Ministério da Saúde, inclusive do titular da pasta, o Sr. Ricardo Barros, com vistas a favorecer os interesses da empresa pública Tecpar e, especialmente, da empresa Octapharma. Dessa forma, constata-se sérios indícios de envolvimento dos agentes do Ministério da Saúde na deliberada prática do crime de advocacia administrativa (art. 321 do Código Penal), com o iter criminis já iniciado, razão pela qual foram encaminhadas cópias integrais dos autos à Procuradoria Geral da República para a respectiva apuração da responsabilização criminal, bem como na prática de atos de improbidade administrativa, cujas medidas judiciais também serão adotadas”.
Ela justifica que a ação visa a assegurar “em tempo hábil e com a observância dos contratos vigentes e a legislação pertinente”, a aquisição dos medicamentos, e que, uma vez que a comercialização de hemoderivados é proibida pela Constituição Federal, “é dever constitucional do Ministério da Saúde garantir o tratamento aos pacientes portadores de coagulopatias”.
As coagulopatias, como a hemofilia do tipo A, são doenças resultantes da deficiência de proteínas plasmáticas responsáveis pelo processo de coagulação que ajuda a estancar sangramentos. O tratamento faz a reposição da proteína do sangue por meio de medicamentos injetados na corrente sanguínea.
O MPF recomendou, em agosto, que não fossem nomeados, para cargos de gestão na Hemobrás ou do Ministério da Saúde, pessoas com vínculos diretos ou indiretos com empresas privadas interessadas na transferência de tecnologia da empresa pública. E reforçou que qualquer transferência da tecnologia deveria seguir a Lei de Licitações e Contratos ou legislação que regula a Parceria Público-Privada.