“Esta Comissão tem que examinar se a proposta é constitucional, justa e se serve à cidadania. No meu entendimento, ela está repleta de inconstitucionalidade”, afirmou o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), na audiência pública da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, com a presença do ministro da Economia, Paulo Guedes, ocorrida nesta quarta-feira (03).
“O Ministro fala a verdade, quando diz que busca uma solução final para a Previdência. A solução final que o Ministro apresenta é acabar com a Previdência”, denunciou Molon. O deputado usou o exemplo do avião para denunciar o sistema de capitalização. “V. Exa. quer trocar um Jumbo que está um pouco velhinho, que tem seus problemas, que precisa de consertos. Quer mandar esse avião para o ferro-velho e quer que cada um compre o seu aviãozinho. O sistema de capitalização é isso, ministro, é cada um por si e Deus por todos”, prosseguiu.
“V. Exa. está destruindo os pilares da Previdência Social brasileira, que se baseia na ideia da contribuição e da solidariedade. Assim é fácil resolver o problema da Previdência. V. Exa. está entregando a cada um a própria sorte ou o próprio azar. Fazer isso com quem ganha pouco é uma injustiça e uma crueldade sem tamanhos”, observou o parlamentar.
“Não é verdade que essa reforma mire nos privilegiados. Não são 83%, como foi dito aqui. Nos 20 anos, 91,17% da economia que V. Exa. promete fazer para o País, estão em cima do regime geral, do BPC e do abono, 91,17%. Isso é mirar nos privilegiados? Tirar o abono de quem ganha mais de um salário mínimo é mirar nos privilegiados?”, indagou Molon.
“V. Exa. tem coragem de vir a esta Casa e dizer que tirar o abono de quem ganha mais de um salário mínimo é mirar nos privilegiados? Como é possível fazer isso, Ministro? Esse sistema que V. Exa. quer que o Brasil adote está levando os idosos do Chile ao suicídio. Esse não é o sistema que nós queremos para o Brasil”, acrescentou.
“Nós concordamos que são necessários ajustes na Previdência. Se V. Exa. quer debater privilégios, vamos debatê-los. Mas V. Exa. não pode dizer que 91,17% miram nos privilégios. Não é verdade, Ministro, V. Exa. não pode comparar o regime geral com a Previdência do Rio de Janeiro. Está comparando banana com farinha. Está comparando banana com cimento”, denunciou.
Ele lembrou que a Previdência dos Estados é pública, “é um regime próprio, não tem nada a ver com o regime geral. V. Exa. sabe disso. Então, por favor, não venha a esta Casa dizer que, se não fizermos o que está propondo, a Previdência vai quebrar como no Rio de Janeiro. Não é verdade”.
“Uma servidora para quem faltariam 9 meses para se aposentar, pela regra de V. Exa., faltarão 11 anos. Isso é razoável? Um dos princípios da Constituição é a razoabilidade. É razoável pedir a uma pessoa, a quem faltam 9 meses, que trabalhe mais 11 anos? V. Exa. vai dizer que é, porque é o serviço público. Então, eu vou apresentar do regime geral. Uma pessoa para quem faltam 2 anos e meio para se aposentar, se a reforma que V. Exa. propõe passar, antes de faltarem 2 anos… essa pessoa vai precisar trabalhar, em vez de 3 anos, que é o que faltaria, 17 anos. Vai precisar trabalhar 17 anos”, denunciou.
“Por exemplo, eu gostaria que V. Exa. respondesse objetivamente qual é a premissa de reajuste do salário mínimo em que V. Exa. se baseia para fazer essas projeções? O salário mínimo vai voltar a ter inflação mais PIB? Vai continuar tendo isso ou só inflação? Diga perante esta Casa o que V. Exa. está propondo aos assalariados do País, a quem o Governo chama de privilegiados, esses que o Presidente da República defendia quando era candidato e falava que era desumano e cruel estabelecer a idade de 65 anos”.
“Era o chefe de V. Exa. que dizia isso, o Presidente da República. E agora se esconde para falar de reforma da Previdência, porque ele não defende a reforma que V. Exa. mandou para esta Casa. Nem ele defende essa reforma. O Presidente tem vergonha de falar dessa reforma. Ele foge desse tema nas redes sociais, mais que o diabo foge da cruz, porque ele tem vergonha dessa proposta. Essa proposta é cruel”, alertou Molon.
“Se V. Exa. não pretendesse fazer economia — essa história de que vai receber 400, e depois não recebe nada —, se o objetivo disso fosse beneficiar os idosos, V. Exa. não estava fazendo conta de economia com isso. E V. Exa. está mostrando quanto isso vai economizar. Se o Governo vai economizar com isso, é porque os pobres vão perder, Ministro”.
“Então, se V. Exa. quer fazer um debate sério sobre Previdência, vamos fazê-lo. Vamos falar de como considerar a idade na transição. Nós estamos dispostos a esse debate. Vamos falar de transição para os servidores públicos. Nós estamos dispostos a esse debate”.
“Vamos falar de como resolver o problema fiscal. V. Exa. conte com a Oposição para resolver o problema fiscal. Vamos taxar grandes fortunas. Mas mande primeiro isso, ministro. Não mande primeiro dos pobres e depois de quem ganha milhões por ano. Mande primeiro a proposta que vai taxar lucros e dividendos de quem também ganha bilhões. Mande a proposta de taxação de juros sobre capital próprio. Vamos começar por isso. Conte com a Oposição para isso”.
“Vamos revogar a MP do Trilhão. V. Exa. quer economizar 1 trilhão. Há pouquíssimo tempo atrás, no Governo Temer, foi aprovada a MP do Trilhão, que desonera as petroleiras estrangeiras em 20 anos em 1 trilhão. Vamos revogar isso e economizar, é uma conta simples. Vamos economizar 500 bilhões em 10 anos? Vamos revogar a MP. Mande para cá um projeto de lei revogando a MP, e nós vamos apoiar. Quer que nós o apresentemos? Nós vamos apresentar, a Oposição vai apresentar isso. O Governo vai apoiar? Vai taxar as petroleiras estrangeiras para proteger os miseráveis do Brasil ou vai continuar querendo tirar dos miseráveis para proteger as petroleiras estrangeiras?”, indagou Molon.
“Eu recebi, de uma empregada doméstica do Paraná, a seguinte mensagem: “Eu trabalho há 25 anos como doméstica; 19 anos registrada; fui informal; trabalhei na roça desde os 10 anos; tenho 49 anos. Gostaria de saber quando vou me aposentar, lembrando que o meu salário no Paraná é de 1.300 reais”.
“V. Exa. sabe o que eu tenho que responder para ela? Que na reforma de V. Exa. ela vai trabalhar mais e ganhar menos, porque é isso que a reforma de V. Exa. vai fazer com essa empregada doméstica. Eu pergunto a V. Exa.: “Ela é privilegiada, Ministro? É por ela que V. Exa. está querendo começar? É razoável isso? É razoável, por exemplo, fazer o que V. Exa. está fazendo com as mulheres, com as trabalhadoras rurais, com as professoras? Qual é a razão para V. Exa. igualar a idade de trabalhadoras rurais e trabalhadores rurais, homens e mulheres? Por que essa crueldade com as mulheres brasileiras?”, indagou o deputado.
“É inaceitável isso! Vamos debater uma reforma da Previdência, eu estou disposto a fazer com V. Exa. esse debate sobre transição para os servidores públicos e sobre uma transição para o Regime Geral. Eu acho que precisa de ajuste, eu quero dizer isso claramente para não ser daqueles que dizem que o avião não precisa de conserto. Este não é o meu caso”.
“Mas dizer para cada um se virar por conta própria e dizer que isso acaba com o déficit… É claro, acaba com o déficit porque acaba com a Previdência! Isso é uma solução genial! Mas não atende a população, Ministro. Vai deixar as pessoas morrerem de fome ou cometerem o suicídio, como é o caso do Chile. Portanto, nós não vamos aceitar”.
“Quantas pessoas vão deixar de se aposentar por idade com esse aumento de 15 para 20 anos? Como talvez seja difícil V. Exa. me apresentar uma projeção agora com a subida da idade, eu pergunto: “No ano passado, quantas pessoas, dos 79% que V. Exa. citou, deixariam de se aposentar se, em vez de 15 anos, fossem 20 anos?” Diga para nós”, cobrou o deputado.
“Essas pessoas ganham até dois salários, não é isso? Ganham pouco, ganham um salário. Então, diga para nós quantos por cento vão deixar de se aposentar. É essa a economia que V. Exa. quer fazer? Vamos fazer economia, Ministro, mas não em cima de quem mais precisa”, acrescentou.
“Por fim, retira-se o piso de um salário mínimo para pensão por morte. Eu não acredito que esta Comissão vai mandar esta PEC assim para a Comissão Especial! Eu duvido, Presidente Francischini. Não vão fazer isso com os Deputados desta Comissão: dizer que a Comissão Especial vai mudar aqui e vai dizer que isso é justo? Sinceramente, eu não acredito”, concluiu Molon.