
Em sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, escreveu que o deputado golpista está “ofendendo a própria dignidade do Parlamento, ao tratá-lo como covil de réus foragidos da Justiça”
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, tomou novas medidas contra o deputado golpista Daniel Silveira (União-RJ) após o parlamentar usar a Câmara dos Deputados como esconderijo e novamente se recusar a atender uma ordem judicial.
O deputado recusa voltar a colocar a tornozeleira eletrônica, como foi determinado pelo ministro na sexta-feira (25).
O ministro Alexandre de Mores decidiu na noite desta quarta-feira (30) estabelecer multa diária de R$ 15 mil por desobediência e recusar colocar a tornozeleira eletrônica. Moraes determinou ainda o bloqueio imediato de todas as suas contas bancárias.
Entretanto, após as novas medidas de Moraes, o deputado bolsonarista amaciou o discurso admitindo colocar a tornozeleira. “A questão é: quando ele faz o sequestro de bens, tenta bloquear a conta, [estabelece multa de] R$ 15 mil por dia…se vai atingir a minha família, eu não vou mais me submeter a isso”, disse.
Moraes enviou ainda um ofício ao presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), cobrando medidas necessárias para que as multas sejam descontadas diretamente do salário de Daniel Silveira, de R$ 33,7 mil.
O ministro Alexandre de Moraes, na sua decisão, propõe que o presidente da Câmara escolha dia, hora e local para que a tornozeleira seja instalada em Daniel Silveira.
“Estranha e esdrúxula situação, onde o réu utiliza-se da Câmara dos Deputados para esconder-se da polícia e da Justiça, ofendendo a própria dignidade do Parlamento, ao tratá-lo como covil de réus foragidos da Justiça”, escreveu Moraes em sua decisão.
“Não só estranha e esdrúxula situação, mas também de duvidosa inteligência a opção do réu, pois o mesmo terminou por cercear sua liberdade aos limites arquitetônicos da Câmara dos Deputados, situação muito mais drástica do que àquela prevista em decisão judicial”, disse o ministro.
Além disso, o ministro do STF abriu um novo inquérito para apurar a desobediência à sua decisão judicial e pediu ao presidente do STF, Luiz Fux, a convocação para esta sexta-feira (1º) de sessão plenária virtual extraordinária para análise colegiada de sua decisão.
À tarde, Daniel Silveira se escondeu para não ser encontrado por policiais federais e agentes da Polícia Penal que foram à Câmara para fazer cumprir a ordem de colocar a tornozeleira no parlamentar. O escárnio de Silveira com a Justiça chegou ao ponto dele fugir e mandar entregar aos policiais um documento dizendo que ele não cumpriria a ordem do ministro do STF. Os policiais saíram do local e foram relatar a Moraes sobre a recusa do parlamentar em acatar a decisão.
O presidente da Câmara defendeu a “inviolabilidade” da Casa, mas criticou o uso midiático das dependências do local pelo deputado Daniel Silveira.
“Ideal que o STF analisasse logo os pedidos do deputado Daniel Silveira e que a Justiça siga a partir desta decisão”, disse Lira em nota.
Na opinião do vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PSD-AM), a Câmara não pode obrigar Daniel Silveira a sair do plenário nem a usar tornozeleira eletrônica. Mas defendeu que Silveira cumpra a decisão judicial. “Por mais questionável que seja, a decisão judicial deve ser cumprida e depois contestada judicialmente, se for o caso”, disse.
Segundo Marcelo Ramos, não há previsão de votação da medida cautelar pelos deputados, como propôs o deputado Daniel Silveira. “Não nos cabe adentrar no conflito entre Daniel Silveira e o Poder Judiciário. Só resta lamentar que, num momento em que o País precisa estar discutindo inflação, fome e desemprego, estejamos gastando energia com esse assunto”, disse.
Os líderes de várias bancadas da Câmara defenderam o cumprimento da decisão do Supremo e avaliam que não cabe ao Legislativo neste momento questioná-la ou apreciá-la em uma votação — como se deu após a prisão do próprio Silveira.
A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) Cobrou na tribuna da Câmara que o plenário vote imediatamente a decisão do Conselho de Ética que indicou o afastamento de Daniel Silveira. “A decisão do Conselho dorme em berço esplêndido, enquanto o deputado segue desafiando a Justiça e usando o plenário da Câmara como seu esconderijo pra fugir da Justiça”, afirmou a deputada.

ATO
Parlamentares do PT, do PSOL e da Rede realizaram um ato na tribuna com placas da Rua Marielle Franco, em protesto contra Daniel Silveira. Em 2108, quando era candidato a deputado, Silveira ficou conhecido por quebrar uma placa semelhante, colocada no centro do Rio de Janeiro para homenagear a vereadora assassinada.
A líder do PSOL, deputada Sâmia Bomfim (SP), afirmou que a placa é um símbolo de luta por direitos humanos e incomoda parlamentares como Silveira.
Ela defendeu que o plenário da Casa vote o pedido de suspensão de seis meses do mandato, que já foi aprovado pelo Conselho de Ética. “Se tem aqui uma meia dúzia de deputados que vem à tribuna defendê-lo, eu duvido que o conjunto dos deputados vai colocar sua digital nessa história vergonhosa”, disse.
Silveira foi defendido por aliados de Bolsonaro (PL), que qualificaram a ordem do ministro do Supremo, na visão deles, de “afronta à democracia”.
O filho de Bolsonaro, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), foi à Câmara e disse que fazia um apelo a Moraes para que voltasse atrás em sua ordem.
“Minha fala aqui hoje é de apelo em especial ao ministro Alexandre Moraes, que possa tocar nele, o seu coração, o bom senso, o senso de justiça. Não é possível que um parlamentar, que, usando suas prerrogativas, que expresse sua opinião, esteja passando pelo que ele está passando, sendo tratado um marginal, sendo tratado como um sequestrador, um assaltante, um estuprador”, afirmou.
O presidente do STF, Luiz Fux, decidiu marcar para 20 de abril o julgamento da ação penal contra Silveira. O advogado de Daniel Silveira, Paulo Faria, discordou e pediu ao Supremo que retire da pauta o julgamento do deputado. Segundo ele, há recursos que devem ser julgados à frente, sob risco de o processo ser anulado.
AFRONTA
Silveira, que é réu no STF por estimular atos antidemocráticos, ameaçar instituições e ministros da Corte, passou a noite no seu gabinete, onde se instalou na noite desta terça-feira (29). A também bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) levou água e travesseiro para ele. Um colchão também foi levado para o local.
A instalação do equipamento de vigilância foi determinada no último sábado (26) pelo ministro Alexandre de Moraes. O magistrado atendeu a um pedido da Procuradoria-Geral da República e determinou a aplicação de novas medidas restritivas ao deputado, como a que ele voltasse a usar tornozeleira eletrônica e a proibição de participar de eventos públicos.
O parlamentar chegou a ser preso, em fevereiro de 2021, por divulgar um vídeo com ameaças a ministros do Supremo, mas foi liberado em novembro do ano passado com a condição de não se comunicar com outros investigados e ficar fora das redes sociais.
Porém, o bolsonarista resolveu desafiar as determinações da Justiça e continuou participando de eventos públicos para ameaçar a democracia, as instituições e ministros do STF.
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