O ministro, também alvo do plano de assassinato, aponta a articulação estruturada dos chamados “kids pretos”, da trama golpista coordenada por Jair Bolsonaro
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, votou na manhã desta terça-feira (18), pela condenação dos integrantes do chamado “núcleo militar”, conhecido como “kids pretos”, da trama golpista. Pela denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) trata-se do chamado “núcleo 3” da tentativa de golpe de Estado.
Esse grupo tentou operacionalizar a trama para assassinar o presidente legitimamente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin e o próprio ministro Alexandre de Moraes. Segundo a PGR, o grupo planejou as “ações mais severas e violentas” da organização criminosa.
Eles são apontados como operadores-chave na engrenagem que alimentou e orientou a tentativa de golpe de Estado, após as eleições de 2022.
Segundo o voto, Moraes descreve o grupo, como hierarquizado, composto por militares da ativa e da reserva, que atuou na disseminação de orientações operacionais, estruturais de ações para desestabilizar o processo democrático e estimular a quebra da ordem constitucional.
Todo esse movimento, com a ajuda dos outros núcleos denunciados pela PGR, culminou nos atos de 8 de janeiro de 2023.
O ministro Alexandre de Moraes defendeu absolver o general Estevam Cals Theóphilo e também votou para que outros dois militares sejam condenados por apenas dois crimes.
“Em que pese fortes indícios da participação do réu Estevam Cals Theophilo Gaspar, entendo não ser possível condená-lo com base em duas provas diretamente produzidas pelo colaborador premiado”, observou o ministro.
Moraes disse que não ficou dúvida de que esses elementos foram recrutados pelo grupo central, o liderado por Bolsonaro, para exercer pressão e operar atos violentos.
“Não há, então, nenhuma dúvida, a instrução processual demonstrou que o núcleo crucial cooptou esses militares próximos ao colaborador Mauro Cid e forças especiais com o objetivo de apoio, execução ao intento golpista e ruptura constitucional. Não há nenhuma dúvida, as provas são fartas”, afirmou.
Sobre o plano “Punhal Verde”, para assassinar Lula, Alckmin e o próprio ministro, Moraes assinalou que o plano só não foi avante por circunstâncias alheias à vontade dos “kids pretos”.
“O plano previa a farta munição perfurante de fuzil 762, 556, bombas, e fala nos possíveis alvos. A PF analisou as provas e está comprovado que houve esse planejamento e o ato executório. Só não se consumou por circunstâncias alheias à vontade. Não conseguiram a adesão do Comandante do Exército”, escreveu Moraes.
O plano dos golpistas previa assassinar Lula por meio de envenenamento.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, apontou em sua denúncia que o plano “Punhal Verde” foi impresso dentro do Palácio do Planalto. “As investigações escancaram a disposição homicida e brutal da organização criminosa, que para isso se articulou e se lançou a providências executórias devidamente armadas. Os denunciados aderiram aos propósitos ilícitos da organização criminosa e contribuíram para os eventos penalmente relevantes em apreço”, assinalou.
Esse grupo também exerceu pressão – sem êxito – sobre os comandantes militares para que estes aderissem ao golpe, relatou Moraes.
PAPEL DO NÚCLEO
O ministro detalha que os “kids pretos” formavam braço de apoio logístico e estratégico da trama, mantendo contato com civis e comandando movimentos de base por meio de canais fechados de comunicação.
As investigações da PF (Polícia Federal) revelaram que o grupo produziu documentos, manuais e diretrizes que orientavam desde o acirramento de tensões até justificativas jurídicas para a decretação, por parte do então presidente da República, de estado de sítio.
Moraes destacou que os acusados buscavam conferir aparência de legalidade para ações sabidamente inconstitucionais, recurso típico de tentativas contemporâneas de ruptura institucional.
RESPONSABILIDADES
O voto do ministro reforça que a participação do núcleo foi essencial para dar capilaridade e credibilidade ao movimento golpista, na medida em que o envolvimento de oficiais — ainda que sem respaldo da cúpula das instituições militares — servia para alimentar a narrativa de que havia “base técnica” para as ações.
Moraes defendeu que cada réu deve responder criminalmente pela parcela de responsabilidade que assumiu no planejamento e na execução do conjunto de atos que buscavam impedir a posse do presidente eleito e manter no poder o então chefe do Executivo, jair Bolsonaro.
PRÓXIMOS PASSOS
O julgamento, ainda em andamento, segue para os demais ministros da Corte proferirem seus votos.
A tendência, segundo interlocutores do Supremo, é de que a maioria acompanhe o voto de Moraes, em consonância com decisões anteriores sobre núcleos civil e operacional da mesma trama.
As penas sugeridas incluem crimes como associação criminosa armada, abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado, cujas condenações já vêm sendo reafirmadas em outros julgamentos vinculados aos ataques de 8 de janeiro.
CONTEXTO DA INVESTIGAÇÃO
O núcleo é apontado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) como uma das engrenagens mais estratégicas do planejamento golpista.
Relatórios da PF indicam que os “kids pretos” atuavam como ponte entre grupos radicalizados e figuras políticas alinhadas ao discurso golpista, e alimentavam análises, documentos e articulações orientadas à subversão do resultado das urnas.
As investigações também revelaram que parte dos documentos elaborados pelo grupo foram usados para subsidiar reuniões e pressões sobre autoridades militares à época, com o objetivo de fomentar adesões internas ao movimento golpista.
São réus na AP 2696:
- Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército;
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, general da reserva;
- Fabrício Moreira de Bastos, coronel do Exército;
- Hélio Ferreira Lima, tenente-coronel do Exército;
- Márcio Nunes de Resende Jr., coronel do Exército;
- Rafael Martins de Oliveira, tenente-coronel do Exército;
- Rodrigo Bezerra de Azevedo, tenente-coronel do Exército;
- Ronald Ferreira de Araújo Jr., tenente-coronel do Exército;
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, tenente-coronel do Exército; e
- Wladimir Matos Soares, agente da Polícia Federal.











