Em entrevista à Folha de S. Paulo, o novo ministro de Minas e Energia, Moreira Franco – que subiu ao cargo após a reforma ministerial de Temer na semana passada, ainda investigado pela operação Lava-Jato – declarou que se a Eletrobrás não for privatizada, “o apagão é inevitável”.
Para Moreira Franco, “não podemos cometer o erro de fazer da ideologia uma ferramenta para punir as pessoas”. Neste caso, punir as pessoas seria entregar à iniciativa privada uma empresa que é responsável por um terço da produção de energia do país. A argumentação do ministro é de que “a ideologia para problemas que a aritmética resolve é um desastre” – ainda que nenhuma aritmética aponte para a privatização como solução.
Para se ter uma idéia, apenas Noruega, Canadá, Venezuela, Suécia e Brasil têm a hidroeletricidade como base de sua energia elétrica, e “nenhum desses países têm essa estrutura em mãos privadas. (…) O Brasil, se vender a Eletrobrás, passará a ser o único do grupo que abre mão do controle do estado, apesar dessa singularidade e da externalidade essencial da água”, aponta o engenheiro Roberto Pereira D’Araujo, diretor do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético (Ilumina).
O ministro Moreira Franco, no entanto, se apresenta otimista em relação à aprovação do projeto de privatização no Congresso, ainda que tenha apenas dois meses para fazê-lo. Isso porque, como denunciou o deputado Alessandro Molon à época que a comissão foi instalada, a base do governo atropelou o Regimento Interno da Casa para acelerar o processo de entrega da Eletrobrás ao capital internacional.
Consciente de que as eleições se aproximam e as privatizações são mal-vistas pela sociedade, o Ministro tem pressa. Durante a entrevista, ele citou como exemplos de experiências bem sucedidas as privatizações da Vale (que resultou, em último caso, no desastre de Mariana), da Embraer (que corre o risco de ser completamente abocanhada pela Boeing e deixar de produzir aviões) e, como se não bastasse, a da telefonia (cuja tarifa é, hoje, uma das mais caras do mundo).
Para o vice-presidente da FNU, Nailor Guimarães Gato, a fala de Moreira Franco se trata de chantagem e usa um raciocínio invertido. “É o inverso do que ele afirma. É com a privatização que você vai ter problemas, inclusive aumento da tarifa para a população”, pontua. “Estados Unidos, Alemanha, Canadá, países centrais, não privatizam o setor elétrico por ser estratégico.”
Gato lembra do recente apagão ocorrido no dia 21 de março, sentido em quase todo o Brasil, causado por uma linha de transmissão operada pela empresa chinesa State Grid, no sistema Belo Monte/Furnas. A falha decorreu de testes realizados pela operadora em pleno horário comercial, segundo a FNU. “O apagão de Belo Monte foi na linha que está na mão da State Grid. Para empresas estatais, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) só libera os testes em comissionamento aos finais de semana e durante a madrugada. Mas, para empresas privadas, libera em qualquer horário, inclusive os de maior consumo”, diz Gato. “Foi o que aconteceu com Belo Monte.”
Em Goiás, após a privatização da Companhia Energética de Goiás (Celg), a população sofre com constantes cortes de energia. “A cidade de Catalão ficou quase uma semana sem energia elétrica”, diz Gato. A empresa foi vendida há um ano para a italiana Enel.
Por isso a manutenção do setor elétrico sob controle do Estado “não é uma questão ideológica, mas lógica”, defendeu o dirigente da FNU.