Sem vagas no IML, corpos foram colocados em caminhão frigorifico
Entre domingo (26) e segunda (27), 55 detentos foram mortos em quatro presídios da cidade de Manaus, capital do Amazonas. De acordo com o governo estadual, os crimes foram cometidos devido a uma disputa entre integrantes de facção criminosa Família do Norte (FDN).
Este é o segundo massacre ocorrido nos presídios do estado. Em 2017, 56 presos foram mortos durante uma rebelião. Eles seriam ligados à facção criminosa paulista Primeiro Comando da Capital (PCC) e foram mortos pelos membros da FDN, que passaram a comandar o tráfico de drogas no norte do país.
A Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) informou que a maioria das mortes tiveram indício de asfixia. Elas ocorreram nas seguintes unidades: Complexo Penal Anísio Jobim (Compaj), 19 mortos; Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat), 25 mortos; Unidade Prisional do Puraquequara (UPP), 6 mortos e Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM 1), 5 mortos.
Os primeiros 15 assassinatos ocorreram no Compaj ainda no domingo. O governo local afirma que elas estão relacionadas a uma disputa entre os presos e aconteceram na presença dos parentes das vítimas no Compaj. “Foi briga entre grupos internos. E saíram se matando. Nada de rebelião. Foi tudo nas celas. Não foi nem no corredor”, afirmou Louismar Bonates, secretário de Estado de Segurança Pública.
Em nota, a Seap havia atribuído as mortes no domingo a uma briga de facções dos pavilhões 3 e 5. Após o acionamento do Batalhão de Choque da Polícia Militar, a situação estava sob controle, segundo a pasta. Nenhuma fuga foi registrada e nenhum agente penitenciário foi ferido no domingo.
Por falta de espaço, 40 dos 55 corpos de detentos mortos no massacre ocorrido em unidades prisionais do Amazonas foram colocados em um caminhão-frigorífico alugado pelo governo do estado.
Segundo a presidente do Sindicato dos Peritos no Amazonas, Viviane Pinto, não há peritos suficientes para o trabalho de identificação dos corpos. “Devido ao número reduzido de peritos, esse trabalho é mais longo e demorado. São quatros peritos legistas na escala e um odonto-legista para toda essa demanda. Atualmente, são 20 gavetas no IML, que já estão ocupadas. Os demais corpos estão na câmara frigorífica que foi contratada”, disse ao portal G1.
Prefeito de Manaus cobra providências
O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), considerou que o massacre nas unidades prisionais do Amazonas chama a atenção para a falta de controle nas unidades prisionais que deveriam ser locais para isolar criminosos e dar segurança para a sociedade.
“É preciso fibra. Tem de ter resistência. É essencial que a normalidade retorne aos lares amazonenses”, afirmou o prefeito de Manaus.
O prefeito ressaltou que o mais correto seria uma intervenção sobre todos os presídios. Os quatro presídios onde ocorreram os assassinatos são privatizados.
“Nos presídios, as facções reinam absolutas. A situação é tão esdrúxula, que os chefões se sentem mais seguros presos do que nas ruas. É um novo e deformado tipo de ser humano, que prefere a prisão à liberdade. Que fazem dos presídios uma espécie de ‘escritório’. Parecem ‘executivos’ dando ordens aos comandados do submundo que subjuga o povo de Manaus, sob os olhares inexperientes e atônitos dos que deveriam comandar e organizar o Amazonas”, avaliou Arthur.
Administração privatizada
Todos os presídios são administrados pela Umannizzare Gestão Prisional e Serviços Ltda., que recebeu R$ 836 milhões nos últimos quatro anos, de acordo com os contratos disponibilizados no Portal Transparência do estado.
Em 2017, o Ministério Público do Amazonas concluiu uma investigação sobre a empresa e divulgou que o valor cobrado por cada preso nos contratos da Umanizzare com o estado é de R$ 4,7 mil mensais.
Entretanto, o alto valor repassado pelo estado à empresa privada não é refletido nas condições dos presídios.
A grave situação já havia sido denunciada peloConselho Nacional de Justiça (CNJ). Nas inspeções realizadas em abril, foi recomendado como “imprescindível” que o Estado redimensionasse o efetivo previsto no contrato com a empresa que gere os presídios, a Umanizzare.
O aumento deveria se aplicar a todos os profissionais, não apenas aos agentes de socialização, mas também a médicos, enfermeiros e advogados. O recomendado era no mínimo um agente para cada cinco detentos. As quatro unidades somavam ao todo 4.386 presos, sendo 1.258 no Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM I), 1.168 na Unidade Prisional do Puraquequara (UPP), 1.112 no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) e 848 no Instituto Penal Antônio Trindade (IPAT).
O conselho classificou como alto o índice de apreensão de aparelhos celulares e facas artesanais em três unidades: UPP, CDPM e Compaj. Não há números detalhados nos relatórios.
Em todas as unidades da capital amazonense, o CNJ constatou uma situação “grave” de ausência de espaço para visitas familiares. Crianças e demais visitantes são levados ao pavilhão.
Presos transferidos
Após o massacre, o governo federal anunciou o envio de uma equipe da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária ao Amazonas. A expectativa do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) é que os agentes comecem a chegar nesta terça-feira.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmou que disponibilizaria vagas em presídios federais para a transferência dos mandantes do massacre para presídios federais. Na manhã desta terça-feira, o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), disse que nove detentos seriam enviados para esses locais.