Na véspera de Natal, terça-feira (24), Jair Bolsonaro editou uma Medida Provisória que altera as regras para a escolha de reitores e pró-reitores das universidades e institutos federais de ensino e do Colégio Pedro II. A MP 914 foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União (DOU).
A MP estabelece mudanças significativas na escolha dos reitores das instituições federais. Impedindo, por exemplo, a reeleição de um reitor para um novo mandato.
Apesar de manter a escolha do reitor entre a lista tríplice apresentada pela universidade, a MP esvazia o Conselho Universitário (Consuni), órgão deliberativo composto por professores, técnicos e alunos, que era encarregado de entregar a lista à Presidência da República.
O texto estabelece pesos diferentes de voto para professores, funcionários e alunos na eleição: peso de 70% para os votos dos professores, 15% para estudantes e 15% para servidores. Muitas universidades optaram nos últimos anos pela votação paritária e informal na comunidade acadêmica para constituir a lista tríplice. Em seguida, o resultado era chancelado pelo Conselho Universitário e enviado ao presidente.
A medida editada mantém algumas regras, como a que prevê que o presidente da República não tem obrigação de escolher o candidato mais votado da lista tríplice que as universidades entregam para o governo. Mas permite que o Ministério da Educação nomeie reitores pró-tempore “na vacância simultânea dos cargos de reitor e vice-reitor; e na impossibilidade de homologação do resultado da votação em razão de irregularidades verificadas no processo de consulta”.
A seleção de vice-reitor e de diretores de unidades das instituições também passa por mudanças. Agora, todos esses cargos serão escolhidos diretamente pelos reitores — na UFMG, por exemplo, hoje é a comunidade acadêmica que escolhe os nomes, por votação.
MEDIDA ANTIDEMOCRÁTICA
Professores e reitores dizem que a comunidade universitária não foi consultada. O presidente da Associação dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino (ANDIFES), o reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Carlos Salles da Silva, disse que os reitores ficaram “surpresos que uma decisão de tal ordem, que afeta a escolha dos nossos dirigentes, seja apresentada através de uma medida provisória e não de um projeto de lei”. Cada instituição, acrescenta Salles, “deve exercer sua autonomia, inclusive na formulação de critérios acadêmicos e democráticos para a escolha mais legítima de seus dirigentes”.
Para Guilherme Bianco, diretor de universidades públicas da União Nacional dos Estudantes (UNE), “a MP 914 escancara a perseguição política e ideológica de Bolsonaro e seu ministro Weintraub contra as universidades públicas. No apagar das luzes de 2019, sem a menor justificativa para urgência, essa Medida Provisória é lançada, atacando a autonomia das universidades e interferindo no processo democrático”.
“Bolsonaro já vinha desrespeitando a escolha interna pelos reitores, vide UFC, UFTM, UFGD, UFVJM, UFRB etc, agora formalizou e endureceu essa postura totalitária. É uma clara tentativa de tentar ganhar no grito a hegemonia de pensamento e ação das administrações e da cátedra. 2020 já começa com a necessidade dos setores educacionais se manterem em alerta, defendendo a universidade pública, a autonomia, a democracia e o conhecimento”, destacou Guilherme.
A escolha do reitor é feita em etapas. Primeiro, a comunidade acadêmica elege a lista tríplice de candidatos. Depois, o presidente escolhe um entre os três nomes apresentado, o que foi mantido na MP. Desde 2003, a tradição era indicar o mais votado, mas Bolsonaro rompeu com a prática este ano, como nos casos da Universidade Federal do Ceará e da Universidade Federal do Triângulo Mineiro.
Em agosto, ele nomeou o terceiro colocado para reitor da Universidade Federal do Ceará (UFC). Na votação, o professor de Direito e advogado criminalista Cândido Albuquerque, de 62 anos, obteve 610 votos (4,61% do total de votantes), enquanto o primeiro colocado obteve 7.772 votos.
No mesmo mês, Bolsonaro também nomeou o terceiro nome da lista tríplice da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), o professor Janir Alves Soares. Antes, o presidente já havia nomeado o segundo e terceiro colocados, respectivamente, para as federais do Triângulo Mineiro (UFTM) e do Recôncavo da Bahia (UFRB).