O Ministério Público Eleitoral (MPE) defendeu que Jair Bolsonaro seja tornado inelegível pelos próximos oito anos por ter cometido abuso de poder político ao realizar, em julho de 2022, uma reunião com embaixadores estrangeiros para mentir sobre o processo eleitoral brasileiro.
A apresentação feita por Bolsonaro para os diplomatas foi transmitida pelo governo na TV Brasil e nas redes sociais.
O MPE afirmou que isso configura abuso de poder político, uma vez que Jair Bolsonaro se utilizou do Palácio da Alvorada, residência do presidente da República, e de meios de comunicação do governo para fazer sua campanha.
A pena para abuso de poder político é de oito anos de inelegibilidade.
Tanto a argumentação do MPE quanto as alegações finais de Jair Bolsonaro estão em segredo de justiça.
Agora que o Ministério Público Eleitoral se manifestou, através do vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, o caso já pode ser julgado no TSE.
A expectativa é que o corregedor-geral eleitoral e relator do caso, ministro Benedito Gonçalves, possa apresentar seu voto a partir da semana que vem ou até o começo de maio.
Caberá, então, ao presidente do TSE, Alexandre de Moraes, incluir o julgamento na pauta.
A avaliação de interlocutores é que a maioria dos ministros siga a posição de Gonçalves, tornando Jair Bolsonaro inelegível pelos próximos oito anos.
Em dezembro de 2022 o TSE decidiu, por unanimidade, manter a ação contra Bolsonaro e avalizou a decisão do ministro Benedito Gonçalves, que negou duas preliminares propostas pela chapa de Bolsonaro visando extinguir o processo antes mesmo da análise do mérito da questão.
Bolsonaro foi condenado a pagar R$ 20 mil de multa por “propaganda eleitoral antecipada” no caso dessa reunião com embaixadores.
Na ocasião daquele julgamento, o procurador eleitoral afirmou que o então presidente da República ignorava os desmentidos de órgãos com credibilidade, como o próprio TSE, com o “propósito de subtrair da audiência a revelação oficial dos acontecimentos”.
“A percepção que resta é a de que as assertivas proferidas se voltam para animar parcela do eleitorado, visando a pôr em dúvida eventual resultado positivo do candidato opoente que é mencionado no discurso, insuflando a impressão da existência de uma congeminação espúria de energias para favorecê-lo. Claro está também o propósito de atrair a adesão de alguns ao candidato, que se retrata como fustigado pelo sistema vigente”, escreveu Gonet.
A ministra Maria Cláudia Bucchianeri, que foi relatora da ação, afirmou que os ataques realizados por Bolsonaro no encontro com embaixadores colocaram o “jogo democrático” em risco e extrapolaram a “liberdade discursiva”.
“A deslegitimação do sistema, a partir da construção de fatos falsos, forjados para conferirem estímulos artificiais de endosso a opiniões pessoais, é comportamento que já não se insere no legítimo direito à opinião, dúvida, crítica e expressão, descambando para a manipulação desinformativa”, continuou.
Entre as provas utilizadas contra Bolsonaro no processo por abuso de poder político está a minuta de um decreto presidencial golpista que foi encontrada na casa do ex-ministro da justiça, Anderson Torres.
Aliado de primeira hora de Bolsonaro, Torres guardou o documento que visava anular o resultado das eleições presidenciais dentro de uma pasta do governo federal e em um armário, mas falou à Polícia Federal que era algo “totalmente descartável”.
DISCURSO
Durante o encontro com os embaixadores, Jair Bolsonaro falou mentiras e disseminou diversas notícias falsas sobre a confiabilidade do sistema de votação do país. Ele atacou o sistema eleitoral e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do TSE.
Usou um Power Point para atacar as urnas eletrônicas.
A reunião estava com quórum esvaziado, pois os maiores parceiros comerciais do Brasil — China, Estados Unidos, União Europeia e Argentina não tinham diplomatas presentes na reunião. As embaixadas da China e da Argentina sequer foram convidadas para o encontro. Já as dos EUA e a da UE enviaram encarregados de negócios.
Bolsonaro voltou a falar sobre o inquérito aberto pela Polícia Federal em 2018, após ser acionada pelo TSE, após a suposta invasão de um hacker ao sistema e o acesso a documentos sigilosos da Corte.
As investigações da PF e do Ministério Público Federal para a apuração do caso apontaram que as urnas eletrônicas não foram comprometidas. Desde o início do voto eletrônico no Brasil, em 1996, nenhum caso de fraude foi identificado.
“Quero me basear exclusivamente no inquérito da PF que foi aberto após o segundo turno das eleições de 2018, onde um hacker falou que tinha havido fraude por ocasião das eleições. Falou que ele e o grupo dele tinham invadido o TSE”, afirmou Bolsonaro. “Tudo começa na denúncia onde o hacker diz claramente que ele teve acesso a tudo no TSE. Disse que obteve acesso aos milhares de códigos-fontes, que teve acesso à senha de um ministro do TSE, bem como de outras autoridades. Várias senhas ele conseguiu.”
Ele contou que os hackers ficaram por oito meses dentro dos computadores. “Com código-fonte, senhas — muito à vontade dentro do TSE. E (a Polícia Federal) diz, ao longo do inquérito, que eles poderiam alterar nomes de candidatos, tirar voto de um e mandar para o outro. O invasor teve acesso a toda a documentação do TSE, toda base de dados por oito meses. É uma coisa que, com todo respeito, eu sou o presidente do Brasil e fico envergonhado de falar isso daí”, mentiu aos embaixadores, perplexos com fato de um presidente atacar os sistema eleitoral do próprio país. Sistema eleitoral que o elegeu em 2018.
Bolsonaro repetiu os ataques aos ministros do TSE e do Supremo, afirmando que Luís Roberto Barroso e Edson Fachin “começaram a andar pelo mundo atacando-o” e que o atual presidente da Corte eleitoral foi o responsável por “soltar Lula”.
“Quando se fala em eleições, vem à nossa cabeça transparência. E o senhor Barroso e o senhor Edson Fachin começaram a andar pelo mundo me criticando, como se eu estivesse preparando um golpe. É exatamente o contrário o que está acontecendo”, desferiu.