O novo decreto de armas de Bolsonaro “amplia o risco de transferência de arsenais” para a milícia e atropela o Estatuto do Desarmamento, avalia o Ministério Público Federal (MPF) em nota técnica.
Para a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), que compõe o MPF, o mais recente decreto de Bolsonaro “ao invés de reparar os elementos que suscitaram os questionamentos anteriores, ampliou o cenário de agressão ao Estatuto do Desarmamento e de enfraquecimento da segurança pública”.
O decreto 10.030, de 30 de setembro, facilita o acesso a armas tanto para civis quanto para militares, uma vez que dispensa a apresentação de documentos antes exigidos.
Membros das Forças Armadas e das polícias agora estão “dispensados de comprovar que não estão sendo investigados em inquérito policial ou processados criminalmente, tanto para a aquisição de armas de fogo de uso permitido, como para armas de fogo de uso restrito”, tanto para requerer quanto para renovar o Certificado de Registro de Armas de Fogo.
“A automática liberação da aquisição de armas de fogo – de uso permitido ou de uso restrito – por todo e qualquer membro das Forças Armadas ou da polícia, sem qualquer aferição da existência de antecedentes criminais, é medida com potencial de ensejar a transferência de armamentos para esses segmentos criminosos”, afirma o MPF.
“A automática dispensa de observância de um requisito legal é suficiente para ampliar o risco de transferência de arsenais para a criminalidade, notadamente em cidades como o Rio de Janeiro, na qual há territórios controlados por milícias”, continua.
O risco dessas armas caírem nas mãos das milícias aumenta quando se observa que a lei permite que policiais “sigam carreira enquanto são investigados em inquéritos policiais ou respondam a processos criminais”.
“Existem policiais e militares investigados e processados em razão de envolvimento com organizações criminosas e milícias”.
O Estatuto do Desarmamento afirma que a aquisição de armas de uso restrito deve ser autorizada pelo Comando do Exército.
Para o MPF, o decreto pode definir regras, mas “esse regulamento não pode afrontar a regra geral de absoluta restrição à aquisição dessas armas de uso restrito. Assim, toda flexibilização desarrazoada de preceitos de controle e limitação da aquisição e posse de armas de fogo de uso restrito deve ser reputada ilegal”.
O novo decreto também libera “a aquisição pela população civil de rifles e fuzis semi-automáticos de grande poder destrutivo, inclusive modelos que podem ser convertidos, por armeiros, em armas automáticas”, denuncia o Ministério.
Os decretos anteriores de Bolsonaro já favoreceram as milícias de outras formas, como quando dispensa a apresentação de efetiva necessidade para aqueles que querem ter uma arma de fogo. Jair Bolsonaro também permitiu com que fazendeiros possam andar armados por toda sua propriedade, favorecendo as milícias rurais e facilitando a grilagem.
O MPF avalia que “nesse cenário de profusão e confusão de preceito”, causado pelas constantes mudanças na legislação sobre a posse e o porte de armas, “não é exagerado dizer que, para a polícia, no exercício de suas funções administrativas e também de patrulhamento, ficou praticamente impossível discernir o que é autorizado ou não autorizado em termos de posse de armas”.
“E isso gera deterioração da capacidade do Poder Público de controlar e reprimir adequadamente o comércio, a posse e o porte ilícito de armas de fogo, com o consequente alargamento de espaços para que organizações criminosas violentas e milícias tenham acesso indireto a produtos de elevado poderio bélico”.
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