Dez grupos de judeus e muçulmanos se uniram para manifestar o repúdio ao fascismo e a disposição de lutarem juntos contra o perigo representado pela candidatura de Jair Bolsonaro e sua clara tendência fascistizante que se evidencia nos preconceitos, intolerância e apelo à violência e irracionalidade que as manifestações bolsonaristas apresentaram durante esta campanha presidencial.
Grupos de judeus e muçulmanos mostraram que é possível colocar as diferenças de lado por uma causa comum. Dez grupos das duas comunidades assinaram juntos uma nota em oposição ao candidato à presidência Jair Bolsonaro.
“Nossa bandeira comum, como muçulmanos e judeus é barrar toda forma de violência, de preconceito e qualquer outro elemento que dê base ao projeto fascista desse homem e de seus seguidores”, afirmam membros das duas comunidades no texto assinado em conjunto, quatro coletivos de muçulmanos e seis coletivos de judeus.
“Somos, na grande maioria, brasileiras e brasileiros revertidos ao Islã. Registrar a nossa indignação com a realidade política e social a que estamos ‘submetidos’, é vital. Tão contundente quanto, nesse momento e a partir dele, somar em força e fé com a Comunidade Judaica que, de igual forma, não pode tolerar intolerância, desrespeito, formas e movimentos de separatismo e desigualdade. Juntamos forças e vamos juntos, por dias melhores a todas as criaturas. Particularmente, confesso uma enorme alegria nessa união de forças e coragem, junto às mulheres e homens da fé judaica”, declara Regina Márcia que integra o grupo “Muçulmanas contra o fascismo”.
O historiador Michel Gherman, do Núcleo Interdisciplinar de Estudo Judaicos e Árabes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, também signatário do manifesto, enfatiza: “O documento que une muçulmanos e judeus contra a candidatura da extrema-direita no Brasil representa o vínculo que esses dois grupos têm com a tolerância religiosa e com a necessidade de manter o diálogo e não embarcarmos num caminho sem volta para a intolerância e o fascismo”.
A professora Nahid Shair, que participou do protesto do dia 29 contra Bolsonaro, revela o temor ao fim da liberdade religiosa no país, caso ele vença: “A gente vê como uma ameaça de não poder exercer a nossa religião, como garante a nossa Constituição”.
O documento afirma que a cultura de tolerância religiosa ainda não é algo totalmente disseminado no Brasil, que teve um longo período de “massacre cultural imposto aos povos indígenas e africanos, obrigados a renunciar a suas crenças originárias e aceitar o poder dos senhores”.
Os judeus e muçulmanos que firmaram o documento conjunto observam ainda que, em setores evangélicos neopentecostais a restrição às religiões não-cristãs está ameaçando as demais correntes religiosas e de pensamento e que “mesmo com os avanços legais que tornaram o Brasil um dos países mais avançados na criminalização do racismo e da discriminação religiosa, permanece em boa parte da sociedade brasileira o sentimento abafado do segregacionismo excludente” que a “extrema-dreita tira proveito para disseminar o ódio”.
A ameaça fascista, denunciam, procura se criar no solo das “hostilidades de raça, gênero e todas as demais discriminações sociais, hoje personificadas na figura de Jair Bolsonaro. Seu discurso deixa claro o intento de subjugar”.
“Nós, muçulmanos e judeus, que conhecemos os horrores da islamofobia e do antissemitismo, temos a sensibilidade aguçada para perceber as barbaridades proferidas por este candidato”, e o risco que elas representam àqueles que “sofrem diariamente a brutalidade do preconceito e da não aceitação, contrariando a nossa Constituição, que nos garante o direito de vivermos em um Estado Laico. As minorias religiosas se sentem ameaçadas em seus direitos à prática de seus cultos, e até mesmo, nas suas existências”, prossegue o documento.
“Manifestamos o nosso mais profundo repúdio a todas as formas de intolerância que possam comprometer o convívio salutar dos cidadãos com todas as suas diferenças, sejam religiosas, de gênero, de cor ou de ideologia política. Ressaltamos que nossa luta não se restringe apenas à figura pessoal do candidato, mas a tudo que ele representa e todos os que reproduzem o seu discurso”, esclarecem os que firmam o manifesto e prosseguem assumindo uma “bandeira comum, como muçulmanos e judeus” que é “barrar toda forma de violência, de preconceito e qualquer outro elemento que dê base ao projeto fascista desse homem e de seus seguidores”.
Muçulmanos e judeus finalizam com um compromisso solene, que “vão permanecer unidos depois das eleições de 2018. Nossa luta é perene, enquanto existirem nesse país sementes de fascismo, lá estaremos para tornar esse solo cada vez mais impermeável a esta ideologia.”
Assinam o documento, os grupos: Muçulmanos contra Bolsonaro, Coletivo de muçulmanas e muçulmanos contra o golpe, Mesquita Sumayyah Bint Khayat (da comunidade muçulmana de Embu das Artes – SP), Muçulmanas em manifesto contra o fascismo, Judeus contra Bolsonaro, Frente judaica para os Direitos Humanos, Articulação judaica, Meretz Brasil, Movimento de mulheres Ten Iad (Me dê a sua mão), Fórum de judeus sionistas-socialistas pró-Palestina.
NATHANIEL BRAIA