Presidente Herzog pede que votação da lei de desmonte do sistema judiciário seja adiada e recebe líderes da oposição em sua residência
“Netanyahu assuma alguma responsabilidade por suas ações pelo menos uma vez em sua vida e pare de culpar os outros. Seu governo louco é o real culpado pela anarquia. Pare com as lágrimas de crocodilo sobre ameaças imaginárias. Pare com seu plano legislativo destrutivo e verá que a ordem e a unidade são restauradas em Israel”, acusou o líder da oposição, Yair Lapid que antecedeu Netanyahu como primeiro-ministro de Israel.
A fala de Lapid se deu em resposta à tentativa solerte de jogar o país contra o movimento que resiste à supressão do sistema judicial por parte de Netanyahu que acusou a direção oposicionista de “arrastar o país à anarquia”.
MAIS DE 100 MIL TOMARAM A FRENTE DO PARLAMENTO ISRAELENSE
A discussão se deu em um dos dias mais tensos da curta e turbulenta história de Israel quando, em meio a uma greve geral, mais de 100 mil israelenses tomaram a frente do Knesset, o parlamento israelense, nesta segunda-feira (13) quando tinha início a discussão rumo à votação no Comitê de Justiça da legislação que tira da Corte Suprema o poder de legislar contra decisões parlamentares que agridam direitos de cidadania.
As leis de cunho ditatorial também visam blindar o premiê Netanyahu de condenação em quatro processos por corrupção já em andamento no Judiciário israelense.
A nova legislação, que dá poderes excepcionais ao Knesset pode atolar o regime do país em um sistema ditatorial aberto, escancarando um apartheid supremacista judaico-teocrático, onde a opressão ao povo palestino atinja patamares que não se via desde a limpeza étnica durante os anos de implantação do Estado de Israel.
O fim do Judiciário ameaça extinguir os aspectos de direitos de cidadania que sustentam as frágeis e parciais liberdades democráticas privando delas não apenas os palestinos, mas até mesmo os judeus que o Estado de Israel diz proteger e apoiar. Muitos críticos da nova legislação pretendida por Netanyahu e sua coalizão temem que a estas leis se sucedam distorções permitindo que o bando fascista e racista abertamente antipalestino se perpetuem no poder.
Entre os pronunciamentos denunciando a gravidade do assalto ao poder por Netanyahu, destacou-se a líder trabalhista, deputada Merav Michaeli que, falando à multidão, enfatizou que o movimento de “resistência vai continuar até que eles sejam forçados a bater em retirada”.
Apontando para o parlamento, Michaeli destacou: “No interior do prédio que se supõe o bastião de proteção de nossa democracia, estão aqueles que tentam assassinar a democracia”.
“Não há negociação sobre a cláusula de anulação”, disse Michaeli referindo-se à tentativa da coalizão fascista de passar uma lei pela qual uma decisão da Corte Suprema pode ser derrubada por maioria de um voto no parlamento israelense.
EX-CHEFE DO ESTADO MAIOR DENUNCIA NETANYAHU
O ex-chefe do Estado Maior de Israel e ex-ministro da Defesa, Moshé Ya’alon também falou à multidão denunciando que “Netanyahu está fazendo todo o país de refém”.
Ya’alon pediu a renúncia de Netanyahu: “Admita que não tem mais condições de exercer este cargo, se ainda tem alguma consideração pelo Estado de Israel e seus cidadãos, não espere pela decisão do Judiciário declarando-o incapaz e pare de incitar contra a Corte Suprema”.
Nos cartazes redigidos à mão levados por muitos manifestantes, as palavras de integrantes dos mais diversos setores da sociedade israelense. Um dos cartazes, erguido por um homem idoso que se identificava como “sobrevivente do holocausto”, dizia: “Com nosso sangue e nossa alma, defenderemos a democracia”.
PAIS E ALUNOS SE MANIFESTAM JUNTOS NAS RUAS DE ISRAEL
A estudante secundarista, Ella Ivri, trazia seu cartaz afirmando que “nesta aula de cidadania nós não dormimos”. Pais acompanhavam filhos secundaristas que participaram da greve nacional estudantil para participar da manifestação.
Pais se juntaram aos filhos em ato realizado em Tel Aviv ao mesmo tempo da manifestação diante do Knesset em Jerusalém.
Entre eles estava Yonat Meirson com duas filhas gêmeas. “Elas têm oito anos de idade e estão começando a entender o que está acontecendo aqui. Nós ouvimos as notícias em casa, e elas sentem o que é democracia. É bom que tanta gente esteja nas ruas. As pessoas entendem que uma linha foi cruzada”, diz Yonat, em meio aos apitos, rufar de tambores e gritos de “Democracia! Democracia!”
LIDERANÇAS ÁRABES APOIAM AS MANIFESTAÇÕES
O líder palestino-israelense, dirigente do partido Ta’al (partido árabe com assento no Knesset, saudou a manifestação. “Apesar de reconhecer a falta de empatia que o sistema judicial israelense tem para com os cidadãos árabes, nós nos opomos a este golpe que chamam de ‘reforma’”.
“Se esta proposta tivesse passado dois anos atrás”, disse Tibi, “a deputada Tali Gottlieb seria juíza hoje {a deputada declarou, assim que assumiu o mandato, que pretendia “ignorar a Corte Suprema, que não tem autoridade]. Hoje Zvi Sukkot, que é suspeito de ter incendiado uma mesquita é deputado e pode se tornar membro do comitê que vai indicar juízes”.
Mansour Abbas, dirigente da Lista Árabe Unida, ressaltou que seu partido apoia a manifestação. “Para deixar o mais claro possível”, disse ele em entrevista ao rádio A-Shams, “nós apoiamos este protesto”.
Abbas esclareceu porque ele, Tibi e os cidadãos árabes apoiaram a manifestação de longe: “Se Tali Gottlieb foi tão longe contra a presidente da Suprema Corte, eles usariam qualquer pretexto para atentar contra a legitimidade do movimento de protesto”.
PROVOCAÇÕES E AGRESSÕES CONTRA OS PALESTINOS
No mesmo momento em que a sociedade israelense se mobiliza contra o descambar do regime israelense rumo ao fascismo, apartheid e ditadura, os extremistas no atual governo ampliam as provocações contra os palestinos e anunciam a aceleração do assalto a suas terras na Cisjordânia.
O representante dos fascistas do partido Otzma Yehudit (Poder Judaico), no governo, Itamar Ben Gvir, que foi guindado por Netanyahu à posição de ministro da “Segurança Nacioinal”, é pródigo em perpetrar provocações. Em seus poucos dias de governo, já fez uma visita acompanhado de religiosos fanáticos e com apoio de escolta militar à área sagrada para os muçulmanos, a mesquita Al Aqsa (com visitas só permitidas mediante agendamento ou em horários específicos). Depois da visita já disse que o exército deve aumentar as prisões e a repressão nos territórios palestinos, e lançou a estranha meta de “piorar as condições de detenção dos prisioneiros palestinos”.
Entre as suas brilhantes ideias, a suspensão da autorização aos presos palestinos de preparar seu pão árabe (as pitas) e a determinação de que os presos só devem ter 4 minutos no máximo para tomar banho quente.
A tensão de fato tem aumentado com mais mortes e ferimentos tanto de palestinos como de israelenses. A clara sensação que dá é que Ben Gvir não vai sossegar enquanto não provocar mais um ciclo de terror e violência na região.
Junto com ele, em sua deletéria ação contra o povo palestino, está Bezalel Smoltrich, a quem foi entregue a administração dos territórios palestinos sob ocupação israelense.
Fica evidente que Netanyahu se submeteu aos extremistas mais alucinados do país, deixando de governar de fato.
Em determinação recente, cedendo a Smoltrich, o premiê que busca desmontar o poder judicial para fugir da cadeia autorizou a legalização de mais 9 assentamentos judaicos (epíteto para conjuntos residenciais de israelenses construídos sobre terra assaltada aos palestinos, o que constitui crime de guerra). Também anunciou o apoio financeiro governamental para a construção de mais 10 mil unidades residenciais sobre terras palestinas.
UNIÃO EUROPEIA E ESTADOS UNIDOS SE MANIFESTAM*
A degeneração e a desfaçatez tomaram tal dimensão que até a União Europeia e os Estados Unidos se manifestaram em repúdio a tais agressões.
O porta-voz da União Europeia, Peter Stano, declarou:
“As autoridades israelenses anunciaram, neste domingo, que considerariam nove postos avançados para colonos ilegais na Cisjordânia ocupada como legais sob a lei israelense.
A União Europeia rejeita esta decisão e reitera a sua posição de que os assentamentos são ilegais à luz do direito internacional e de que não reconhecerá quaisquer alterações nas fronteiras de 1967 para além das acordadas pelas partes. A UE reitera o seu apelo às autoridades israelenses para que suspendam a construção de assentamentos e revertam urgentemente estas últimas decisões.
A UE está seriamente preocupada com o aumento das tensões e o aumento da violência.
No atual contexto preocupante, é importante considerar medidas para diminuir a escalada da situação e evitar decisões e ações unilaterais que minariam a viabilidade de uma Solução negociada de Dois Estados para o conflito, e que alimentariam mais tensões.
A União Européia está pronta a ajudar as partes a reconstruir um caminho para o diálogo e a trabalhar em conjunto, para inverter o ciclo negativo da violência e evitar mais perdas de vidas.”
Também se manifestou o secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken: “Estamos profundamente preocupados com a decisão de Israel, publicada ontem, de avançar a construção de quase 10.000 unidades habitacionais em assentamentos e iniciar um processo para legalizar retroativamente nove postos avançados na Cisjordânia, que anteriormente eram ilegais sob a lei israelense.
Como nos governos anteriores, democratas e republicanos, nos opomos fortemente a tais medidas unilaterais, que exacerbam as tensões e minam as perspectivas de uma Solução negociada de Dois Estados.
Como já afirmei anteriormente, qualquer coisa que nos afaste da visão de Dois Estados para Dois Povos é prejudicial à segurança a longo prazo de Israel, à sua identidade como Estado judeu e democrático e à nossa visão de medidas iguais de segurança, liberdade, prosperidade e dignidade para israelenses e palestinos.
Apelamos a todas as partes para que evitem ações adicionais que possam aumentar ainda mais as tensões na região e para que tomem medidas práticas que possam melhorar o bem-estar do povo palestino.”
NATHANIEL BRAIA
*A tradução dos pronunciamentos da UE e dos EUA foram realizados pela organização Paz Agora/BR