Líderes do mundo inteiro reprovam a decisão de Trump de transferir a embaixada dos Estados Unidos de Tel Aviv para Jerusalém, cuja parte leste está sob ocupação israelense desde a 1967
A decisão oficializada na quarta-feira (6) ameaça incendiar de novo o Oriente Médio e implodir qualquer perspectiva de paz. O reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel é contrário ao direito internacional, como estabelecido pelas resoluções 242 e 2334, e premia o apartheid, a ocupação, a brutalidade e o assalto às terras palestinas. Líderes do mundo inteiro se uniram na condenação do anúncio, pelo presidente Donald Trump, da transferência da embaixada norte-americana para Jerusalém (Al Quds, na denominação em árabe), cuja parte leste está sob ocupação israelense desde 1967, conforme as resoluções da ONU.
O “beijo da morte no processo de paz” – como já está sendo chamada a decisão – desencadeou protestos na Palestina ocupada que já começam a se estender às capitais islâmicas. Em discurso, o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, chamou Jerusalém de “capital eterna palestina” e afirmou que os EUA abdicaram da condição de mediador da paz no Oriente Médio. Manifestantes palestinos ergueram cartazes com dizeres “mova a embaixada para o seu país, não para o nosso” (veja matéria ao lado).
Em entrevista imediatamente após o comunicado de Trump, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, afirmou que se opõe a “medidas unilaterais” que comprometam a “perspectiva de paz para israelenses e palestinos”. “Neste momento de grande ansiedade, quero deixar claro, não há alternativa para a solução de dois estados. Não há nenhum plano B”.
PAPA, ONU, EUROPA
A reprovação de Guterres se soma ao pedido feito pelo Papa Francisco para que Trump respeite o status quo de Jerusalém e se conforme com as resoluções da ONU. Diante de milhares de peregrinos, o papa afirmou que não conseguia “ficar calado sobre minha profunda preocupação com a situação que foi criada nos últimos dias”.
Também os principais líderes europeus compartilham esse repúdio ao ato de Trump. “Esta decisão é uma decisão lamentável de que a França não apoia e vai contra o direito internacional e todas as resoluções do Conselho de Segurança da ONU”, afirmou o presidente francês Emmanuel Macron.
A primeira-ministra britânica, Theresa May, declarou que a Grã Bretanha se opôs à decisão de Trump sobre Jerusalém, que chamou de “inútil em termos de perspectivas para a paz na região”. “A embaixada britânica para Israel tem sede em Tel Aviv e não temos planos de movê-la”. E ainda: “de acordo com as resoluções relevantes do conselho de segurança, consideramos Jerusalém Oriental como parte dos territórios palestinos ocupados”.
RÚSSIA E CHINA
“Reconhecer Jerusalém como a capital de Israel não acalma um conflito, mas o exacerba ainda mais”, assinalou o chanceler alemão, Sigmar Gabriel, que se disse preocupado com “confrontos violentos” no Oriente Médio. A chanceler da União Europeia, a italiana Federica Mogherini, reiterou que a UE apoia “a solução de dois estados” e que qualquer ação que mine esses esforços “deve ser evitada”.
Na véspera do comunicado de Trump, o presidente russo Vladimir Putin telefonou para o presidente palestino Abbas para reiterar o apoio de Moscou. A chancelaria chinesa, através do porta-voz Geng Shuang, pediu a todas as partes do conflito no Oriente Médio que evitem novo confronto regional. Ele acrescentou que Pequim apoia firmemente “o processo de paz no Médio Oriente e o estabelecimento de um Estado palestino com total soberania e independência com base nas fronteiras de 1967 com Jerusalém Oriental como capital”.
IRÃ E PAÍSES ÁRABES
Entre os países de fé islâmica, a proclamação de Trump caiu como um raio. A Liga Árabe declarou que “qualquer reconhecimento da cidade de Jerusalém como capital do poder ocupante, o estabelecimento de qualquer missão diplomática em Jerusalém ou sua transferência para a cidade é uma agressão aberta contra a nação árabe, os direitos do povo palestino e de todos os muçulmanos e cristãos”. A Organização de Cooperação Islâmica, que abrange mais de 50 países, foi convocada para o próximo dia 13.
Diante da gravidade da questão, não houve como ficar em cima do muro. O rei Abdullah da Jordânia – legalmente o guardião dos lugares santos de Jerusalém -, advertiu que a mudança decidida por Trump teria “perigosas repercussões na estabilidade e segurança da região”. O presidente egípcio Abdel Fatah Al Sisi, alertou contra medidas “que prejudiquem a paz no Oriente Médio” e afiançou a posição do Egito de “preservar o status legal de Jerusalém dentro do âmbito de referências internacionais e resoluções relevantes da ONU”.
A Turquia ameaçou até mesmo vir a cortar os laços diplomáticos com Israel. “Sr. Trump, Jerusalém é a linha vermelha dos muçulmanos”, disse o presidente Recep Erdogan. Até mesmo a monarquia saudita, envolvida em manobras de bastidores com Israel para ameaçar o Irã e que agride o pequeno Iêmen, teve de vir a público dizer que “um passo tão perigoso provavelmente inflamará as paixões dos muçulmanos em todo o mundo devido ao excelente status de Jerusalém e da Mesquita Al Aqsa”.
O governo Assad afirmou que a [transferência] é o ponto culminante do crime de usurpar a Palestina e deslocar o povo palestino”. Por sua vez o líder iraniano, aiatolá Ali Kamenei, considerou que o que faz os imperialistas e lacaios quererem anunciar Quds como capital é sua “incompetência e fracasso”. Já o governo iraquiano alertou sobre “as ramificações dessa decisão sobre a estabilidade da região e do mundo”.
Mas o anúncio, como tudo em Trump, em bem se procurando sempre se acha a fraude. No mesmo dia em que anunciou a “transferência para Jerusalém”, conforme o Guardian inglês ele assinou a autorização para adiá-la por seis meses, alegando que se não fizesse isso não teria como custear a atual embaixada. O mesmo Guardian diz que a transferência, de verdade, pode demorar anos e inclusive ficar para depois do fim do mandato de Trump. Por puro acaso, foi votado, mas não passou na Câmara de Deputados em Washington, pedido de impeachment, que teve pouco mais de 50 votos. Quem sabe o próximo …
ANTONIO PIMENTA