Ícone da revolução popular sandinista, o músico Carlos Mejía Godoy foi obrigado a partir para o exílio diante da perseguição do governo de Daniel Ortega e de sua esposa, Rosario Murillo, contrariados pelas novas canções com as quais o cantautor embalou a insurreição que varre o país contra o despotismo da dupla desde 18 de abril.
Conforme Mejía Godoy, ele decidiu se exilar na Costa Rica assim que foi alertado de que corria perigo por denunciar o regime orteguista. “Tive que sair da Nicarágua, porque minha vida estava em risco”, afirmou.
“Tive que sair sem avisar a ninguém, de forma urgente da Nicarágua. Fui recomendado que abandonasse o país o quanto antes. Permaneci na Nicarágua o tempo que pude, mas saí em exílio porque considero que minha voz fora da Nicarágua também é importante”, declarou Mejía Godoy, destacando que voltará à Pátria de Sandino assim que existirem as condições de segurança. Enquanto isso, disse que utilizará sua arte para fazer ouvir a voz do povo da Nicarágua, o que já fez na Espanha da transição, durante seu exílio, em 1977, quando denunciava a ditadura somozista. Com a mesma determinação, compôs recentemente “Os heróis de abril”, “As mães de abril” e “Sou Álvarito Conrado”, exaltando a resistência iniciada com as manifestações. Com apenas 15 anos, o estudante Álvaro Conrado morreu com um tiro no pescoço vítima da repressão orteguista.
Há um mês, em carta personalizada a Daniel Ortega, o músico acusou o presidente de exercer “um cinismo sórdido” e de executar um genocídio contra o seu próprio povo desde que iniciaram as mobilizações contra a reforma da Previdência. “Daniel: completei 75 anos de idade. E cinquenta (meio século) de cantar a realidade de meu povo. Dou-te uma má notícia. Nunca irei me aposentar, porque, como sabes, os pássaros não se aposentam. Por isso aqui estou, mais entregue do que nunca, à causa da liberdade, da justiça e da decência, como dizia Sandino, de Niquinohomo, o ‘legítimo’, não aquele que vocês desfiguraram à sua imagem e semelhança”, protestou.
Em entrevista ao vivo na televisão, o cantautor da revolução fez uma exortação para que Daniel Ortega escolha o caminho da vida e não da morte. “Em nome deste Deus, que te enche a boca e a alma. Em nome deste Deus, que está vendo este holocausto, pare de matar. Já, Daniel. Pare de matar”, implorou.
A partir daí as ameaças contra Mejía Godoy se multiplicaram rapidamente, atingindo, inclusive, os filhos do artista, aos quais ele também escreveu uma carta aberta, em que pedia desculpas por lhes afetar em sua vida privada. “Apelo para que denunciem os ataques daqueles que se escondem no anonimato para lançar, covardemente, podridão e lixo contra vocês, pois esses ataques são tão criminosos como os que se perpetuam com armas físicas letais. Diz o Papa Francisco, que tão terrorista quanto quem instala uma bomba, é o que lança uma calúnia contra o próximo”, assinalou Mejía Godoy.