“Não soou nenhum alarme”, diz sobrevivente no julgamento do incêndio da boate Kiss

Sobreviventes do incêndio que matou 242 pessoas há 8 anos relataram falta de equipamentos e sinalização na boate - Foto: Reprodução/Correio do Povo

O segundo dia de julgamento do incêndio da boate Kiss, na quinta-feira (2), no Foro Central de Porto Alegre, terminou marcado por discussões ásperas entre promotores e advogados e até uma intervenção mais veemente do juiz Orlando Faccini Neto. À tarde, também teve o primeiro depoimento de uma testemunha no processo, além de três sobreviventes.

Os sobreviventes Emanuel Pastl e Jéssica Montardo Rosado depuseram pela manhã na quinta-feira.

Emanuel citou elementos técnicos que, segundo ele, falharam na noite da tragédia. “Quando deu o princípio de incêndio, não soou nenhum alarme, não estava clara a rota de saída de emergência e também não teve iluminação. Eu não tinha visualização nenhuma. Não lembro de ter visto extintor”, disse.

Já Jéssica contou sobre a perda do irmão. Segundo ela, ele entrou dentro da boate para tentar salvar outras pessoas. “Há relatos de bombeiros e pessoas que ajudaram, as pessoas acreditam que ele salvou de 14 a 15 pessoas, porque cada vez que ele ia ele voltava com dois. Eu queria ter feito mais mas eu não tive força”, relatou.

O DJ Lucas Cauduro Peranzoni foi o último a falar, à noite, e chorou muito ao ver vídeo do incêndio na Kiss. O sobrevivente ainda confirmou que a boate usava baldes de espumante com artefatos pirotécnicos em apresentações.

“Eu desmaiei. Caí e fui muito pisoteado. Alguém me tirou de lá”, disse Lucas para a promotora Lúcia Helena Callegari, aos prantos, para explicar por que não ajudou outras pessoas.

ESPUMA

O engenheiro Miguel Ângelo Teixeira Pedroso falou nesta quinta que teria desaconselhado o uso da espuma isolante na casa noturna. Ele foi a primeira testemunha incluída no processo e pediu preferência para ser ouvido, por isso ficou toda a tarde e parte da noite respondendo aos questionamentos.

“Só um leigo e ignorante na área poderia achar que espuma fosse conveniente dentro de uma boate”, disse engenheiro.

Durante o julgamento, houve uma série de momentos tensos entre as partes. Ora Ministério Público ora advogados questionavam a condução das perguntas.

Em um determinado momento, o juiz Faccini Neto interveio e classificou uma ação da defesa do réu Elissandro Spohr como “apelativa e desnecessária”. O advogado Jader Marques chamou seu cliente para o centro do auditório e, frente a frente com uma sobrevivente do incêndio, questionou se ela tinha “ódio” do acusado.

Entre o depoimento da testemunha e do último sobrevivente, o magistrado sugeriu um intervalo, mas Jader Marques solicitou o encerramento das atividades. Como o DJ havia pedido para ser ouvido ainda na quinta, os jurados deliberaram por um recesso de 30 minutos, criticado pelo advogado.

O juiz, então, criticou e pediu que as partes se esforçassem para dar andamento ao processo.

“Posso lhe dar minha comida, se o senhor quiser”, enfatizou.

E também houve momentos de distensão. Quando o advogado Mário Cipriani, representante do empresário Mauro Hoffmann, perguntou ao engenheiro Pedroso se a espuma era tóxica e poderia comê-la, o depoente brincou, “vai lhe dar uma dor de barriga terrível”, disse.

Nesta etapa do julgamento, 14 sobreviventes são questionados pelo juiz, pelo Ministério Público, pelo assistente de acusação e pelos defensores dos réus, nessa ordem.

Nesta sexta (3), serão ouvidos Daniel Rodrigues da Silva e Gianderson Machado da Silva, a pedido do Ministério Público, e Pedrinho Antônio Bortoluzzi, solicitado pela advogada de Marcelo de Jesus, Tatiana Borsa. Ainda participará o sobrevivente Érico Paulus Garcia, que deve ser entrevistado no período da noite.

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