
“A relação do Brasil deve ser harmoniosa com todos os países, afinal temos interesses com todos”, defendeu a deputada federal Perpétua Almeida, líder do PCdoB e presidente do Grupo de Trabalho (GT) da Câmara dos Deputados que acompanhará a implantação da tecnologia 5G no Brasil, na reunião que abriu oficialmente os trabalhos do grupo nesta semana.
A parlamentar comentou que o GT tem como objetivo apresentar os resultados dos seus trabalhos antes da publicação do edital do leilão das frequências destinadas à tecnologia de quinta geração móvel, que está em elaboração pela Anatel.
“Esse grupo foi criado por Decreto da Casa e nós temos a função de acompanhar, monitorar todo o entorno que envolve o 5G no Brasil. Nosso trabalho é cuidar para que o Brasil esteja bem posicionado. É preservar a não exclusão de nenhum setor, de nenhum órgão. Trabalharemos para acolher o que possa vir para ajudar no crescimento do País”, disse Perpétua.
O leilão do 5G está previsto para acontecer no próximo ano. Oficialmente não há data para o edital ser votado pelo conselho diretor da Agência Nacional de Telecomunicações. O presidente da Anatel, Leonardo Euler de Morais, já sinalizou que isso poderia acontecer na primeira reunião do ano, dia 4, mas, para isso, o relator do edital, Carlos Baigorri, precisa concluir sua relatoria e o prazo regimental até março, prorrogáveis por até 120 dias.
“Trabalharemos para acolher o que possa vir para ajudar no crescimento do País”, disse Perpétua
Bolsonaro já deixou claro que quer colocar o Brasil na guerra comercial que o presidente derrotado dos EUA, Donald Trump, abriu contra a República Popular da China, que é o maior parceiro comercial do Brasil.
Através do Itamaraty, o governo já assinou protocolos de intenções de apoio ao “Clean Network” (ou “Rede Limpa”), lançado por Donald Trump – um acordo cujos países signatários se submetem a banir de suas redes a tecnologia 5G da Huawei e quaisquer outras tecnologias de origem chinesa, sejam móveis ou fixas, e as de aplicativos para celulares, por exemplo. Com isso, os norte-americanos estariam livres para impor a estes países seus dispositivos 5G, que são, em média, 30% mais caros que os equipamentos da Huawei.
A adesão do Brasil a esse programa, segundo representantes de empresas de telefonia e provedores de internet, prejudicaria a implantação do 5G no território brasileiro, pois as empresas serão obrigadas a substituir os equipamentos da Huawei em suas redes, gasto esse que não permitiria a ampliação da cobertura, e os custos da troca desses aparatos seriam repassados aos consumidores.
Além disto, como a “Rede Limpa” prega a retirada de qualquer dispositivo chinês das redes, sejam estas móveis ou fixas, um possível bloqueio para os componentes de origem chinesa geraria uma abrupta elevação nos preços por parte dos fornecedores, o que provocaria um quebradeira geral no setor de empresas de Internet Service Provider (ISP) – pequenos provedores de internet.
TIM: “usamos equipamentos chineses há 20 anos e não tivemos nenhum histórico de problema de segurança, de vazamentos”
O diretor executivo de tecnologia e informação da TIM, Leonardo Capdeville, defende o uso da tecnologia chinesa nas redes nacionais, já que as grandes operadoras usam estes aparatos “há 20 anos e não tiveram nenhum histórico de problema de segurança, de vazamentos”.
“Não teve apagão das telecomunicações na Copa, nem nas Olimpíadas, nem agora que o consumo cresceu na pandemia de Covid-19. Não há nada que desabone essas tecnologias”, disse o executivo. O representante da TIM também frisou que, caso as intenções do governo prosperem, os pequenos provedores (ISPs) seriam riscados do mapa, pois seriam impossibilitados de comprar os produtos de baixo preço dos chineses.
No Brasil, há produção local de equipamentos de tecnologia para a informação, mas os fabricantes são dependentes dos componentes vindos do Continente Asiático. Para se ter uma ideia do que isso significa, a fabricante chinesa de produtos para redes ópticas Fiberhome declarou ao mercado brasileiro ter abastecido ao menos 55% dos ISPs com seus equipamentos.
Ari Lopes, da consultoria Omdia, explica que, “banindo as empresas chinesas, fecha-se a porta a equipamentos baratos e com qualidade, que auxiliam muito o mercado de ISPs. Não existe alternativa a isso. Uma decisão assim limita a quantidade de fornecedores brutalmente. E, até por uma questão de capacidade, os fornecedores autorizados vão fazer aumento de preço praticamente instantâneo”, analisou Lopes.
ABRINT: “Em termos de espionagem, banir um fornecedor por marca ou origem é apenas escolher quem poderá espionar as redes”
Basílio Perez, integrante do conselho de administração da Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (ABRINT), diz que a proposta dos EUA em financiar a aquisição de equipamentos de rede não-chineses é inócua.
“Em termos de espionagem, banir um fornecedor por marca ou origem é apenas escolher quem poderá espionar as redes. Qualquer grande fabricante tem condições de ter uma porta no equipamento. Excluir o chinês não é garantia de que outro produto não vai ter. A China também pode financiar a compra dos produtos de seus fabricantes. E para o nosso universo de provedores, não faz sentido comprar um produto porque seria financiado pelos EUA. Seria algo complexo e distante da nossa realidade”, resume Perez.
TelComp: “Os ISPs são dependentes da China da mesma forma que a indústria farmacêutica. Se não puderem importar, vão fechar”
João Moura, presidente executivo da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (TelComp), diz que “os ISPs são dependentes da China da mesma forma que a indústria farmacêutica. Se não puderem importar, vão fechar”, disse Moura, ao comentar que não acredita que o governo encampe tal proposta.
“Se o governo partir para um banimento com essa base política, de que lá na China o governo é comunista, que falta governança, não terá como traduzir isso para uma normativa objetiva porque, se vale para telecomunicações, tem que valer para tudo mais”, observou.