Um jornalista esportivo nicaraguense foi condenado nesta quarta-feira (16) a nove anos de prisão pelo delito de conspirar contra a integridade do país, em mais um dos julgamentos extemporâneos movidos pelo governo de Daniel Ortega e de sua esposa Rosario Murillo contra opositores.
Divulgada por uma frente humanitária, a informação foi repercutida pelo La Jornada, importante jornal mexicano, que tem ampliado o isolamento do regime ditatorial com notícias sobre o que vem ocorrendo no país centro-americano.
“O Judiciário condenou o jornalista Miguel Mendoza a nove anos de prisão e à inabilitação de cargos públicos por conspirar para minar a integridade nacional”, denunciou o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh) em sua conta no Twitter.
Durante o julgamento, ocorrido no dia 8 de fevereiro, o cronista esportivo com mais de 30 anos de experiência se declarou orgulhoso de ser jornalista independente e de estar ao lado do povo nicaraguense na luta pela democracia e a Justiça.
De acordo com seus familiares, Mendoza encontra-se de castigo, completamente isolado em uma cela da Direção de Auxílio Penal (DAP) desde junho do ano passado, com a condição de saúde bastante deteriorada pela péssima qualidade dos alimentos que recebe, padecendo inclusive de frio por não contar sequer com uma coberta.
Mendoza é um dos 46 opositores detidos no ano passado, a maioria antes das eleições de novembro, entre os quais os sete principais candidatos à presidência contrários ao governo. Na oportunidade, o mandatário conquistou seu quarto mandato consecutivo desde que voltou ao poder em 2007.
Entre os presos se encontrava o comandante da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), Hugo Torres, responsável por duas ações heroicas que libertaram o próprio Ortega do cárcere ditatorial de Somoza, em 1974, e do líder Tomás Borge, em 1978. Atualmente líder oposicionista, Hugo Torres morreu no último sábado (12), aos 73 anos, após ser transferido da prisão para um hospital por uma doença não especificada, conforme comunicado do Ministério Público. Suas condições de saúde também se encontravam bastante precárias, conforme haviam alertado as organizações humanitárias.
AUDIÊNCIA FECHADA
Como tem sido prática no atual governo, o cronista esportivo foi considerado “culpado” na semana passada em uma audiência fechada na Diretoria de Assistência Judicial (DAJ, investigação) da polícia de Manágua.
“Nos últimos anos, Mendoza tem compartilhado suas opiniões políticas sobre a situação dos direitos humanos e criticado o governo” nas redes sociais, onde tinha milhares de seguidores, relatou o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), que vinha se manifestando pela necessidade de sua imediata libertação.
Antes de ser capturado, em dezembro de 2018, Miguel Mendoza e sua esposa tinham sofrido um estranho assalto em que cinco homens armados lhe colocaram de joelhos antes de levarem sua camionete, três celulares e um notebook.
De forma completamente arbitrária, os opositores têm sido processados com base na “Lei de Defesa dos Direitos do Povo à Independência e Soberania”, aprovada em 2020, que considera “traidores da pátria” a todos aqueles que ameaçam a “integridade nacional” – como é chamada a manutenção do regime Ortega/Murillo.
Nesta quarta-feira, a opositora Nidia Barbosa também foi condenada a nove anos pelo crime de “menosprezo” à autoridade. Na terça-feira (15) o presidente da União Democrática Renovadora (Unamos, da dissidência sandinista), Suyén Barahona, recebeu oito anos pelo mesmo crime. Por “menosprezo” também foram declarados culpados outros 20 opositores desde primeiro de fevereiro deste ano, dos quais dez foram condenados com penas que variam de oito a 13 anos de prisão. Segundo a legislação em vigor, o juiz primeiro dita um veredito para posteriormente determinar o prazo da condenação.
Na última terça foi iniciado um novo “julgamento” contra outros sete oposicionistas, entre eles três candidatos à presidência (nas eleições que ocorreram no final do ano passado): Juan Sebastián Chamorro, Félix Maradiaga e Arturo Cruz.
O banho de sangue promovido pela ação de policiais e paramilitares contra os protestos sociais desde 2018 já ceifou a vida de 355 pessoas e feriu 1.600, conforme a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), sendo responsável pela migração de mais de 100 mil nicaraguenses.