“Eu represento um movimento abolicionista em um sistema escravista”, disse o candidato a presidente. Ele se comprometeu a aprovar, caso eleito, suas principais propostas nos seis primeiros meses do mandato, e, ainda, ampliar a negociação com governadores e prefeitos, a fim de equacionar o problema da dívida dos Estados
“Eu represento um movimento abolicionista em um sistema escravista”, disse Ciro Gomes, em sabatina na bancada do JN (Jornal Nacional), nesta terça-feira (23). Segundo ele, nenhum presidente da República, desde a redemocratização promoveu grandes mudanças no País.
Ciro foi o segundo a ser entrevistado pelo JN. Na segunda-feira (21), o sabatinado foi Jair Bolsonaro (PL). A série vai ouvir ainda, quinta-feira (25), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A rodada de entrevistas com os presidenciáveis se encerra, sexta-feira (26), com a presença da candidata do MDB, senadora Simone Tebet (MS).
Ciro Gomes (PDT) está na corrida ao Planalto, na terceira posição, com 7% segundo o Datafolha, atrás do ex-presidente Lula, na primeira posição, com 47%, e Jair Bolsonaro (PL), na segunda posição, com 32%.
MORTOS PELA COVID
Quando os entrevistadores trataram sobre pandemia de covid-19, Ciro disse que o Brasil tem 3% da população mundial, mas que 11 de cada 100 vítimas da covid-19 no mundo foram do Brasil. Ele classificou, na entrevista, que Bolsonaro teve um “comportamento genocida” no tratamento da pandemia e elogiou o ex-governador de São Paulo, João Doria (PSDB), pelo papel que teve na produção e compra de vacinas.
“Eu vi ontem o cidadão aqui, o senhor presidente da República. O Brasil, meu irmão, tem 3% da população do mundo, e aqui morreram 11 de cada 100 pessoas que morreram no mundo, na pandemia. Qual é a explicação? Foi o comportamento genocida, que é uma palavra ruim, dura, mas foi o comportamento anticiência”, afirmou.
“Foi o adiamento eterno por politicagem barata com a questão das vacinas. Falaram que em janeiro se vacinariam. Vacinou porque o governador de São Paulo transformou isso na sua principal ferramenta”, elogiou.
GOVERNANÇA, REPACTUAÇÃO E REELEIÇÃO
“Negociar em cima da mesa, sem o toma lá dá cá e sem a roubalheira”, explicou. Ele disse também que vai substituir o atual modelo de governança política por “repactuação” entre União e Estados.
E, segundo ele, caso persista o impasse, convocará plebiscitos.
Sobre a promessa de não concorrer à reeleição, Ciro argumentou que o que destruiu a governança no Brasil foi a possibilidade de os presidentes se reelegerem e, por isso, terá relação melhor com o Congresso.
Segundo Ciro, o atual modelo de governança é gerador de “crise eterna”.
REPACTUAÇÃO POLÍTICA
Segundo o programa do candidato ao Planalto elo PDT, ele se comprometeu aprovar as principais propostas nos seis primeiros meses do mandato, caso seja eleito, e ainda ampliar a negociação com governadores e prefeitos.
Ele disse também que abre mão da reeleição para construir relação equilibrada com o Congresso, a fim de aprovar as propostas do governo no Legislativo.
Ele se comprometeu, ainda, se eleito, em renegociar as dívidas dos Estados, e quando houver impasse convocar plebiscitos, a fim de consultar a população sobre os grandes impasses que surjam no debate político.
Questionado sobre o isolamento da candidatura dele, sem a aliança com outros partidos, e como conseguirá ter o apoio do Congresso caso se eleja, ele afirmou que pretende quebrar o que chamou de “presidencialismo de coalizão” e transformar a eleição dele “em um plebiscito programado” para debater as propostas dele.
MODELO ECONÔMICO
“A ciência da insanidade é repetir as mesmas coisas e esperar resultados diferentes”, pontificou. Ele chamou, como fez de outras vezes, a polarização entre Lula e Bolsonaro de “odienta”, e afirmou que está se tentando repetir “uma espécie de 2018”, ao contrário.
Sobre o chamado “orçamento secreto”, controlado no Congresso pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que ele chamou de “despudorado”, ele disse que vai acabar, se for eleito.
Para mudar o quadro de pobreza da população mais carente propôs criação de renda mínima constitucional. Trata-se, segundo Ciro, de programa de renda mínima “com status constitucional”. Ainda segundo ele, para viabilizar isso, “tem que confrontar” quem construiu a atual situação [de crise] do País.
A viabilidade da proposta de criar programa de renda mínima de R$ 1 mil foi explicada por Ciro. “Será parte de uma nova configuração da Previdência Social” e promete taxar grandes fortunas. “Essa conta fecha porque vou agregar um tributo sobre grandes fortunas apenas sobre patrimônios superiores a R$ 20 milhões”, esclareceu.
DEBATE NACIONAL
O candidato prometeu ampliar a negociação com governadores e prefeitos. E abordou o problema da renegociação de dívidas e, em seguida, convocar plebiscitos com a população.
Na sabatina, Ciro afirmou que pretende transformar a eleição dele “em um plebiscito programado” para discutir as propostas com a população.
A ideia de promover plebiscitos, segundo Ciro, se espelha mais na Europa, que os usa para superar grandes impasses.
DESENVOLVIMENTO
“Projetar o Brasil para os próximos 30 anos” e transformar o Brasil “em uma Portugal” nos índices de qualidade de vida, propôs o presidenciável.
Para atingir este objetivo, Ciro falou em “energizar” a política brasileira, que segundo ele é a mesma há 30 anos. Ele citou a queda em índices de industrialização da economia e criticou a polarização entre Lula e Bolsonaro, o que na visão dele atrapalha o País ir para frente. “O Brasil não aguenta mais isso”, completou.
Essa energização passa, na compreensão do candidato, por exemplo, em liberar 15% da receita de estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. “Esses 15% ficarão na mão dos governadores, e aí vou conseguir uma mediação generosa”, asseverou.
Ao falar sobre empregos, mencionou a proposta de criar 5 milhões de novos postos de trabalho.
TRÁFICO DE DROGAS
Na entrevista, Ciro classificou como “equivocadíssima” a lei de combate ao tráfico de drogas no Brasil. Ele alegou que essa levou “800 mil negros e jovens aos presídios sem ter cometido crimes”.
Ele se referiu aos índices de encarceramento no Brasil, o quarto maior do mundo.
Durante a pandemia de covid-19 no Brasil, o número de pessoas encarceradas aumentou em 61 mil, segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Só no último ano — entre abril de 2020 e maio deste ano —, o número subiu 7,6%: foi de 858.195 pessoas para 919.651. O total é novo recorde, segundo sistemas oficiais, e foi puxado pela volta da fome no País.
Ele defendeu também que o governo federal assuma a tarefa de investigar facções criminosas, como milícias e narcotráfico, e crimes do colarinho branco.
“LEI ANTIGANÂNCIA”
Ao fechar a entrevista, nas considerações finais, Ciro Gomes propôs a criação de “lei antiganância”, beneficiando pessoas que tivessem que pagar “por duas vezes uma mesma dívida” que possui, extinguindo a dívida.
Por fim, disse que “a ciência de errar” é repetir as mesmas coisas do passado e acreditar que pode ser diferente, e ainda pediu o voto de eleitores indecisos.
MEIO AMBIENTE
Para o pedetista, a preservação do meio ambiente e a implementação de economia sustentável requer que a população das áreas de florestas seja treinada para obter produtividade de maneiras que não sejam o simples desmatamento.
“Nós temos que fazer um grande esforço de retreinamento, de diversificação da atividade produtiva. Por que o nosso povo? Nosso povo só sabe desmatar, pega madeira de lei sensível, corta e ganha 2 mil dólares por metro cúbico, 2 metros cúbitos de mogno, ele não entende como é que ele vai passar fome, com o filho dele com fome, tendo que ir embora com aquela árvore ali podendo dar 2 mil dólares com o contrabando absolutamente grave”, afirmou Ciro.
Contudo, disse que seu governo será duro contra os poderosos criminosos ambientais.
M. V.