
À beira de ir para a cadeia, ex-mandatário defende vândalos do 8 de janeiro
Jair Bolsonaro, em ato realizado em Copacabana, Zona Sul do Rio de Janeiro, voltou a pedir “anistia” para os vândalos golpistas que depredaram as sedes dos Três Poderes da República no dia 8 de janeiro de 2023 e a ele próprio, um dia após as comemorações dos 40 anos em que o Brasil se livrou de uma ditadura que se estendeu por 21 anos, à qual ele sempre foi um adorador, assim como dos torturadores da época.
Do carro de som, adornado pela bandeira dos Estados Unidos (algo que chamou muita atenção) e dirigindo-se a uma plateia bem inferior à que foi prevista pelos organizadores, Bolsonaro defendeu os golpistas que fugiram do país: “Eu jamais podia imaginar que teríamos refugiados brasileiros mundo afora, até poucos anos a gente não sonhava em passar por uma situação como essa”.
Segundo ele, os vândalos do 8 de janeiro, foram atraídos para “uma armadilha”, mas não disse de quem, certamente porque sabe que, no fundo, foram todos eles estimulados pelo ex-mandatário.
Ao analisar a denúncia que paira sobre ele, amparada por uma robusta investigação da Polícia Federal, atacou o ministro Alexandre de Moraes e o governo Lula.
Ele também garantiu que já tem no Parlamento os votos suficientes para aprovar o projeto de lei que prevê a anistia aos golpistas, assim como apoio para derrubar eventual veto presidencial.
O deputado federal Rodrigo Valadares (União-SE), presente ao ato, relator do projeto de lei que pede anistia a envolvidos no ato de 8 de janeiro, chegou a declarar que “a anistia está mais viva que nunca e vamos aprovar”.
Com a mobilização, ele e seu séquito pretendem sensibilizar o Congresso Nacional a aprovar um projeto de lei que prevê a anistia aos golpistas, embora o presidente do Senado Federal, senador Davi Alcolumbre, já afirmou que essa não é uma prioridade do parlamento, nem mesmo da sociedade brasileira, e o da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos), disse que só colocaria em votação após amplo consenso entre as lideranças da Casa, o que muito improvável.
A verdade é que o projeto em questão, articulado pelos bolsonaristas, tem um único objetivo: livrar o ex-mandatário da inelegibilidade que o atingiu por abuso do poder político no exercício da Presidência da República às vésperas das eleições de 2022, bem como das possíveis condenações que o esperam, especialmente na tentativa de golpe de Estado e formação de organização criminosa com essa finalidade – e também de matar Lula, seu vice, Alckmin, e o ministro Alexandre de Moraes.
O julgamento do acatamento da denúncia da PGR contra Bolsonaro e outros golpistas foi marcado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para o próximo dia 25 de março. Se for acatado, ele e os demais golpistas se tornam réus perante a Justiça.

Um dos motivos da inelegibilidade foi a realização de uma agenda de campanha no mesmo local deste domingo. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) considerou que houve abuso de poder na realização do ato na mesma hora e local das celebrações oficiais do Bicentenário da Independência em Copacabana em 7 de setembro de 2022. Antes, ele já tinha sido condenado, e ficou inelegível, por usar a estrutura de governo para uma reunião ilegal com embaixadores estrangeiros, fazendo propaganda eleitoral, atacando as urnas eletrônicas e as instituições brasileiras, como o TSE e o STF.
Quanto às centenas de golpistas investigados e muitos já condenados pelos atos de 8 de janeiro, mais uma vez, serão utilizados como bucha de canhão do ex-capitão, obcecado que está com a ideia de recuperar sua elegibilidade, o que é considerado praticamente impossível.
Não por outro motivo, Bolsonaro fez um ataque, não apenas ao STF, mas também à Procuradoria-Geral da República (PGR) que o acusou de participação direta na trama golpista após sua derrota para o presidente Lula na eleição presidencial de 2022, após fartas provas testemunhais e documentais apuradas pela Polícia Federal ao longo de uma investigação que assegurou ampla defesa aos acusados.
Por isso, a manifestação esvaziada de hoje, que pretende ser replicada na avenida Paulista, em São Paulo, no próximo dia 6 de abril, teve o objetivo central de criar um clima favorável ao projeto da anistia, para o qual Bolsonaro não poupou sequer o presidente americano Donald Trump de um pedido de apoio, como se fosse possível para um chefe de Estado estrangeiro interferir nas decisões soberanas da justiça brasileira.
Segundo pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), no ápice da manifestação em Copacabana, havia 18,3 mil pessoas. A estimativa da equipe do Monitor do Debate Político no Meio Digital refere-se ao público presente ao ato às 12h. A avaliação foi realizada com fotos aéreas analisadas com software de inteligência artificial.
Os presentes ao evento em Copacabana não pouparam ataques também ao presidente Lula e ao seu governo, embora as ações que estão tramitando no Supremo Tribunal Federal nada tenham a ver com o Executivo brasileiro.
Falaram, entre outros, na defesa de Bolsonaro e de sua anistia, o governador de São Paulo, Tarcísio Freitas, o bispo Silas Malafaia, que, também desta vez, financiou a organização do ato, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, o filho do ex-presidente, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), a vereadora de Fortaleza (CE) Priscila Costa (PL), vice-presidente do PL Mulher, e o deputado Nicholas Ferreira (PL-MG). Estavam presentes, também, os governadores Jorginho Melo (SC) e Mauro Mendes (MT).
Tarcísio defendeu: “É correto que a gente garanta a anistia daqueles inocentes que nada fizeram. E nós vamos lutar, e garantir que esse projeto seja pautado, seja aprovado, e quero ver quem vai ter coragem de se opor”. O governador paulista chamou de “injustiça” a prisão dos condenados pela quebradeira em Brasília, enquanto o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em suas palavras, representa “aqueles que assaltaram o Brasil e estão no poder”.
Já o do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), reforçou seu apoio ao nome de Jair Bolsonaro à Presidência. “Um jornalista me perguntou quem era meu candidato pra 2026 e eu falei: ‘o único candidato em 2026 será Jair Messias Bolsonaro”, declarou.
O centro do ataque de Flávio Bolsonaro foi o ministro Moraes, que, segundo ele, “não respeita as normas jurídicas como o direito à ampla defesa e contraditório”. Moraes tem pressa para concretizar uma “certa vingança”, afirmou.

Um grupo de bolsonaristas chegou a tentar incluir como mote do ato, convocado há um mês, o impeachment do presidente. Ao oficializar o chamamento, no entanto, Bolsonaro recalibrou a convocação para “fora Lula 2026” e “anistia já”.
A mobilização começou dias antes de Bolsonaro ser alvo de denúncia da PGR, razão pela qual, para Bolsonaro, essas manifestações, diante da gravidade das acusações, são encaradas como de “vida ou morte” para seu destino político. Mesmo condenado, o ex-presidente insiste em se apresentar como candidato, ignorando e combatendo qualquer movimento por parte de seus aliados para construir uma outra alternativa à direita.
Não é a primeira vez que Bolsonaro vai às ruas para atacar a Justiça e se defender de seus atos. Em abril do ano passado, convocou outra manifestação com o mote da defesa da “liberdade de expressão”, quando o alvo foi também o ministro Alexandre de Moraes, do STF, questionado em razão de suas justas determinações para retirada de conteúdo das redes sociais, divulgados por uma Comissão da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos.
MAC