
Ministro indicado por Bolsonaro liberou cultos religiosos em plena explosão da pandemia
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, rejeitou nesta segunda-feira (5) a concessão de uma liminar (decisão provisória) para suspender o decreto do governo de São Paulo que proíbe celebrações religiosas no estado diante do aumento expressivo dos casos e mortes pela Covid-19.
O ministro do Supremo enviou o caso ao plenário da Corte. Com as decisões conflitantes entre a sua decisão e a de Nunes Marques, que liberou os cultos, caberá ao plenário do Supremo dar a palavra final sobre a liberação, ou não, dos cultos e missas durante a pandemia. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, marcou o julgamento para esta quarta-feira (7).
PREFEITOS COBRARAM DO STF SE DEVIAM OBEDECER AO PLENÁRIO OU NUNES MARQUES
Diante da liberação, no sábado (3), de cultos religiosos pelo ministro Nunes Marques, o presidente da FNP (Frente Nacional de Prefeitos), Jonas Donizette, pediu ao presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, sobre qual decisão da Corte os prefeitos devem seguir. A monocrática de Nunes Marques ou a do colegiado que deu autonomia para Estados e municípios tomarem medidas contra aglomerações, inclusive cultos. Com a decisão de Gilmar Mendes, o plenário terá que se posicionar sobre o tema.
Segundo Donizette, o STF e o presidente Luiz Fux devem decidir qual decisão precisa ser seguida. “Essa flagrante contradição atrapalha o enfrentamento à pandemia em um país federado e de dimensões continentais como o nosso”, disse. A liberação de cultos e missas no país ocorre no momento mais crítico da pandemia, quando já se passa de 330 mil mortes por Covid-19, com média móvel acima de 3 mil óbitos por dia e falta de leitos de UTI em hospitais pelo país.
LANCELLOTTI: LIBERDADE RELIGIOSA NÃO É IR AO TEMPLO
O padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo, criticou a decisão do ministro Kassio Nunes Marques sobre os cultos e missas presenciais mesmo com o agravamento da pandemia. “É interessante que, na sentença, [o ministro] diz que isso é a essencialidade da liberdade religiosa. Que engano. A essencialidade da liberdade religiosa é o testemunho. Não é ir no templo”, disse ele. “Tem muita gente que vai no templo e não testemunha Jesus. Vai no templo para testemunhar o cofre. Vai no templo para testemunhar o lucro, não Jesus. Nós não precisamos ir no templo para testemunhar Jesus. Nós precisamos testemunhá-lo na vida”, acrescentou o padre durante a celebração de uma missa online, no domingo (4).
No dia 15 de abril de 2020, o Supremo havia negado uma liminar solicitada por Bolsonaro e concedido autonomia aos estados e municípios para determinarem o que pode e o que não pode funcionar durante a pandemia. A liminar de Nunes Marques desrespeita essa decisão e determina que Estados, municípios e o Distrito Federal não podem editar ou exigir o cumprimento de decretos que proíbam “completamente” celebrações religiosas presencias para evitar a disseminação da Covid-19.
AONDE VAMOS PARAR?, COBROU O DECANO
O ministro indicado por Jair Bolsonaro usou como argumento a liberdade religiosa no país e disse que essas instituições ajudam os fiéis no momento da pandemia. A decisão do ministro foi criticada pelo decano do STF, ministro Marco Aurélio Mello, que questionou se a associação que fez o pedido é parte legítima para questionar o cumprimento à Constituição. “O novato, pelo visto, tem expertise no tema. Pobre Supremo, pobre Judiciário. E atendeu a Associação de juristas evangélicos. Parte legítima para a ADPF? Aonde vamos parar? Tempos estranhos!”, afirmou o ministro ao jornal “Estadão”.
No sábado, minutos depois da autorização concedida pelo ministro, prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, anunciou em seu Twitter que cultos e missas continuariam proibidos na capital mineira. “Em Belo Horizonte, acompanhamos o plenário do Supremo Tribunal Federal. O que vale é o decreto do prefeito. Estão proibidos os cultos e missas presenciais”, afirmou.
Na noite de sábado (3), o advogado-geral da União, André Mendonça, entrou com ação no Supremo reclamando da resistência de Kalil em liberar as atividades presenciais religiosas na capital mineira. “Conforme postagem hoje às 18h48 em rede social, o sr. prefeito do município de Belo Horizonte informou que irá manter a proibição de cultos e missas presenciais, em claro descumprimento da decisão proferida nestes autos, cujo teor é de amplo conhecimento, considerada sua divulgação pela imprensa nacional”, escreveu.
AGU E MARQUES PRESSIONARAM PREFEITO DE BH
No domingo o ministro Nunes Marques intimou o prefeito de Belo Horizonte a cumprir a decisão liminar que permite a realização de celebrações religiosas, dando 24 horas para que o mandatário do município cumpra a decisão e esclareça “as providências tomadas, sob pena de responsabilização, inclusive no âmbito criminal, nos termos da lei”.
Jonas Donizette afirmou que “é importante que os prefeitos cumpram o que foi decidido pelo ministro Nunes Marques sobre o funcionamento de templos religiosos”, mas afirmou que uma decisão do plenário do STF deu aos estados e municípios a competência de decidir sobre aberturas e fechamentos das atividades. No domingo (4), após a intimação do prefeito, a prefeitura de Belo Horizonte informou que acataria a liminar mas apresentou sem seguida um recurso ao STF contra a decisão de liberar missas e cultos presenciais e pediu a “urgente concessão de contracautela” para suspender a liminar do ministro Nunes Marques.