É muito comovente o zelo do PT, e de sua órbita, com a Operação Lava Jato e sua suposta burla (dizem eles), no caso do ex-governador Alckmin (PSDB-SP), cujo processo foi transferido, por pedido da Procuradoria Geral da República (PGR), do STJ para a Justiça eleitoral.
Como se sabe, os lulistas estão muito preocupados em fortalecer a Operação Lava Jato…
No entanto, podemos tranquilizar esses neo-paladinos da Lava Jato. Como veremos, examinando os documentos do caso, não é possível ver que outra alternativa seria possível.
A propósito, é preciso ser um fascista (consciente ou inconsciente) para achar que, por Alckmin ser um adversário político, contra ele possa valer qualquer coisa, inclusive passar por cima da lei. Até na guerra, ponto extremo dos conflitos humanos, existem limites. Por isso é que alguns desses, que não reconheciam limite algum, acabaram por encontrá-lo numa forca, na cidade de Nuremberg.
O que serve para Alckmin, serve para Lula. Portanto, a questão é se – no que já foi apurado até agora – existem provas, tal como existiam e existem contra Lula, para enviar Alckmin à Força Tarefa da Lava Jato. Não estamos investigando nem julgando crimes políticos. Lula não foi preso porque nomeou Meirelles para o Banco Central, mas porque roubou o povo brasileiro. É para investigar essa espécie de crime comum, ainda que perpetrado contra toda a coletividade, que existe a Operação Lava Jato.
Passemos em revista os fatos.
Em depoimentos de três executivos da Odebrecht à Procuradoria Geral – Benedicto Barbosa da Silva Júnior, Carlos Armando Guedes Paschoal e Arnaldo Cumplido de Souza e Silva – aparece o nome de Alckmin.
Na petição do então procurador Rodrigo Janot, que deu origem ao inquérito sobre Alckmin, descreve ele que esses executivos “apontam que, nos anos de 2010 e 2014, o Grupo Odebrecht efetuou pagamentos, mediante recursos não contabilizados, destinados a Geraldo Alckmin, a pretexto de contribuição para a campanha ao Governo do Estado de São Paulo”.
O que dizem esses depoimentos?
Benedicto Barbosa da Silva Júnior (presidente da Odebrecht Infraestrutura) revelou que Alckmin recebeu, nas eleições de 2010, R$ 2 milhões da Odebrecht, e, nas eleições de 2014, R$ 8,3 milhões. Esses R$ 10,3 milhões eram, como disse Janot, “recursos não contabilizados” – ou seja, “caixa 2”, recursos não declarados à Justiça Eleitoral.
O depoimento de Carlos Armando Guedes Paschoal (diretor-superintendente da Odebrecht em São Paulo) confirmou o de Benedicto Barbosa Júnior, pois foi Paschoal quem entregou os R$ 2 milhões, em 2010, ao cunhado de Alckmin, Adhemar César Ribeiro.
Paschoal relatou que foi, com Aluízio Araújo – membro do conselho da Odebrecht, já falecido -, a uma reunião com Alckmin, em um escritório na Avenida 9 de Julho, São Paulo. Disse Paschoal:
“Na minha presença, foram faladas apenas banalidades, e com isso percebi que o tema já estava acertado entre os dois [Alckmin e Araújo]. Encerrando o encontro, Geraldo Alckmin determinou pessoalmente à sua secretária que me passasse os dados de contato de Adhemar Ribeiro, seu cunhado, o qual seria incumbido dos recebimentos. Os pagamentos foram realizados com recursos de caixa 2 e foram acertados com Adhemar Ribeiro, que definia os locais de entregas dos recebimentos. (…) Meus encontros com Adhemar ocorreram no período entre julho e outubro de 2010”.
Quanto a Arnaldo Cumplido de Souza e Silva, funcionário da Odebrecht que era diretor de contrato das obras da linha 6 do Metrô de São Paulo, o relato é que seu chefe na Construtora Norberto Odebrecht, Luiz Antônio Bueno Júnior, mandou que ele programasse pagamentos, “entre abril e outubro de 2014”, para Marcos Monteiro (codinome: “M&M” ou “Salsicha”), coordenador financeiro da campanha de Alckmin.
Disse Cumplido que esses pagamentos “não tinham relação de causa e efeito” com a obra do Metrô, mas os custos desse caixa dois eram “alocados” pela Odebrecht na contabilidade da obra. Entretanto, o dinheiro não saía da obra do Metrô: “Os pagamentos foram solicitados por mim à equipe de Hilberto Silva, ao que me recordo, à Maria Lúcia Tavares, que ficava responsável por providenciar a liberação dos recursos. Em momento algum eu me encontrei ou tratei sobre qualquer assunto com Marco Monteiro e/ou com Geraldo Alckmin”.
Ou seja, o dinheiro para Alckmin saía, realmente, do departamento de propinas, o agora famoso “setor de operações estruturadas” da Odebrecht, chefiado por Hilberto Silva e operacionalizado por Maria Lúcia Tavares.
Por se tratar de um governador de Estado – detentor de “foro privilegiado” – o então procurador geral, Rodrigo Janot, pediu, em março de 2017, que o processo de Alckmin fosse para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o que foi concedido, pelo ministro Fachin, do STF, em abril.
Em novembro, o vice-procurador geral da República Luciano Mariz Maia, que representa a PGR no STJ, pediu a instauração de um inquérito policial para investigar Alckmin.
Foi esse inquérito (nº 1.215/STJ) que, a pedido da Procuradoria Geral da República, foi enviado agora à Justiça eleitoral, depois que Alckmin saiu do governo – uma vez que ele não mais detém o privilégio de somente responder ao STJ.
Por que o inquérito foi enviado à Justiça eleitoral?
Apesar do dinheiro ter saído do departamento de propinas da Odebrecht, em nenhum dos depoimentos sobre o recebimento do dinheiro por Alckmin, existe menção a atos que teria praticado em troca dele, nem a PF conseguiu evidenciar, até agora, nenhum fato nesse sentido.
Um dos corifeus lulistas escreveu que não se dá dinheiro se não for em retribuição de alguma coisa – o que é uma boa explicação de por que Lula aceitou um triplex, um sítio, e sabe-se lá o que mais, da OAS ou da Odebrecht.
No entanto, existe, sim, a situação em que dinheiro é dado, não como propina oriunda de um favorecimento anterior, mas na perspectiva de um favorecimento posterior.
Exatamente isso é o que aparece no depoimento de Benedicto Barbosa da Silva Júnior – por alcunha, o “B.J.” – em relação ao dinheiro que Alckmin, indevidamente, recebeu.
Perguntado sobre as razões da passagem, pela Odebrecht, desse dinheiro a Alckmin, “B.J.” respondeu que era devido ao candidato ser um “incentivador das parcerias público-privadas, com objetivo de promover investimentos na área de infraestrutura, o que era de interesse da companhia. Nosso objetivo com doações ao candidato Geraldo Alckmin era manter a companhia bem posicionada em termos de relacionamento, comparativamente com as duas outras estrelas do PSDB – Aécio Neves e José Serra. Também objetivávamos manutenção regular e o andamento normal dos contratos em execução no Estado de São Paulo”.
Mais adiante, ao se referir especificamente à campanha de 2014, o executivo da Odebrecht explicita o mesmo objetivo:
“O propósito da aprovação desta doação era a proeminência de Geraldo Alckmin no cenário nacional, a sua liderança e de seu partido no Estado de São Paulo. Também era garantir interlocução qualificada na discussão dos projetos vislumbrados como participação na nova rodada de concessão rodoviária no Estado, novas participações em projetos com parceria da Sabesp e potenciais novas concessões de trens regionais. Em todos estes segmentos no ano 2015 [ou seja, depois das eleições] tivemos oportunidade de discutir antecipadamente com o governo estes projetos, modelos de contratação, fontes de financiamento etc.”
Apresenta também importância o motivo inicial pelo qual a Odebrecht se interessou por Alckmin:
“Na gestão de Mario Covas, o então vice-governador Geraldo Alckmin foi nomeado presidente do Programa Estadual de Desestatização (PED), que previa a privatização de importantes estatais e concessão de trechos de rodovias e ferrovias à iniciativa privada, o que atendia os interesses econômicos da companhia”.
Em suma, para usar a linguagem corrente, o principal negócio da Odebrecht tornou-se o de roubar o patrimônio público, a propriedade do povo – daí seu interesse por Alckmin.
O dinheiro passado a Alckmin era, portanto, uma espécie de propina antecipada – foi passada devido a uma expectativa futura. O problema é que, exatamente por isso, ela constitui um crime apenas eleitoral – ou seja, uso de “caixa 2”, de recursos ocultos, não declarados, na campanha eleitoral.
Certamente, numa propina, o fato de ser passada via “caixa 2” acrescenta um crime eleitoral a outros crimes, se estes últimos forem provados.
Fora isso, se a propina é passada via “caixa 2” ou via “caixa 1”, é quase completamente destituído de importância. Afinal, a inovação do PT, no submundo político do país, foi, exatamente, a de receber propinas via “caixa 1” – ou seja, via contribuições oficiais ao partido ou à suas campanhas eleitorais. Nesse caso, não houve crime eleitoral, mas corrupção passiva e lavagem.
No caso de Alckmin, o que se conseguiu provar, até agora, é que ele usou recursos não declarados – ou seja, “caixa 2” – nas campanhas eleitorais de 2010 e 2014, o que significa uma pena máxima de cadeia de cinco anos, ao invés dos 12 anos que o artigo 317 do Código Penal reserva, como máximo, aos crimes de corrupção passiva.
Diz o vice-procurador geral Luciano Maia, em resposta aos seus colegas da Força Tarefa da Lava Jato em São Paulo, que desde o início a investigação sobre Alckmin era sobre crimes eleitorais – na medida em que não se conseguiram provas para mais do que “caixa 2”.
Acrescenta ele que jamais foi informado sobre alguma investigação a respeito de Alckmin, além do inquérito no STJ – o que é verdade, até porque não poderia existir outra investigação, enquanto Alckmin fosse governador.
Mas, diz ele, por fim, que o envio do inquérito à Justiça eleitoral não impede que a Força Tarefa da Lava Jato investigue Alckmin.
O que também é verdade.
Portanto, a tentativa de usar o caso Alckmin para passar que Lula está sendo perseguido – enquanto o ex-governador paulista estaria sendo “protegido” ou “acobertado” -, mal esconde seu verdadeiro objetivo: o que se pretende não é investigar Alckmin, mas garantir a impunidade de Lula.
CARLOS LOPES
Existem provas concretas contra esse bandido do PSDB. Ladrão de merenda.