“Nós temos indícios do cometimento de crime contra a saúde pública e de crime contra a vida. Agora, os responsáveis, nós vamos investigar”, entende o senador Omar Aziz (PSD-AM)
Em entrevista ao jornal Folha de Minas, veiculada neste domingo (6), o presidente da CPI da Covid-19, no Senado, Omar Aziz (PSD-AM) diz que “quem é o ministro da Saúde é o Bolsonaro”. Para ele, as investigações da comissão mostram a falta de autonomia do ministro na pasta.
Tudo indica, salvo melhor juízo, que a pré-condição tácita para assumir é se subordinar ao presidente da República na gestão prática da pandemia.
Isso fica evidente, pois o ministro orienta a ação, segundo os protocolos mais básicos — distanciamento social, uso de álcool gel e máscara —, e o presidente da República faz e fala o oposto. Desde o início da pandemia, em março de 2020, Bolsonaro age e fala como sabotador desses protocolos.
O atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga vai depor novamente na CPI, nesta terça-feira (8), e um dos aspectos que ele vai ter de esclarecer, com fortíssimos indícios de verossimilhança, é o de que não tem nenhuma autonomia à frente do Ministério.
O ministro, por exemplo, indicou a médica infectologista Luana Araújo, mas a profissional não foi efetivada à frente da Secretaria Extraordinária de Combate à Covid-19. Ela chegou a trabalhar por cerca de 10 dias no Ministério, mas não nomeada. Foi dispensada sem nenhuma explicação, vetada por Bolsonaro.
MUITAS EXPECTATIVAS
Diante disso, Aziz manifestou que tem muitas expectativas em relação ao novo depoimento que Queiroga vai prestar à Comissão na terça-feira.
O senador disse acreditar que vai ser boa oportunidade para o representante do governo esclarecer se ele, realmente, tem autonomia para comandar a pasta no enfrentamento do novo coronavírus, como disse na primeira vez em que foi inquirido pelo colegiado, no início de maio.
À medida que as investigações avançam, segundo Omar Aziz, crescem as evidências de que o Ministério da Saúde nunca teve autonomia para agir no combate à crise sanitária. Denúncias mostram, com vídeo e tudo, que há um “gabinete paralelo”, formado por médicos e assessores do Palácio do Planalto, que é responsável por orientar as ações federais contra a Covid-19, seguindo estritamente as ordens de Bolsonaro.
A recomendação, nesse cenário, é a distribuição de medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença. Essa orientação ganhou mais prioridade do que a aquisição de vacinas.
Na entrevista ao jornal, Aziz falou dos impactos da CPI, teceu comentários sobre o ministro Queiroga e o chamado “gabinete paralelo”, sobre provas de crimes cometidos por Bolsonaro e sobre a imparcialidade dele na condução das investigações.
IMPACTOS DA CPI
“Com certeza. Hoje, com a CPI mostrando ao Brasil que o governo brasileiro não quis comprar vacina, eles se apressam na compra da vacina. Mas, infelizmente, já são quase 500 mil mortos. Isso poderia ter sido evitado, principalmente se nós tivéssemos comprado 130 milhões de doses no ano passado; eram 60 milhões da vacina do Butantan e 70 milhões da Pfizer”, pontificou Aziz.
“Está provado que o ministro da Saúde à época, Eduardo Pazuello, e o presidente não tiveram nenhum interesse na compra dessas vacinas. Preferiram apostar na política sanitária errada, que é a imunidade de rebanho. Isso custou às vidas de muitas pessoas que acreditaram que [a Covid-19] era uma gripezinha, que o cara que é atleta não morre.”
SOBRE QUEIROGA
“A doutora Luana [Araújo, infectologista que teve vetada pelo Planalto a nomeação como secretária de enfrentamento ao novo coronavírus do Ministério da Saúde], que esteve lá [na CPI], disse para mim: ‘Senador, o ministro Marcelo Queiroga é uma ótima pessoa, um ótimo profissional, trate ele com respeito, ele não merece isso’”.
“Aí eu fiquei até assustado porque ele não pode nomeá-la, e ela dá um depoimento desse. Isso é legal, mostra também que ele tenta, por um lado, fazer as coisas certas, como médico. Ela fez um depoimento pessoal sobre o Queiroga, na forma como ela falou, é uma decência muito grande, porque ela foi preterida. Ela podia falar mal do Queiroga, mas ela não fez isso. O problema é que o Queiroga, ele rema para um lado, e a cúpula do governo rema para outro. [Como médico], isso é ruim para ele. É simples assim. Quem é o ministro da Saúde é o Bolsonaro.”
“GABINETE PARALELO”
“Está provado que tem um ‘gabinete paralelo’. Até tem um vídeo agora, do Arthur [Weintraub, convocado para depor na CPI] com outro cara, falando ‘qual é a estratégia’ [em uma ‘live’, Arthur, ex-assessor da Presidência, dá detalhes de como um grupo de 300 pessoas aconselhou Bolsonaro em temas relacionados à pandemia”, disse Aziz.
“O presidente, o governador, o prefeito, eles têm que se curvar à ciência. Eu acho que a doutora Nise deve ser uma boa oncologista, mas de política pública sanitária, de política de infectologia ela não entende nada. A outra lá [Luana Araújo], você viu a diferença do depoimento. Simples assim. Eu não preciso falar nada, é só ver os vídeos.”
“Todas as vezes em que o presidente falou sobre Covid foi em tom jocoso, desrespeitoso às mortes, aos familiares e a milhões de brasileiros. Não precisa eu falar, ele próprio fala. E esse é o desespero dele. Toda quinta-feira ele me agride. Ele, com muito ódio, teve que falar na vacina”, destacou.
PROVA DOS CRIMES
“Nós temos indícios do cometimento de crime contra a saúde pública e de crime contra a vida. Agora, os responsáveis, nós vamos investigar. A questão política é outra coisa. Eu acho que, juridicamente, cada um tem que fazer o seu papel, ou vai ficar para a história como alguém que foi omisso no momento em que o Brasil vive”, chamou atenção.
“Então cada um sabe o que tem que fazer na sua história, tanto o procurador-geral quanto outras pessoas que tenham responsabilidade sobre isso. A política sanitária que o governo adotou, de ‘tratamento precoce’ e ‘imunidade de rebanho’, é crime. Até a omissão relacionada à demora para a compra de vacina também é crime, de prevaricar [crime cometido quando funcionário público, indevidamente, retarda ou deixa de praticar ato de ofício, ou o pratica contra disposição legal expressa, visando a satisfazer interesse pessoal]”.
IMPARCIALIDADE À FRENTE DAS INVESTIGAÇÕES
“A minha resposta ao presidente é para ele não perder tempo comigo e comprar vacinas. Só isso, mais nada. Eu não falo dele, da família dele. Você nunca ouviu eu dizer que o presidente é um genocida. Nunca ouviu eu dizer que ele é um assassino, eu nunca disse isso”, sentenciou.
“E nem sobre a família dele. A única coisa que eu respondo é: ‘Presidente, eu sou muito pequeno. Em vez de se preocupar comigo, perca seu tempo comprando vacina’. Eu não faço pré-julgamento de ninguém, e não quero ser pré-julgado”, concluiu o presidente da CPI.
M. V.