ELIAS JABBOUR (*)
No dia 1º de julho de 1921 foi fundado o Partido Comunista da China (PCCh). Antes disso, a primeira versão do “Manifesto Comunista” de Marx e Engels havia sido traduzido ao mandarim em 1920. No ano de 1917 a Revolução Russa abria as portas do mundo a uma nova época histórica que marca a trajetória da humanidade até os dias de hoje com ressonância impressionante sobre a China. A grande questão que muitos políticos e intelectuais tentam responder é como uma força política com apenas 28 anos de idade em 1949 pode não somente alcançar o poder político e mantê-lo, mas principalmente como esta força pode ter transformado não somente profundamente seu país, mas também o mundo?
O presidente chinês Xi Jinping em discurso alusivo ao centenário de fundação do PCCh nos entrega uma explicação simples, sem ser simplista: “Temos de continuar a adaptar o marxismo com a realidade chinesa. O marxismo é o pensamento-guia fundamental do nosso Partido e do nosso país. Ele é a alma e a bandeira do PCCh. É por aderir aos princípios básicos do marxismo, buscar a verdade nos fatos e partir das condições chinesas que o PCCh conseguiu enxergar as principais tendências dos tempos, tomar a iniciativa histórica e realizar árduas buscas, promovendo sem cessar a adaptação do marxismo ao contexto chinês e às necessidades do nosso tempo e orientando o povo chinês no avanço da nossa grande revolução social. Por que o PCCh é capaz? Por que o socialismo com características chinesas funciona? Porque, em última análise, o marxismo funciona”.
Esse é a grande razão pelas quais o PCCh não somente alcançou rapidamente o poder nacional, mas também tem sido capaz de passar por grandes provas da história e de conjunturas desfavoráveis. Como disse Xi Jinping, “o marxismo funciona”. E só pode funcionar onde se desenvolve em plena consonância com a realidade particular de cada país. Na China, os comunistas criaram sua estratégia própria de tomada de poder baseada no cerco das cidades pelo campo tendo o marxismo como base fundamental. O marxismo venceu na China por ter se tornado um corpo científico chinês. Desde a década de 1930, o PCCh tem demonstrado capacidade impressionante de adaptação do marxismo tanto à realidade chinesa quanto às tarefas que o processo de revolução e construção tem imposto ao país.
O conceito-força de “socialismo com características chinesas” é um desdobramento do socialismo científico de Marx, Engels e Lênin, o qual tem sido enriquecido por cada geração dirigente do país. As “características chinesas” nos impele a observar o nível de desenvolvimento das forças produtivas do país assim como a integração do marxismo com uma imensa herança filosófica desenvolvida ao longo dos 5000 anos de civilização chinesa.
O desafio atual reside no desenvolvimento do “marxismo chinês” à luz do “pensamento de Xi Jinping sobre o socialismo com características chinesas na nova era”. Essa “nova era” é caracterizada pelo aumento dos desafios impostos pela conjuntura internacional ao projeto chinês, assim como as novas contradições surgidas à luz de décadas de desenvolvimento rápido e acelerado das forças produtivas no país. Um exemplo deste desenvolvimento teórico está na tarefa de construção de um mundo com futuro compartilhado em contraposição ao imperialismo e ao hegemonismo.
Nas palavras de Xi Jinping: “Temos de continuar a promover a criação de uma comunidade de futuro compartilhado para a humanidade. Paz, concórdia e harmonia são ideias que a nação chinesa vem perseguindo e desenvolvendo por mais de cinco milênios. E em seus genes, a nação chinesa não carrega traços agressivos ou hegemônicos. O PCCh se preocupa com o futuro da humanidade e deseja avançar de mãos dadas com todas as forças progressistas do mundo. A China se dedica sempre a promover a paz mundial, contribuir para o desenvolvimento global e salvaguardar a ordem internacional.”
Outra recente elaboração marxista à luz da realidade chinesa é a “filosofia do desenvolvimento centrado no povo”. Na história do capitalismo, a ciência econômica concebeu uma série de propostas de desenvolvimento econômico que podia ser “liderada pelo Estado” ou “guiada pelo mercado”. As primeiras experiências socialistas replicaram muito dos modelos de desenvolvimento guiados pelo Estado, o que em si não fora um problema, mas a moldura de “Estado x mercado” limita muito a capacidade de observar não somente como se dá o processo de desenvolvimento, mas também a quem interessa este ou aquele modelo de desenvolvimento.
O “desenvolvimento centrado no povo” é uma filosofia sem apriorismos, portanto fiel ao pensamento de Mao Zedong baseado na “busca da verdade nos fatos” e transformação da “prática no único critério para se aferir a verdade”. A verdade, neste caso, é se o desenvolvimento é centrado em resultados práticos e positivos na vida do povo. Trata-se de uma filosofia de desenvolvimento que se constrói na prática e é assentada em poderosas noções-chave criadas ao longo do tempo pela governança comunista chinesa. Referimo-nos às noções de “servir o povo” e “o povo em primeiro lugar”.
O marxismo na China deixa de ser uma abstração para ser uma força concreta que dá direção a um poder político de novo tipo. Colocar o povo em primeiro lugar é um princípio chave que une o pensamento clássico chinês ao marxismo.
O presidente Xi Jinping sintetiza este princípio da seguinte forma: “Como dizia um antigo filósofo, “aquele que compartilha os interesses com o povo de todo o mundo será apoiado por todo o mundo; aquele que monopoliza os interesses para si mesmo terá pessoas de todo o mundo conspirando contra ele.” O Estatuto do nosso Partido estipula que o nosso Partido não tem outros interesses particulares e em todo momento antepõe a tudo os interesses das massas. Trata-se de uma característica óbvia que distingue o PCCh, partido marxista, dos demais partidos políticos.”
Um poderoso corpo científico marxista construído à luz da prática sintetizada é um grande ponto a se destacar em mais esse aniversário de fundação do PCCh.
(*) Professor Associado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Escrito em colaboração com o Grupo de Mídia da China
