Magistrados e advogados criticaram as acusações que o ministro da Economia, Paulo Guedes, fez contra o Poder Judiciário de que “há uma indústria de precatórios no Brasil”.
“O aumento nas emissões de precatórios é natural. Se o governo não cumpre a Lei, gera um monte de precatório novo”, afirma o presidente da comissão especial de precatórios do Conselho Federal da OAB, Eduardo Gouvêa. “As teses começam a ser confirmadas e o gargalo aumenta”.
Para o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Eduardo André Brandão, “o aumento no número de precatórios deve ser atribuído à eficiência do Judiciário e, no caso de precatórios previdenciários, há impacto também pela demora do INSS em analisar pedidos”.
O governo Bolsonaro tentou dar um calote na dívida pública judicial para financiar com os recursos dos precatórios um tal programa “Renda Cidadã”, mas desistiu da ideia após um bombardeio de críticas, entre elas, um parecer da OAB que classificou a proposta do governo como “inconstitucional”.
Após as criticas, Guedes disse que “jamais” o governo iria usar o dinheiro destinado ao pagamento de precatórios para bancar o “Renda Brasil” e atacou o Judiciário ao sugerir que nele haveria uma eventual venda dos créditos.
Guedes esteve ao lado de Bolsonaro e líderes partidários quando foi anunciado, na segunda-feira (28/9), o “novo” programa que iria substituir o Bolsa Família e suas “fontes” de financiamento, mas depois tentou se esquivar da proposta, dizendo que usar os precatórios não foi proposta do Ministério. Mas, membros do próprio governo afirmam que a ideia foi de Guedes. E, segundo o senador Márcio Bittar (MDB-AC), relator do Orçamento de 2021, a proposta jamais teria sido apresentada sem o aval de Bolsonaro e seu ministro. Sobre o assalto ao Fundeb, destinado à educação infantil, a segunda fonte de “financiamento”, o ministro não se manifestou.
Segundo Guedes, “os precatórios estão chegando a R$ 54 bilhões no ano que vem. É um crescimento galopante, explosivo. Estamos examinando com o foco no controle das despesas”. Para Guedes, “despesas” só com os bancos.
Os juízes e advogados concordam que há um aumento de decisões judiciais sobre este tipo de demanda nos tribunais, no entanto, esse crescimento “explosivo” se deve à eficiência dos tribunais com mais julgamentos finalizados e ao processo eletrônico, e não à eventual venda dos créditos.
Segundo o relatório “Justiça em Números” de 2020, o Judiciário encerrou o ano de 2019 com estoque semelhante ao de 2015, com 77,1 milhões de processos em tramitação. Em relação a 2018, foi uma redução de aproximadamente 1,5 milhão de casos em trâmite, a maior queda desde 2009, quando começou a série do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Além disso, a produtividade média dos juízes foi a maior dos últimos 11 anos.
A partir de 2004, com a reforma do Judiciário, foi implementado um sistema de precedentes no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF).
“Não conheço nenhuma indústria de precatórios”, destacou o professor de direito econômico na USP, Heleno Taveira Torres. Para o especialista tributário, se houve um aumento isso não se deve a uma ação coordenada de juízes que querem prejudicar a União. “Se isso acontece é porque a União teve derrotas no judiciário que levaram aos precatórios”, declarou.
A Advocacia-Geral da União (AGU) admite que o aumento em 2021 em relação a 2020 no valor dos precatórios se deve a mais ações judiciais envolvendo o INSS. As ações resultam da própria reforma da Previdência do governo que tirou direitos previdenciários e assistenciais de aposentados e pensionistas.
Com informações do Valor Econômico