Para o presidente da CPI da Covid-19 no Senado, Omar Aziz (PSD-AM), a gestão Bolsonaro foi negligente desde o primeiro momento no combate à pandemia. O caos instalado na saúde e no setor sanitário foi resultado da ação do governo
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), no Senado, que investiga as ações, omissões e inações do governo federal, sob a liderança do presidente Jair Bolsonaro, entra na próxima terça-feira (18), na terceira semana de trabalhos, com reuniões para debater e aprovar requerimentos e a oitivas de testemunhas e investigados. E já é possível chegar à algumas conclusões fundamentais.
O presidente da CPI da Covid-19, senador Omar Aziz (PSD-AM), apontou, em entrevista à Folha de S.Paulo, que já está provado que o governo Bolsonaro negligenciou inicialmente a compra de vacinas.
“Não houve nenhum interesse na compra da vacina no primeiro momento. Se apostou muito na imunização de rebanho, kit cloroquina, ivermectina”, disse ele, afirmando que, pelas informações que foram colhidas, “poderíamos ter tido vacina bem antes do planejado e uma quantidade bastante grande”.
Segundo ele, a carta endereçada pela Pfizer não foi só ao presidente, mas para muita gente do alto escalão do governo. “A gente não entende por que nenhum deles se prestou a dar uma ligada, mandar alguém procurar saber a oferta das vacinas. Isso foi em agosto, [então veio] setembro, outubro, novembro. Se tivéssemos feito isso em agosto, em dezembro nós teríamos começado a vacinar as pessoas”, destacou.
ERROS PRIMÁRIOS
Para o presidente da CPI, a maior parte dos erros cometidos por Bolsonaro são consequência do mau aconselhamento, embora ele não possa usar esse fato para se eximir da culpa e responsabilidade. “O governo errou desde o primeiro momento. Não apostou no isolamento, não apostou na máscara, no álcool em gel, na vacina, uma série de coisas que poderiam ter ajudado a salvar pessoas. E continuam apostando na cloroquina”, disse Aziz.
Por fim, Aziz criticou a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, de conceder o habeas corpus para permitir que o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, se cale durante o depoimento, já que o considera peça importante.
“Acho que o ex-ministro Pazuello é a pessoa que pode nos dar mais informações, porque começou com ele. Veja bem, quando a Pfizer procura o Brasil, ele foi uma das pessoas que recebeu a carta. Por que não respondeu? Deram ordem para ele não responder? É isso que queremos saber. Não era política do Ministério da Saúde adquirir vacina?”, questionou.
AGENDA DA CPI NESTA SEMANA
A comissão vai ter agenda bastante tensa esta semana. Nesta terceira semana de trabalhos, a CPI da Pandemia ouve dois ex-ministros do governo Jair Bolsonaro: Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Eduardo Pazuello (Saúde). Os dois são considerados peças-chave para esclarecer a condução do governo federal no enfrentamento da crise sanitária da Covid-19.
Agendada para quarta-feira (19), às 9h, a audiência de Pazuello é a mais esperada. Dos quatro ministros que comandaram o Ministério da Saúde durante a pandemia, Pazuello foi o que ficou mais tempo no cargo.
O general do Exército e especialista em logística assumiu interinamente o Ministério em 16 de maio de 2020, após a saída de Nelson Teich. Ele foi efetivado no cargo em 16 de setembro e exonerado no dia 23 de março de 2021.
Estava no comando da pasta quando a Pfizer fez oferta de 70 milhões de doses de imunizantes ao Brasil, segundo o presidente regional da empresa na América latina, Carlos Murillo. Em 11 de fevereiro deste ano, durante sessão no plenário do Senado, Pazuello afirmou que eram somente 6 milhões ofertadas pela Pfizer.
Na quinta-feira (20), a CPI vai ouvir o depoimento de Mayra Pinheiro, secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde. Ela deverá explicar aos senadores a defesa de medicamentos antivirais durante a crise de oxigênio em Manaus (AM) no início do ano.
A convocação atende a pedidos feitos pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Renan Calheiros (MDB-AL) e Humberto Costa (PT-PE).
PAZUELLO COMPARECE À CPI BLINDADO POR HABEAS CORPUS
Além de o depoimento mais aguardado, o de Pazuello, esse estará revestido de controvérsias, pois é a figura que tem mais a esclarecer à CPI. Mas o ex-ministro vai comparecer à oitiva blindado por habeas corpus, concedido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), na última quinta-feira (13).
O vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou na última sexta-feira (14) que recebe com “serenidade e tranquilidade” a decisão do STF.
Com a decisão, o general, que foi titular da pasta da Saúde por 9 meses, terá de comparecer à CPI, mas poderá ficar em silêncio e não responder às perguntas dos senadores em seu depoimento. A liminar do STF também garante que Pazuello não será preso na comissão.
Há na concessão do HC ao ex-ministro bolsonarista pelo menos duas contradições flagrantes. A primeira, são questionamentos óbvios: o que tanto teme Pazuello? Por que procurou a proteção do HC/STF? Há algo a esconder? Por quê? O silêncio do ex-ministro vai ser “ensurdecedor”. Vai ser uma prova de culpa. Não tem para onde correr. A segunda, é o fato de um bolsonarista recorrer a instrumento — o habeas corpus — do Estado de Direito.
Se as manifestações golpistas patrocinadas pelo presidente da República e defendidas pelo staff presidencial vingasse, essas prorrogativas do Estado de Direito Democrático seriam abolidas.
Aqui, observa-se uma terceira contradição: assim não haveria CPI, pois o Congresso seria fechado e o Supremo também e o ex-ministro general não precisaria de habeas corpus e nem de comparecer ao Senado e seus supostos crimes não poderiam ser esclarecidos e ficariam para as “calendas gregas” como estão até hoje muitos da ditadura (1964-1985).
M. V.