“Incitar a violência e o ódio é proibido na lei internacional”, advertiu nesta sexta-feira o porta-voz do Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas (ONU) para Direitos Humanos, Rupert Colville, condenando as repetidas agressões de Bolsonaro a jornalistas.
De acordo com o porta-voz da ONU, “o presidente Bolsonaro e todas as pessoas em posição de responsabilidade precisam estar atentos ao fato de que as palavras deles podem levar a ações de terceiros que podem machucar as pessoas fisicamente, assim como prejudicá-las em termos de sua carreira profissional”.
Ao ser questionado no último domingo (23) por um repórter sobre os R$ 89 mil depositados por Fabrício Queiroz na conta de sua mulher, Michele Bolsonaro, o presidente verberou ao jornalista que estava com “vontade de encher sua boca de porrada”. A agressão ocorreu durante visita à Catedral de Brasília.
Apenas três dias depois, na quarta-feira (26), em Ipatinga, Minas Gerais, Bolsonaro voltou a se descontrolar e a chamar de “otário” um repórter que queria saber sobre os R$ 89 mil.
O fato é que os jornalistas têm direito de fazer perguntas, assinalou o representante da ONU, assim como liberdade de expressão e opinião, e desempenham uma função vital para o conjunto da sociedade. No entanto, esclareceu Colville, mesmo que seja legítimo criticar o trabalho da imprensa, isso deve ser feito dentro de certos limites. “No caso de falar em violência, sugerir ação violenta contra jornalistas, isso é outra coisa”, condenou, para quem é preciso que pessoas como “Bolsonaro tenham cuidado com o que falam”.
“GRAVES VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS”
Dados públicos da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apontam que, desde a posse de Bolsonaro o Brasil foi alvo de mais de 45 críticas públicas, petições e recomendações sobre violência policial, atuação de milícias, ataques a minorias e retrocessos democráticos, além do relatório especial em fase de finalização.
Às vésperas da apresentação do relatório – e diante da contundência das denúncias sobre “deterioração, retrocessos e graves violações de direitos humanos” – o Itamaraty articulou junto às demais gestões pró-Estados Unidos pela destituição do brasileiro Paulo Abrão – que se destacou ao presidir a Comissão de Anistia do Brasil -, logo depois dele ter sido reeleito por unanimidade como secretário-executivo da Comissão.
O veto a Abrão, anunciado pelo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, foi denunciado como um “golpe” e uma absurda interferência na autonomia da comissão. Ao agredir o estatuto da Comissão, alertam especialistas, põe em xeque a fiscalização de torturas, mortes políticas, ataques racistas e abusos contra minorias em mais de 30 países.
“No justo momento em que a comissão ganha relevância, publica uma série de informes sobre países cumprindo um papel bastante crítico sobre governos de diferentes vieses ideológicos que ficaram bastante descontentes com as críticas, acontece essa não-renovação de última hora. Obviamente entendemos que há intenção política por detrás, seja de Estados, seja pelo secretário-geral, basta ver o contexto”, declarou a advogada chilena Antonia Urrejola, vice-presidente da CIDH.
Para 87 entidades brasileiras, a decisão de Almagro revela “ausência de transparência, abalo da confiança, da reputação e da estabilidade do sistema”.
O relatório traz denúncias que incomodam o Palácio do Planalto – e que ganharam ainda mais dimensão recentemente – como os crimes das milícias, a impunidade policial e os reiterados ataques à imprensa.