CARLOS LOPES
[O texto abaixo foi completamente reformulado para a presente edição, com base em materiais que não estavam disponíveis, para o autor, na época em que redigiu o resumo original. Observamos que o nome de Oswaldo Cruz está, em várias passagens, escrito com “v” (Osvaldo), o que é uma contingência da literatura biográfica da sua época (C.L.).]
As últimas vontades de um homem, quando é possível formulá-las, são, de modo geral, um retrato ou uma expressão mais pura de sua alma.
Oswaldo Cruz elaborou-as da seguinte maneira:
Desejo com sinceridade que se não cerque a minha morte dos atavios convencionais com que a sociedade revestiu o ato da nossa retirada do cenário da vida. Pelo respeito que voto ao pensar alheio não quero capitular de ridículo esses atos: julgo-os para mim dispensáveis e espero que a família, que tanto quero, se conforme com esses inofensivos desejos que nasceram da maneira pela qual encaro a morte, fenômeno fisiológico naturalíssimo do qual nada escapa. Tão geral, tão normal, tão banal é que julgo absolutamente dispensável de frisá-la com cerimônias especiais. Por isso desejaria que se poupasse aos meus a cena de vestimenta do corpo que bem pode ser envolvido em simples lençol. Nada de convites ou comunicações para enterro, nem missa de sétimo dia. Nem luto tão pouco. Esse traz-se no coração e não nas roupas. Peço encarecidamente aos meus que não prolonguem o natural sentimento que trará minha morte. Que se divirtam, que passeiem, que ajudem o tempo na benfazeja obra de fazer esquecer. Não há vantagem alguma de amargurar com lágrimas prolongadas os tão curtos dias de nossa existência. Portanto, que não usem roupas negras em nosso clima; que procurem diversões, teatros, festas, viagens, a fim de que desfaçam essa pequena nuvem que veio empanar a normalidade do viver todos os dias. É preciso que nos conformemos com os ditames da natureza (cit. in Clementino Fraga, Vida e Obra de Oswaldo Cruz, 2ª ed., FIOCRUZ, 2005, Rio, p. 9).
E, assim, um homem que já conquistara a imortalidade, saiu da vida física.
Mas o que significou essa vida imensa?
Em meio aos entraves que a República Velha colocou para o progresso nacional, não se gestava apenas a crise, mas a sua resolução, e se forjavam os homens que a empreenderiam, assim como os homens cuja obra serviria – juntamente com a daqueles que os precederam – como modelo para o futuro.
É como podemos ver hoje a figura gigantesca de Oswaldo Cruz, falecido, com apenas 44 anos, em 1917, mas que seria o exemplo de médico, de cientista e de homem voltado para a realidade nacional e para o desenvolvimento de uma ciência e tecnologia que pudessem dar soluções aos problemas do nosso povo.
Oswaldo Cruz teve, declaradamente, um único ídolo e modelo em sua vida. Não se tratou de nenhuma das grandes personalidades consagradas pelos livros de medicina, mas de seu pai, Bento Gonçalves Cruz, provavelmente o primeiro médico brasileiro que se dedicou, quase exclusivamente, ao atendimento de operários e suas famílias. Essa profunda identificação com o pai formou no filho uma identidade própria: Oswaldo Cruz substituiu o pai – falecido no mesmo ano em que se formou médico – na clínica da fábrica de tecidos Corcovado; mesmo depois, quando já era Diretor-Geral de Saúde Pública e diretor do Instituto de Manguinhos, continuou esse trabalho, indo à clínica três vezes por semana.
Os valores a que sempre foi fiel – modéstia, disciplina, rigor, coerência, integridade, e, não menos importante, uma notória afabilidade para com as pessoas –, segundo seu próprio testemunho, e dos que conheceram os dois, eram os mesmos de seu pai, que não queria ser outra coisa senão um “médico de pobres”. Tanto um quanto outro, aliás, não tinham origem, ao contrário da maioria dos médicos brasileiros da época, nas camadas privilegiadas da população. Na faculdade, onde foi um aluno mediano, era dos poucos que não tinha “protetores” entre os então considerados luminares da medicina.
No entanto, um deles, Francisco de Castro, que tinha sido amigo de seu pai, conseguiu notá-lo e recomendá-lo para uma bolsa de estudos no Instituto Pasteur, em Paris. Nessa época, 1896, esse instituto, fundado havia apenas oito anos, não tinha a fama de hoje: era recente o conflito de Pasteur com a Academia de Medicina francesa, em que essas autoridades tinham tentado desmoralizar sua concepção científica dos micróbios como formas de vida que se reproduziam. Para os acadêmicos, os micróbios apareciam por geração espontânea.
Oswaldo Cruz conseguiu estudar em Paris graças à colaboração financeira de seu sogro. Quando voltou ao Rio, em 1900, a cidade estava assolada pela doença: epidemias de febre amarela, varíola e peste bubônica se juntavam à tuberculose, sífilis e às disenterias, ceifando vidas diariamente. Pode-se imaginar, pela situação da capital da República, qual deveria ser a situação no resto do país.
Com exceções que se contavam nos dedos – mas existiam – os médicos da época da oligarquia se pareciam mais com bacharéis, intelectuais de salão que misturavam francês com latim e um pouco de português, do que com cientistas interessados em debelar as mazelas que afligiam a população.
No entanto, quando devido à ineficiência dos supostos especialistas da época, o governo Rodrigues Alves, presidente que tinha perdido uma filha devido à febre amarela, resolveu pedir ao Instituto Pasteur que enviasse um especialista nessas epidemias, recebeu de Paris a recomendação de que recorresse a um médico morador no Rio de Janeiro – Oswaldo Cruz, um sujeito tímido, que não era dado a brilharecos, e, portanto, não aparecia muito.
O episódio foi bem relatado por Rui Barbosa:
“No mesmo ano da sua volta ao Brasil começa o país a utilizar os trabalhos do consumado bacteriologista, em quem a madureza do saber tanto precede à dos anos. Já o seu nome entra a chamar a atenção do Governo brasileiro, que o incumbe de ir estudar, em Santos, a peste, ali declarada, a traçar o plano de combate à formidável epidemia, cujos terrores principiam então a nos ameaçar. Osvaldo Cruz reconhece para logo o micróbio de Yersin, certifica a presença da epidemia, e, num relatório cabal, com o desembaraço, a presteza, a segurança de quem pisa em terreno conhecido, formula o sistema de providências, a que deve obedecer a debelação da temerosa enfermidade.
“Mas a sua capacidade vai ser posta à prova em teatro maior. A peste, que em 1899 nos entrara o território por Santos, já em 1900 lavra nesta cidade. Vai-se criar, no Rio de Janeiro, o Instituto Soroterápico, e a Diretoria de Higiene, cometida, nesse tempo, ao Barão de Pedro Afonso, necessita de um profissional, a quem se entregue missão tão árdua quanto a de nacionalizar entre nós os métodos e processos da medicina pastoreana, encetando a produção, no Brasil, do soro contra a peste.
“Não se acredita então que se possa encontrar o homem abalizado para inaugurar aqui essa melindrosa especialidade, senão no próprio Instituto Pasteur. Quem o dirige, é Emílio Roux, o auxiliar de Pasteur nos estudos sobre a etiologia e a vacina do carbúnculo, sobre a atenuação dos vírus, sobre a profilaxia da raiva, o descobridor, com Behring, do soro antidiftérico, o colaborador inesgotável de Metchnikov, de Vaillard, de Borrel e tantos outros em trabalhos magistrais sobre a toxina do bacilo virgolla e o soro contra a cólera, sobre a seroterapia tetânica, sobre as injeções intracerebrais contra o tétano. Que especialista nos indicará essa autoridade tantas vezes consagrada? Escutai-lhe a resposta:
“Entre o pessoal técnico que tenho a honra de dirigir”, diz Emílio Roux, “ninguém possui maior competência do que o Dr. Osvaldo Cruz, cuja capacidade e idoneidade científicas pessoalmente conheci, durante o tempo em que lidou no nosso Instituto” (cf. Rui Barbosa, Discurso pronunciado na sessão cívica de 28 de maio de 1917, no Teatro Municipal, prefácio de Carlos Chagas Filho, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1999).
Em 1903, Rodrigues Alves nomeia Oswaldo Cruz para a Diretoria-Geral de Saúde Pública. O foco, então, era a febre amarela, que assolava o Rio. Cinco dias depois da nomeação, o novo diretor enviou ao seu superior, o ministro da Justiça, um ofício: “A extinção da febre amarela é um problema que já encontrou uma solução prática: podemos, pois, considerá-lo uma questão resolvida”.
Em seguida, ele expôs, no mesmo ofício, as medidas necessárias e os seus planos para combater a febre amarela através da extinção do aedes aegiptii – o mesmo inseto que hoje infesta outra vez o país, transmitindo a dengue.
Oswaldo Cruz acabou com a febre amarela no Rio, o que foi acompanhado pelo conjunto do país, restando as áreas onde ela é uma febre silvestre, ou seja, a Floresta Amazônica.
Ao mesmo tempo, seu combate à varíola, através da vacinação obrigatória, foi o que permitiu o seu controle e, décadas depois, a sua erradicação do país. O mesmo se pode dizer da peste bubônica.
Teve contra si uma vasta parcela da oligarquia, a maioria dos médicos da época e o conjunto da imprensa – um dos seus principais biógrafos dedica um volume inteiro ao material publicado na cruzada contra Oswaldo Cruz. Por fim, até mesmo uma tentativa de golpe de Estado foi tentada contra a vacinação obrigatória. O próprio presidente que o nomeara apelou para que transigisse. Ele respondeu que seu cargo estava à disposição, mas que enquanto estivesse nele não iria colaborar para o fracasso de seu próprio objetivo. Rodrigues Alves recuou do pedido, mas a lei da vacinação obrigatória jamais foi rigorosamente aplicada.
Em torno de si, Oswaldo Cruz reuniu o que havia de melhor na medicina e na ciência brasileira, e inaugurou as expedições científicas ao interior do país e as campanhas de saúde pública. Tornou, assim, a então chamada medicina tropical brasileira a mais importante do mundo, numa época em que a maior sociedade para estudo dessa especialidade localizava-se em Londres, devido às dificuldades dos colonialistas ingleses na Índia e na África.
Ao contrário dos ingleses, que se voltavam para preservar a saúde de seus compatriotas que ocupavam outros países, a ciência de Oswaldo Cruz e seus colegas estava voltada para o Brasil e para o seu povo. Pela primeira vez levavam-se em conta os fatores sociais na eclosão das doenças. O mais explícito exemplo é o “Plano de Combate à Tuberculose”, que Oswaldo Cruz enviou ao Congresso em 1907, onde, ao lado da ação direta contra o bacilo, ele destacou como decisivo o que chamou de “combate indireto”:
“Forneçam-se habitações higiênicas, alimentação abundante e boa, não se permita o trabalho de crianças nas fábricas, evitem-se os esgotamentos orgânicos de causas higiênicas, físicas e morais; enfim, ponha-se todo o conjunto completo capaz de erguer a resistência orgânica, que se terá fornecido ao organismo a arma de luta que fará sucumbir o bacilo assaltante.”
Mais adiante, ele propunha que o Congresso aprovasse uma série de medidas, entre as quais:
“… aposentadoria dos funcionários tuberculosos, seguro obrigatório dos operários nas fábricas, oficinas, etc. contra a tuberculose.”
O Congresso, dominado pela oligarquia, rejeitou o plano.
O Brasil teria que esperar pela Revolução de 30 e por Getúlio, para que essas medidas começassem a ser concretizadas.
2
Em um belo perfil do caráter de Oswaldo Cruz, um de seus discípulos e amigo, Clementino Fraga (pai), escreve:
“O êxito pessoal de Osvaldo Cruz veio da harmonia de seus dotes intelectuais e morais, admiravelmente conjugados no sentido da objetivação, rebelde a injunções momentâneas e a vantagens colaterais que refletem a dubiedade, a cortesia, o sentimento deformado pelo sentimentalismo. Concentrava a atenção em dado problema, gizava o seu programa e perseguia o rumo traçado. Sem quebrar nem torcer, somente obedecia a seus impulsos, fortemente acionados.
“Quando de sua primeira investidura no serviço público, em maio de 1900, tratando de prover o laboratório soroterápico de material necessário à instalação, enviou ao chefe administrativo a lista do indispensável. Este a devolveu, com a recomendação de reduzi-la, e, como não era possível trabalhar sem o material pedido, Osvaldo retirou-se sem dizer palavra e não voltou ao laboratório. O chefe mandou visitá-lo, julgando-o doente; o emissário encontrou-o em plena saúde. Foi então adquirido o material e o técnico voltou ao trabalho, como se nada tivesse havido.
“Em 1902, já em franca atividade o Instituto Soroterápico, sobrevindo nova crise, abandonou Osvaldo Cruz suas funções por incompatibilidade com o chefe. Dessa vez foi este que se exonerou, deixando a Osvaldo completa autonomia técnica e administrativa. Em 1903, convidado para dirigir a Saúde Pública, o governo, sem consultá-lo, inclui no mesmo ato a nomeação de Afrânio Peixoto para o cargo de secretário. Escreveu o novo diretor ao ministro, pedindo que tornasse sem efeito sua nomeação, sem ocultar o motivo porque o fazia. Nobremente, o governo tornou sem efeito a nomeação do secretário, aceitando o nome indicado pelo diretor. Assim procedia altivamente um profissional de trinta anos, ainda quase desconhecido, recusando o posto máximo dos serviços sanitários, que lhe vinha com restrições à sua autonomia.
“Em Berlim, por ocasião de sua vitória na Exposição de Higiene, o parlamentar que mais combateu a administração sanitária desejou visitar o pavilhão brasileiro. Informado de véspera, Osvaldo não compareceu nesse dia para recebê-lo. E justificou, falando a um amigo: ‘não lhe podia ser agradável a presença do chefe dos ‘cafajestes de esmeralda’, e, tampouco a mim, a presença dele.’ Expressão de sensibilidade, que não prescreve com o tempo.
“Em começo da campanha contra a febre amarela houve uma festa de caridade, à qual compareceu. No leilão de autógrafos, apareceu um cartão com esta frase estranha e quase escandalosa em tal ambiente: ‘o mosquito é o único transmissor provado da febre amarela. Gonçalves Cruz.’ Pleno domínio da obsessão, que, fiel a si mesma, não tem o sentido da oportunidade para manifestar-se.
“Alguns aspectos de sua sensibilidade, aparentemente contraditórios, identificam o homem no apanágio de muitos predicados. Numa das cidades do Norte soube Osvaldo da existência de um homem, cuja habilidade chegara à fabricação do órgão para a igreja local, sem outros recursos que os da aldeia pobre em que vivia. Viu a obra e quis ver o artista desconhecido. Era chamado Zé Orgueiro. A expensas suas, encaminhou-o à direção do Instituto Nacional de Música.
“Certa vez, conta Sales Guerra, ‘de partida para a Europa, depois das despedidas no cais Pharoux, dos numerosos abraços, encaminhava-se para a lancha, e já no 3.º ou 4.º degrau da escada de pedra, retrocedeu como se tivesse esquecido qualquer coisa; esgueirou-se por entre a multidão, em demanda do seu automóvel para dar um abraço de despedida ao chofer …’
“Em viagem na Alemanha, aproveitou a parada do trem, em Danemberg, para mandar um cartão postal à governante de seus filhos, com palavras de reconhecimento aos serviços prestados. Era a terra natal da prestimosa auxiliar doméstica.
“Ainda na mesma inspiração de bondade, a Pacheco Leão recomendando um velho servente da Faculdade de Medicina, o fez nos seguintes termos: ‘Leão – Bem conheces o portador; ouve-o e atende-o se for possível. A caridade que pudermos fazer neste caso, será para mim um punhado de flores que atiro sobre o túmulo da minha mocidade.’
“É conhecido seu gesto, quando amigos se reuniram para oferecer-lhe uma lembrança, depois de sua vitória na Saúde Pública. Com muita delicadeza fez chegar à família de um auxiliar, morto no começo da campanha, o resultado da subscrição, em momento em que tal auxílio era oportuno.
Uma feita escreveu a Sales Guerra: ‘Podias indicar-me a residência e o nome daquele teu cliente que empalha animais para coleções zoológicas? Morreu hoje em Manguinhos um cavalo, ao qual estava ligado por laços, não só de muita amizade, como de gratidão: foi o primeiro cavalo que forneceu soro antipestoso; desejava conservá-lo. Já retirei-lhe a pele e a cabeça; resta agora prepará-lo.’
“Um traço de afetividade, que foi de toda sua vida, foi o culto pela memória paterna: iterativamente visitava o túmulo do pai sem esquecer datas afetivas, em momentos de alegria ou de pesar, perspectivas difíceis ou de grata compensação. Refere Sales Guerra: ‘Osvaldo Cruz venerava a memória de seu pai e na prática do respeitoso culto que lhe rendia, encontrava lenitivo e conforto nas repetidas ocasiões de grandes contrariedades. Visitava-lhe o túmulo semanalmente, aos domingos; visitava-o nos nebulosos dias de pena moral; visitava-o ainda quando se ausentava, e quando chegava ao Rio de alguma excursão, era a sua primeira visita, precedia a qualquer outra, só depois dela recolhia-se ao lar.
À chegada de uma de suas viagens, convidou-me no cais para o seu carro; seguimos rumo do cemitério S. João Batista, passamos por sua casa, à Praia de Botafogo, sem parar. No cemitério adiantou-se para o jazigo da família, ajoelhou-se, beijou o granito do túmulo e após alguns instantes de recolhimento levantou-se e partimos, só então, para sua residência.’ Religioso, parecia ter ‘no mesmo culto o nome de Deus e a imagem paterna’.
“Entre quantos o conheceram, entre reservado e sóbrio com os poderosos e indiferente à lisonja, alguns julgaram-no mais orgulhoso que modesto. Recusava sempre manifestações, quando os deveres de delicadeza não o obrigavam. Mas aceitou a láurea acadêmica – pobre honraria com que a vaidade das letras galvaniza o prestígio intelectual, não raro aprumando reputações frágeis ou ambições prematuras. Em regra um acadêmico pode ter outros méritos, não terá, entretanto, o da modéstia. Mas em verdade foi a ‘Academia’ que requestou a Osvaldo Cruz, não diria que cobiçosa de sua glória, mas julgando de meritis que ali devia estar o sábio brasileiro de maior fama dentro e fora do país. Mais de uma vez a amigos acadêmicos que lhe propunham a candidatura, pediu que desistissem da ideia por se não sentir à vontade num grêmio, em sua maioria de homens de letras, ‘mas houve, diz E. Dias, quem afinal se mostrasse molestado, chegando a insinuar que o sábio colocava a sua glória muito acima da investidura acadêmica. Tanto bastou para que, embora constrangido, consentisse na apresentação de seu nome, conforme podem atestar diversos acadêmicos vivos’. Apresentou-se candidato, concorrendo com Emílio de Meneses. Osvaldo desinteressou-se da eleição, principalmente dos incidentes que a cortejam; chegou a dizer, de referência a comentários da imprensa: ‘se há derrota que me não desagradaria é essa … a mim que nunca tentei perpetrar versos.’
“Recusou o sábio a eleição para presidente da Academia Nacional de Medicina. Jamais pensou em ser professor da Faculdade.
(…)
“Em Osvaldo Cruz uma das qualidades mestras era sumir-se, a si mesmo esquecer-se, projetando discípulos e auxiliares. Foi assim sempre, em coerente e idônea compostura. Todos os trabalhos de Manguinhos deveriam ter seu nome. A isto, terminantemente se recusou, argumentando que o fato de ser diretor não o excluía das responsabilidades, como das vantagens. Quando tomaram vulto as pesquisas de Carlos Chagas sobre a nova moléstia, levando a comunicação à Academia de Medicina exaltou apenas o nome do auxiliar, como se nada tivesse com o achado científico. Por essa ocasião, Chagas, nobremente, ponderou que devia associar seu nome às publicações, como de justiça, uma vez que a orientação era toda sua e parte do achado de laboratório. Arriscou então: ‘se o senhor não concorda, não continuarei as pesquisas.’ Respondeu o mestre: ‘você só não continuará, se deixar o Instituto, porque enquanto aqui estiver, receberá ordens.’ E de ambos, sobre o assunto, nem mais uma palavra” (Clementino Fraga, Vida e Obra de Oswaldo Cruz, 2ª ed., Fiocruz, 2005, pp. 207-210/214).
3
Na oração póstuma, pronunciada a 28 de maio de 1917, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, disse Rui Barbosa, ex-adversário de Oswaldo Cruz na questão da vacina obrigatória:
“Este homem, ‘feito de afoiteza e prudência, de imaginação e ponderação, de intuição e crítica’, como Pasteur, era, como Pasteur, ‘uma vontade obstinada, um vigor seguro de si mesmo, uma fé capaz de levantar montanhas’. A esses atributos do seu caráter, não menos do que às qualidades superiores da sua ciência, se deve a gloriosa consumação da sua obra. A independência no espírito necessita de ser servida pela independência na ação.
“Antes de entrar ao cargo, já se revelara ele o homem dessas qualidades, entre nós raras, quando, anunciada a nomeação, para si, de um secretário, sobre cuja escolha não fora ouvido, posto recaísse em nome digno, salvou desde logo a sua autoridade, impondo o eleito da sua confiança. Depois esses predicados se acentuaram, cada vez mais, na sequência dos seus atos, com tal irradiação de superioridade, com tamanha exalação de calor, com uma intensidade tal de convicção, de segurança, de poder galvânico, que, ao cabo de um ano, todo aquele pessoal, toda aquela administração, todo aquele serviço se movia como um só homem, como um instrumento inteiriço e vivo, como os seus próprios nervos e músculos, debaixo da ação da sua vontade, realizando, nas mãos do mais novo, mas do mais notável dos administradores, a mais criadora das administrações.
“Nesse coração, aparentemente absorvido e consumido no amor da ciência e no amor da humanidade, não era menos vibrátil a fibra do civismo. Sua visão não se estreitava no círculo visual do microscópio. Sentia a relação necessária entre os interesses da ciência, na sua autoridade, na sua sinceridade, na sua utilidade, e a observância dos princípios da ordem social. Amando a pátria, amando a liberdade, não perdia de vista os negócios do país: antes os seguia com o discernimento, o zelo e as emoções de uma consciência desinteressada.
“ ‘Quando a aventura boulangista [a candidatura do marechal Hermes] ameaçou subverter a nação com o quadriênio fatídico que nos assolou’, diz um dos seus discípulos em eloquente homenagem à memória do mestre, ‘o eco da campanha civilista chegou ao remanso de Manguinhos, arrancando-nos da indiferença, com que encarávamos as manifestações da política nacional. O próprio Mestre agitou-se, e esteve na iminência de se alistar eleitor. Quando o cataclismo desabou sobre o país, e o pessimismo se assenhoreava de todos, ele não desanimou um só momento, e, cheio de fé, repetia: ‘Os gloriosos destinos do Brasil são infinitamente mais poderosos que quatro anos de desgoverno’.
“Se alguém houvesse auscultado o sussurro desse coração nos transes do passamento, não me engano, creio eu, em supor que lhe perceberia a mesma tristeza de Pasteur, quando, aos 46 anos de idade, ferido de uma hemiplegia, a que cuidou sucumbir, lhe aflorava aos lábios esta queixa: ‘Tenho pena de morrer: quereria prestar ainda mais serviços a minha terra.’ E ainda os prestou; porque só 27 anos mais tarde, aos 73 da sua vida, acabava a carreira mais gloriosa da ciência no século passado.
“Osvaldo pouco mais de metade do lapso dessa existência viveu; e, quando fechou os olhos, aos 42 de nascido [44], a carreira, que tão cedo encerrava, já era a mais benfazeja da ciência brasileira em toda a história da nossa nacionalidade.
“Mas, os serviços de tais homens não se medem pela extensão da sua passagem terrestre, nem pela soma de benefícios que dos seus atos, durante ela, colheu o gênero humano. A grande obra dos benfeitores predestinados está na ilimitada sobrevivência dela aos seus autores, que do seu próprio trespasse revivem todos os dias nos frutos do bem, que plantaram, na corrente de bençãos, que deixaram aberta e borbotante. São fontes de bondade, em que se desentranha a vida efêmera dos mortais imortalizados, para a continuarem, através de séculos e séculos, em caudais de benevolência e caridade.
“Aos salvadores de homens, suscitados pelo céu, o inferno contrapõe os exterminadores de homens. Mas, embora estes passem, carreando na torrente de sangue dezenas de milhões de vítimas, maior, muito maior, sem comparação maior será sempre, na série incessante dos tempos, a seara de vidas, que o gênio dos semeadores da ciência arrebata à voragem da nossa mortalidade, e a messe de almas consoladas que eles salvam das agonias do sofrimento.
“Coube a Osvaldo Cruz a ventura extraordinária de ser um desses raros eleitos, um desses levitas do sacerdócio consagrado à diminuição dos padecimentos humanos. Essas criaturas amadas e benditas, como ele, devem os milagres da sua obra à ação desse deus interior, o En Theon do entusiasmo, bela palavra, uma das mais belas dos nossos idiomas, mas infinitamente menos bela do que o sentimento, que traduz a paixão das grandes inspirações, das grandes aspirações, das grandes abnegações, o heroísmo do trabalho, da justiça e da verdade”.
Esse discurso de Rui é também notável por, a partir da obra de Oswaldo Cruz, enfatizar a proposta, já elaborada anteriormente, de fundar um Ministério da Saúde para o nosso país. Depois de esboçar o difícil quadro sanitário do Brasil, diz o orador:
“Eu, que, há trinta e cinco anos, propugnava a criação, no Brasil, do Ministério da Instrução Pública, não hesitaria hoje, quando a higiene assume entre nós essa importância avassaladora, em votar com Littré pela consagração de um ramo central do Governo a este serviço, se, neste país, as secretarias de Estado se criassem, para se ocupar com os assuntos, que lhes dão os nomes”.
Esta seria, também, uma das conquistas só possíveis com a Revolução de 1930.
4
A obra de Oswaldo Cruz tornou-se alvo de perseguição após o golpe de Estado reacionário de 1964 e a ditadura antipopular e antinacional que se seguiu.
Durante 47 anos após a morte de Oswaldo, sua obra fora o pilar da Saúde Pública brasileira – somente a ditadura tentaria destruí-la.
É verdade que não conseguiu. A própria ditadura, no período Geisel, foi obrigada a recuperar a obra de Oswaldo Cruz. E os perseguidos pelo regime – os que ainda viviam – foram reabilitados após a ditadura.
Mas a fase mais escura dessa época não pode ser esquecida.
Como dissemos em outro lugar, “a hostilidade da ditadura – desde o primeiro momento – aos cientistas e artistas brasileiros foi uma decorrência de sua hostilidade à Nação” (v. Carlos Lopes, HP 16/04/2014, Figuras e figurinhas em 1964: antes e depois do golpe contra o Brasil – 3).
E, em seguida:
“Muitos anos depois, um dos perseguidos, o extraordinário físico brasileiro José Leite Lopes, exilado na Universidade de Strasbourg, França, proibido de pesquisar e lecionar no Brasil, definiu a questão nos seguintes termos:
“Se o projeto nacional do Brasil é abrir as portas para as grandes corporações industriais etc., por que você vai fazer ciência? Para que fazer ciência? Para que procurar tapar a defasagem, se a indústria refinada estrangeira já está lá dentro e os cientistas que fazem os computadores e inventam os computadores estão fora? Se você prepara brasileiro lá dentro, o único emprego que ele terá nesse setor é ir para fora” (v. Leite Lopes, depoimento, 1977, Rio, CPDOC/FGV, 2010).
“A premissa de Leite Lopes é igualmente importante para se entender a atitude do golpe (e não somente a do golpe e de sua ditadura) em relação à ciência – e, também, ainda que de outro modo, sua hostilidade à arte e à cultura nacionais:
“Nos Estados Unidos, nesses países todos, a indústria tem laboratórios de pesquisa que vão absorvendo esse pessoal, que vai fazer pesquisa em laboratório de pesquisa de interesse para a indústria, não somente na universidade. No Brasil isso não existe, porque a indústria é estrangeira. E se amanhã o capitalismo internacional ficar refinado a ponto de dizer ‘vamos fazer pesquisa também no Brasil, empregando cientistas brasileiros’, a minha tese é de que isso não interessa ao Brasil porque se está fazendo pesquisa para interesses estranhos ao Brasil, com poderes de decisão fora.
“A conclusão de Leite Lopes é a seguinte:
“… que esforço fazer para adiantar o Brasil? Essa pergunta não pode ser respondida enquanto não se perguntar qual esforço deve ser feito, no Brasil, para que não somente a ciência e a tecnologia, como a economia e tudo mais, se integre no desenvolvimento para o povo brasileiro. (…) uma vez respondido o problema político, aí vamos pensar no esforço científico.
“Espanta, hoje, no golpe e na ditadura, a tremenda erupção de estupidez, que, inclusive fez o país regredir em áreas onde estava entre os mais avançados do mundo.
“É muito repisada – sobretudo em livros de autores norte-americanos – a história do ‘ano sabático’ de Richard Feynman, de como o futuro Prêmio Nobel de Física, já tendo no currículo sua participação no Projeto Manhattan, veio ao Brasil, aprendeu a ‘tocar frigideira’ e desfilou numa escola de samba carioca no carnaval de 1952. Em alguns, não falta a explicação de que o homem da eletrodinâmica quântica foi atraído pela beleza de nossas mulatas…
“Pode ser verdade – ou pode ser lenda. Pouco se diz, porém, na maioria desses livros, sobre a razão da escolha de Feynman pelo Brasil, e de sua volta ao nosso país, periodicamente, até 1964: nós tínhamos uma das comunidades de físicos mais conceituadas do mundo. César Lattes não era caso isolado, como mostram os nomes de José Leite Lopes, Mário Schenberg, Jayme Tiomno, Roberto Salmeron, Marcelo Damy, Elisa Frota-Pessoa – e estes são apenas alguns. A ciência precisa de uma comunidade de cientistas para que possa florescer. Mas foi à destruição das comunidades científicas, em vários campos do conhecimento, que a ditadura dedicou um particular afinco.
“Além dos físicos, pode-se dizer o mesmo dos cientistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), onde a ditadura instalou uma incapacidade de nome Rocha Lagoa – depois promovido a ministro da Saúde.
“O conceito desse elemento, antes de 1964, foi bem expresso pelo professor Herman Lent, homem conhecido não somente pela coragem, mas, também, pelo rigor:
“O Rocha Lagoa no Instituto estava abaixo da crítica; ninguém dava nada por ele. As pessoas riam quando se comentava da possibilidade dele vir a ser diretor do Instituto. Os trabalhos dele são umas drogas” (cf. Herman Lent, depoimento, 1977, Rio, CPDOC/FGV, 2010).
“Realmente, foi preciso a derrubada do governo constitucional e a instalação de uma ditadura no Brasil para que Rocha Lagoa fosse nomeado diretor da maior e mais conceituada instituição de pesquisas da área biomédica no país.
“Na posse de Lagoa no IOC, o primeiro dos ministros da Saúde do regime ditatorial, o lacerdista Raimundo de Brito (o mesmo que, em 1955, dera abrigo em sua clínica a Café Filho, na tentativa de golpe contra a posse de Juscelino), anunciou os novos tempos:
“As ideias exóticas, que em Manguinhos foram infiltradas, serão banidas definitivamente, porque nosso país precisa de homens que nos ajudem a acabar com o sofrimento do povo e não de elementos cujo único fito é destruir a liberdade, esfacelando o regime democrático. Manguinhos amanhã será uma colmeia de trabalho e não o que queriam alguns, um foco de ideias subversivas” (v. CM 24/06/1964).
“Nessa altura, não precisamos chamar a atenção do leitor para o amor dessa gente à democracia: tivemos 21 anos desse amor extremoso à liberdade.
“Brito já afastara os principais cientistas do IOC das chefias de Divisão: Walter Oswaldo Cruz (Divisão de Patologia); João Teixeira de Freitas (Helmintologia); Hugo de Souza Lopes (Entomologia); Herman Lent (Zoologia); Haity Moussatché (Fisiologia); Moacyr Vaz de Andrade (Estatística); Masao Goto (Micologia); Henrique Veloso (Ecologia); e Fernando Ubatuba (Endocrinologia).
“Ao que parece, Lagoa conseguiu ser nomeado presidente do IOC pela bajulação ao cardeal Câmara e a Dutra. Empossado, fez uma lista de 16 cientistas “subversivos”. Não conseguiu cassá-los. A ditadura temia a reação internacional à cassação de homens com reputação científica estabelecida em todo o planeta. Então, começou a perseguição. Com cadeira cativa no CNPq, Lagoa pressionou para que o órgão cortasse o financiamento às pesquisas dos professores Herman Lent e Haity Moussatché. Até mesmo jovens que, na época, preferiram evitar qualquer definição política – como relatou depois um deles, o virologista Hermann Schatzmayr, que seria, 26 anos depois, presidente da instituição – eram perseguidos, sem que houvesse, aparentemente, algum sentido na perseguição.
“Lagoa era especialmente rancoroso contra Walter Oswaldo Cruz – talvez porque Walter fosse filho do fundador e patrono do IOC. No entanto, Walter era, também, um pesquisador brilhante em hematologia: ‘tinha um laboratório com 50 estagiários, produtivo ao extremo e que foi liquidado pelo ódio sem nome desse Rocha Lagoa’, relatou Herman Lent, em depoimento ao CPDOC.
“Ou, como descreve um trabalho recente:
“A seção dirigida por Walter Oswaldo Cruz foi transferida para local bem menor do que o ocupado, sob a justificativa de que o espaço que ocupava era maior do que o necessário. Para a transferência foi necessária força policial porque os pesquisadores que se recusavam a desalojar o antigo lugar foram acusados de insubordinação. Os cinquenta e oito bolsistas, que sofreram com o corte dos recursos, abandonaram o laboratório, e este passou a ter somente dezesseis assistentes, em 1966. O mesmo laboratório, pouco tempo depois, foi alvo de um levantamento realizado por uma comissão de técnicos da instituição, sob a acusação de que nele havia propaganda subversiva. Durante a revista da comissão só encontraram material científico. O local seria lacrado e as atividades na área completamente paralisadas após a morte de Walter Oswaldo Cruz, vítima de ataque cardíaco, em 1967” (cf. Elaine Kabarite Costa, “Dinâmicas científicas e contingências sociais: um estudo exploratório em Manguinhos”, IOC, Rio, 2011).
“As perseguições paralisaram o IOC. Em 1970, depois de assumir o Ministério da Saúde, Rocha Lagoa patrocinou o “massacre de Manguinhos” – como o professor Lent, um dos atingidos, chamou a cassação pelo AI-5, com proibição de trabalhar no IOC e em qualquer instituição pública, de dez dos maiores pesquisadores do país na área de ciências biológicas, todos com justa fama internacional: Haity Moussatché, Herman Lent, Masao Goto, Augusto Cid de Mello Perissé; Hugo Souza Lopes, Moacyr Vaz de Andrade, Sebastião José de Oliveira, Fernando Braja Ubatuba, Tito Cavalcanti e Domingos Arthur Machado Filho (v. Herman Lent, “O Massacre de Manguinhos”, Avenir, 1978).
“Os laboratórios destes cientistas foram desmontados.
(…)
“O que se tornou a instituição de Oswaldo Cruz nessa época, é bem exemplificado por um discurso de Geisel, cinco anos depois, na V Conferência Nacional de Saúde (1975), colocando como um dos objetivos do seu governo “a recuperação da Fundação Oswaldo Cruz” (cf. Jaime L. Benchimol (coord.), Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada, Rio, Ed. FIOCRUZ, 2001, p. 330).
“Naquele momento, o país enfrentava uma epidemia de meningite.
“Testemunho eloquente é o de Vinícius da Fonseca, designado pelo ministro da Saúde de Geisel, Paulo de Almeida Machado, para a recuperação de Manguinhos – isto é, para presidente da Fundação Oswaldo Cruz.
“Vinícius não era médico, mas economista, e trabalhara na Secretaria de Planejamento da Presidência (Seplan) com João Paulo dos Reis Velloso, na elaboração do II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND).
“Seu depoimento apresenta interesse sob vários aspectos, inclusive a relação do II PND com a Saúde Pública. Existem opiniões suas com que pode-se ou não concordar, mas isso, aqui, não é importante. Eis como descreve a situação, quando tomou posse:
“Manguinhos estava morto. Quando eu assumi, o dr. Paulo de Almeida Machado, ministro da Saúde, disse de viva voz para a plateia: ‘Esse aqui é o homem que vai ressuscitar esse cadáver insepulto’. Palavras dele. (…) Eu vim a saber do famoso ‘massacre de Manguinhos’ já como presidente da fundação. Parece incrível isso! Cassar os direitos políticos de um pesquisador como o Herman Lent, o Haity Moussatché e outros, meu Deus, tem sentido isso? Realmente, não fazia o menor sentido. A minha interpretação é de que havia problemas profundamente pessoais, ódios acumulados durante anos.
“(…) quando houve a revolução de 1964 o Rocha Lagoa dominou o Instituto Oswaldo Cruz. (…) Ele se apossou de Manguinhos com o grupo dele, de extrema direita, sei lá se tinha ideologia nisso. Em 1970, ele foi chamado pelo Costa e Silva para ser ministro da Saúde e se aproveitou do ministério para fazer o chamado ‘massacre’ “ (cf. Um estranho no ninho – memórias de um ex-presidente da Fiocruz, depoimento a Wanda Hamilton e Nara Azevedo, in História, Ciências, Saúde Vol. VIII (1), março/junho 2001, p. 244).
“Rocha Lagoa foi nomeado ministro por Médici em 1969 – e ficou no Ministério até 1972, quando se descobriram algumas trampolinagens na sua operosa gestão, e ele foi obrigado a demitir-se”.
Mas a obra de Oswaldo Cruz, ainda antes do fim da ditadura, seria recuperada.