Quer proteção, tem que pagar (e se não quiser, paga também), dirá Don Trump na cúpula da Otan que acontecerá nos dias 11 e 12, em Bruxelas. E exigirá mais uma vez: “No mínimo, 2% do PIB”
Conforme a Reuters, direto do Air Force One, o presidente Donald Trump dirá a seus parceiros da Otan na cúpula da próxima semana que “os EUA não podem continuar sendo o cofrinho do mundo”, na definição do porta-voz da Casa Branca, Hogan Gidley, na terça-feira (3). Em suma, os países europeus devem pagar pela própria ocupação, que se mantém há décadas, com bases dos EUA no Velho Continente inteiro e dezenas de milhares de tropas norte-americanas, especialmente na Alemanha e Itália.
Como naquele velha máxima de máfia, quer proteção, tem que pagar (e se não quiser, paga também), dirá Don Trump na cúpula que acontecerá nos dias 11 e 12, em Bruxelas. “No mínimo, 2% do PIB”.
“O que o presidente vai fazer é entrar nessas reuniões com a mentalidade de proteger o povo americano, ficar ao lado de nossos parceiros e aliados – mas, como ele disse muitas vezes antes, os Estados Unidos costumam ser o cofrinho do mundo. E isso tem que parar”, disse Gidley a repórteres quando Trump voou para a Virgínia Ocidental. O que tem explicação: o valentão do pedaço anda meio alquebrado, um tanto falido, desde o crash de 2008.
O aumento de gastos com armamentos que Trump está exigindo, em paralelo com a intensificação do cerco à Rússia, a quase diária realização de manobras de guerra da Otan no leste e na região báltica, tem jogado o risco de guerra para um patamar não visto na Europa em anos. Segundo as agências internacionais, Trump enviou cartas desaforadas aos governos dos países da Otan para insistir em que subam imediatamente para 2% do PIB os gastos militares (ao invés de gastarem com coisas supérfluas como aposentadoria, educação ou saúde).
Só Inglaterra, Grécia, Polônia e Estônia cumprem atualmente a meta de Trump na Europa. Segundo a Reuters, o primeiro-ministro belga, Charles Michel, ofendido, disse: “não estou muito impressionado com este tipo de carta”. Com a guerra comercial de Trump em curso, não é propriamente o tipo de discurso que entusiasma os parceiros transatlânticos – não era assim que se dizia antigamente?
Nem a Inglaterra, que costuma arrotar sua condição de aliado “especial”, escapou do puxão de orelha. O chefe do Pentágono, general “Mad Dog’ Mattis, conforme carta de 12 de junho a que a Reuters teve acesso, ameaçou substituir a Grã-Bretanha pela França como seu principal aliado militar. Londres já gasta 2,07% do PIB com armas, bases e guerras.
O que é dito não ser “o suficiente”. O papel global da Grã-Bretanha “exigirá um nível de gastos em defesa além do que poderíamos esperar dos aliados com apenas interesses regionais”, admoestou Mattis. “Eu estou preocupado que sua capacidade de continuar a fornecer esta base militar crítica … está em risco de erosão”, acrescentou.
Mattis pediu um “plano de defesa claro e totalmente financiado” da Grã-Bretanha e disse que espera por uma atualização na cúpula da próxima semana. “Como atores globais, a França e os EUA concluíram que agora é a hora de aumentar significativamente nosso investimento em defesa”, asseverou o carniceiro de Faluja. Deve ser o bromance de Macron com Trump.
A Reuters viu também cartas do governo Trump à Bélgica e à Noruega, enquanto o New York Times informou que Washington fez a mesma cobrança à Alemanha e ao Canadá. Trump destacou em particular a Alemanha, que “tem que gastar mais dinheiro”. No mês passado, Trump reclamou que os membros da OTAN que não contribuíssem totalmente para a aliança seriam devidamente “tratados”.
Atualmente, a Alemanha gasta 1,18% do PIB com as forças armadas, e a meta da coalizão Merkel-SPD é chegar a 2% até 2024. O que significa quase dobrar o gasto militar alemão, que é de 39,5 bilhões de euros pelo orçamento de 2018. O que foi sintetizado pelo jornal especializado em assuntos econômicos em maio, Handelsblatt, com a manchete: “novos bilhões para tanques: a era do desarmamento militar parece ter acabado”.
Merkel e Macron acabam de acertar o desenvolvimento conjunto de um novo avião de guerra, entre outros projetos. Diante da guerra comercial desencadeada por Trump, os países europeus, pondo as barbas de molho, também aprovaram uma força europeia. A expectativa é que a cúpula da Otan de Bruxelas seja ligeiramente mais afável do que a última do G7 no Canadá, mas nunca se sabe. De qualquer forma, não deverá se deter o afã para inchar mais e mais o biombo belicista, cujo objetivo magnificamente descrito por um general americano foi sempre “os americanos dentro, os russos, fora, e os alemães por baixo”.
ANTONIO PIMENTA