
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, cientistas, entidades e órgãos de conservação ambiental reagiram à aprovação, na calada da noite de quarta para quinta-feira (17), do chamado “PL da devastação”, projeto de lei que afrouxa as regras para o licenciamento ambiental no país.
Rebatendo o argumento principal da bancada ruralista, bolsonarista, de que o controle sobre os processos de licenciamento ambiental seriam um atraso para o agronegócio e para o país, a ministra afirmou que “ganhar celeridade não significa perder qualidade”. “A gente pode crescer, gerar prosperidade, emprego, renda digna para o nosso país sem precisar da destruição, do afrouxamento, da amputação da legislação ambiental”, disse.
Marina Silva acredita que a aprovação do PL “é um tiro no pé do agronegócio”. “Se você afrouxa o licenciamento, você vai impedir que a gente continue reduzindo o desmatamento, vai aumentar incêndios, vai aumentar emissão de CO2, vai afetar toda parte do sistema hidrológico do nosso país com prejuízos enormes, principalmente para o agronegócio brasileiro”, disse a ministra.
Segundo ela, “é um verdadeiro tiro no pé esse tipo de afrouxamento dos cuidados ambientais em um país que é altamente sensível como o Brasil, que depende do equilíbrio climático para poder ser uma potência agrícola. Nós só somos uma potência agrícola porque somos uma potência ambiental”, complementou.
“Sem respeitar a legislação ambiental, nós vamos fechar os mercados que nós já conseguimos abrir. O que pesou para abrir mais de 300 mercados nesses dois anos foi exatamente ter um governo que protege o meio ambiente, que passa segurança para as pessoas de que elas não estão fazendo negócios com quem está invadindo a terra dos indígenas, com quem está destruindo a floresta, está contaminando os rios”, alertou Marina.
O projeto, que facilita a licença para empreendimentos com potencial de impacto no meio ambiente, como viadutos, pontes, hidrelétricas e barragens de rejeitos, e dispensa a licença para outras obras, como a ampliação de estradas e para atividades como agricultura tradicional e pecuária de pequeno porte, além do licenciamento automático feito por autodeclaração, sem análise prévia de órgão ambiental, entre outras medidas, vai agora para sanção do presidente Lula.
Marina Silva destacou ainda que “a proteção é assegurada por um bom licenciamento, que faz com que os processos possam ganhar agilidade, qualidade e segurança jurídica. Se cada estado e cada município determinarem o que é risco ambiental de forma diferente na sua unidade da Federação, isso vai criar um processo de questionamento jurídico, de judicialização generalizado”, afirmou a ministra sobre outro ponto do projeto, que prevê que o ente federativo definirá o potencial poluidor das atividades dos empreendimentos.
O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), Rodrigo Agostinho, disse “estar muito apreensivo” com a aprovação do PL. Segundo ele, são “mais de 40 pontos muito complicados no PL e que vão causar insegurança jurídica, inclusive no setor empresarial”, disse.
Já o Instituto Sócio Ambiental (ISA) publicou em seu site análise mostrando que “85% dos empreendimentos de mineração seriam autorizados por licenças simplificadas, segundo o texto aprovado” e que “cerca de três mil áreas protegidas seriam ameaçadas e uma extensão do tamanho do Paraná pode vir a ser desmatada se nova lei não for vetada”.
Para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a provação do PL “representa um retrocesso significativo na legislação atual, flexibilizando todas as etapas do licenciamento ambiental, com redução de instrumentos e normas, dispensa de estudos e monitoramento de impactos e diminuição do poder da fiscalização por parte dos órgãos públicos”.
O órgão classifica que a situação é ainda mais grave para as Áreas de Proteção Ambiental (APAs), que perderão totalmente a participação do ICMBio no processo de licenciamento.
“Considerando que muitas dessas unidades são extensas e abrangem diversos estados e municípios, a ausência de acompanhamento preventivo pode gerar conflitos com atividades incompatíveis com os planos de manejo aprovados. Nestes casos, o projeto prevê que o ICMBio atue apenas de forma reativa, por meio de vistoria e fiscalização, quando os danos já estiverem em curso. É uma lógica perversa: lidar com o problema depois que ele acontece, ao invés de trabalhar para evitá-lo”, destaca.