WALTER NEVES
Pesquisador Sênior
Instituto de Estudos Avançados – USP
Conforme dissemos no nosso último boletim, denominado “Em busca dos últimos neandertais”, ocorreria entre 20 de abril e 4 de maio uma missão brasileira-romena às grutas do Vale do Varghis, na parte Oeste dos Montes Cárpatos, para buscar os últimos neandertais que viveram na região. Aqui estamos. Após uma semana de trabalho de campo, a equipe brasileira está se dedicando a buscar grutas e cavernas que ainda não foram exploradas pelos nossos colegas romenos (Marian Cosac, George Muratoreanu e Stefan Vasile).
Tivemos, até o momento, apenas sucesso parcial, já que a maioria das cavernas com acessibilidade já foram de alguma maneira exploradas, seja pelos nossos colegas, seja por amadores que os precederam. Uma outra limitação é que a maioria das cavernas nos Montes Cárpatos está localizada em penhascos altos e lisos, o que dificulta imensamente o acesso a elas, colocando em risco a integridade física da equipe.
Os romenos, por sua parte, deram sequência à escavação do abrigo 122, extremamente promissor, cujas datações, embora questionáveis, parecem atingir até cerca de 200 mil anos. Logo no início da retomada das escavações em uma unidade já aberta no passado foi encontrada uma belíssima ponta Levallois (musteriense).
Um fator muito interessante e enigmático no Vale do rio Varghis é que, até agora, não foram encontrados ali vestígios do Paleolítico Superior que, em princípio, caracterizaria uma ocupação por parte do Homo sapiens. Os arqueólogos locais tem sinonimizado a existência de uma indústria musteriense à uma ocupação neandertal no Varghis. Mas isso não é necessariamente verdade, já que o sapiens também fazia esse tipo de indústria, desde o seu aparecimento na África, há cerca de 230 mil anos, até exatamente 45 mil anos, quando, aí sim, desenvolveram a indústria do Paleolítico Superior.
Mas nossos colegas romenos não estão necessariamente equivocados. De fato, os vestígios mais antigos de homens modernos nos Bálcãs coincidem exatamente com essa marca de 40 mil anos, sendo que os três crânios antigos conhecidos na Romênia (Norte dos Bálcãs) mostram uma morfologia claramente moderna. Mas isso também é uma simplificação. Quando esses crânios são examinados mais detidamente, eles apresentam alguns poucos traços neandertais, sugerindo que houve mixagem biológica entre essas duas espécies.
O DNA extraído desses crânios mostram, de fato, uma contribuição neandertal para essa população entre 3% a 6% do seu genoma. Mas até agora, nunca foi encontrado um crânio neandertal nos Bálcãs. Nossa principal missão é encontrar pelo menos um espécime dessa espécie. Ocorre que isso poderá levar anos de trabalho. Só estamos começando e a continuidade de nossas pesquisas colaborativas vai depender da generosidade de nossos financiadores (Fapesp e CNPQ). É como procurar uma agulha no palheiro. Além disso, se as pesquisas no Varghis falharem nesse sentido, outras áreas da Romênia poderão ser exploradas, já que a presença de brasileiros na arqueologia romena tem sido calorosamente recebida. Em breve mandaremos mais notícias diretamente da Transilvânia.