“Eu tenho que o próprio presidente da República é fonte de preocupação hoje [para a Lava Jato]”, afirmou Carlos Fernando dos Santos Lima
O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima afirmou, em entrevista ao site da BBC News Brasil, publicada na terça-feira (3), que está havendo revezes na Lava Jato também por conta da ação do Planalto. “O próprio presidente da República (Jair Bolsonaro, do PSL) com algumas decisões, como a transferência do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] para o Banco Central”, lembrou.
“Nós temos também questões relativas à Receita Federal. Não sei se por causa das investigações sobre o filho (o senador Flávio Bolsonaro, do PSL-RJ), o presidente tem tentado essas medidas, que na verdade tiram um dos pilares básicos da Operação Lava Jato, a relação entre instituições e agentes se auxiliando mutuamente”, disse o procurador.
“Agora, com este Coaf no Banco Central e sem liberdade de se comunicar com o Ministério Público; e com a Receita também ameaçada de diminuição de sua independência, nós temos realmente uma situação dramática. Eu tenho que o próprio presidente da República é fonte de preocupação hoje”, prosseguiu Carlos Fernando.
Para ele, Jair Bolsonaro, “para tentar dificultar as investigações em relação ao Flávio Bolsonaro, infelizmente, uma questão menor, um crime dos mais banais envolvendo políticos, a “rachadinha” dos salários no gabinete, está inviabilizando o combate à corrupção no Brasil”.
O ex-integrante da Força-tarefa da Lava Jato disse que não esperava apoio do governo para a Lava Jato, segundo ele, “porque a Lava Jato não precisa de ninguém para ajudar”.
“Agora, por exemplo, o que nos preocupa é a escolha de um procurador-geral da República contrário à Lava Jato. Nós tivemos dias atrás um candidato, um nome que voltou da aposentadoria irregular que lhe tinha sido deferida, dizendo já de cara sobre a ilegalidade da operação”, denunciou (refere-se ao subprocurador-geral Antônio Carlos Simões Martins Soares).
“Então, escolher um procurador-geral que seja reconhecido pela classe (dos procuradores) dentro da lista tríplice (elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República, a ANPR) já seria um fortalecimento da Lava Jato, porque ela se baseia na independência do Ministério Público. Não mexendo com a independência do MP já estaria muito bom”, defendeu Carlos Fernando.
Ele falou também do envolvimento de empreiteiras nos esquemas de propinas e defendeu mudança da legislação para que elas possam mudar de donos e continuar atuando no mercado. “Quem tem de buscar uma solução são os legisladores”, argumentou.
“Acho que é possível salvar as empresas, só que não podemos é salvar o capital da família Odebrecht”, acrescentou Carlos Fernando. “Tenho de pensar numa alternativa, como desapropriar as cotas ou as ações das empresas; transferir esse valor para um depósito judicial para que sejam ressarcidas as vítimas dos crimes”, defendeu. “
“Depois, se sobrar, devolve para a família. E coloca-se essa empresa no mercado acionário, com uma abertura de capital, para torná-la pública efetivamente. Mas a solução não está na mão da Lava Jato. A Lava Jato só releva o fato criminoso (…)”, completou Carlos Fernando.