Fez alerta contra ‘opressão do arbítrio’
Ministro Celso de Mello considera fala de filho de Bolsonaro ameaçando fechar o Supremo “inconsequente e golpista”
Abaixo, reproduzimos a nota do decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, sobre as declarações do filho de Bolsonaro, de que “se quiser fechar o STF, você não manda nem um jipe, cara, manda um soldado e um cabo. Não é querendo desmerecer o soldado e o cabo não”.
O filho de Bolsonaro disse o seguinte, numa suposta aula para candidatos a entrar na Polícia Federal (PF), antes do primeiro turno das atuais eleições:
“Cara, se quiser fechar o STF sabe o que você faz? Você não manda nem um jipe, cara, manda um soldado e um cabo. Não é querendo desmerecer o soldado e o cabo não. O que que é o STF, cara? Tipo, tira o poder da caneta de um ministro do STF, que que ele é na rua? Se você prender um ministro do STF, você acha que vai ter uma manifestação popular a favor dos ministros do STF? [aqui, o pequeno Bolsonaro bateu palmas] Milhões na rua?”
O STF, no ordenamento jurídico estabelecido pela Constituição de 1988 é o órgão máximo da Justiça – do Poder Judiciário – e, especificamente, é a autoridade final em questões constitucionais.
Portanto, fechar o STF equivale a fechar a Justiça – e, especificamente, a dispensar a Constituição. Como pode haver uma Constituição, se não há órgão para definir a sua aplicação?
Pode ser que o filho de Bolsonaro não tenha pensado em nada disso, mas apenas porque não pensa. O que ele faz é repetir o golpismo ditatorial do pai. Mas que é esse o significado do que falou, é esse.
Estamos longe de achar que o STF, nos moldes atuais, é perfeito. Mas Bolsonaro não quer aperfeiçoá-lo. Segundo o filho, quer fechá-lo.
Sobre isso, o decano do STF, ministro Celso de Mello, emitiu a seguinte nota (as maiúsculas estão na nota divulgada pelo ministro):
“ESSA DECLARAÇÃO, ALÉM DE INCONSEQUENTE E GOLPISTA, MOSTRA BEM O TIPO (irresponsável) DE PARLAMENTAR CUJA ATUAÇÃO NO CONGRESSO NACIONAL, mantida essa inaceitável visão autoritária, SÓ COMPROMETERÁ A INTEGRIDADE DA ORDEM DEMOCRÁTICA E O RESPEITO INDECLINÁVEL QUE SE DEVE TER PELA SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA!!!! VOTAÇÕES EXPRESSIVAS DO ELEITORADO NÃO LEGITIMAM INVESTIDAS CONTRA A ORDEM POLÍTICO-JURÍDICA FUNDADA NO TEXTO DA CONSTITUIÇÃO! SEM QUE SE RESPEITEM A CONSTITUIÇÃO E AS LEIS DA REPÚBLICA, A LIBERDADE E OS DIREITOS BÁSICOS DO CIDADÃO RESTARÃO ATINGIDOS EM SUA ESSÊNCIA PELA OPRESSÃO DO ARBÍTRIO DAQUELES QUE INSISTEM EM TRANSGREDIR OS SIGNOS QUE CONSAGRAM, em nosso sistema político, OS PRINCÍPIOS INERENTES AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO!”
Entrevistado no Rio de Janeiro, antes de saber que a declaração fora de seu filho, o candidato Bolsonaro disse que “se alguém falou em fechar o STF, precisa consultar um psiquiatra”.
Logo em seguida, depois de saber que a declaração era de seu filho, Eduardo Bolsonaro, disse que duvidava que este tivesse feito tal declaração. Após, ainda, disse que “alguém tirou do contexto”.
O contexto era uma suposta “aula” para gente que ia fazer o concurso da PF. Não sabemos quem teve a ideia de convidá-lo. Eduardo Bolsonaro mal fala português corrente (é aquela espécie que repete “cara” ou “tipo”, como se isso fosse o conteúdo de uma enciclopédia – e quando até isso falta, completa com alguns palavrões. P. ex., nessa mesma “aula”: “você vai ter que ter um culhão filho da puta”, etc.).
[NOTA: Alguns outros débeis elevaram esse rebento bolsonariano a “deputado mais votado da história do Brasil”. Não é verdade. Eduardo Bolsonaro teve 5,58% dos votos do eleitorado paulista. O deputado mais votado da História do Brasil continua sendo Leonel de Moura Brizola, votado por 25% do eleitorado do Estado da Guanabara, nas eleições de 1962.]
Mas, continuando: o vídeo do filho de Bolsonaro, dizendo que basta um soldado e um cabo para fechar o STF, existe – e nada foi tirado do contexto.
Portanto, ou Bolsonaro manda o filho para o psiquiatra ou confessa que ele expressou a opinião do pai – as duas coisas é que não pode ser. Pensando bem, até pode ser – e, na verdade, ele não vai confessar nada nem mandar o filho para o psiquiatra, porque sabe perfeitamente que seu filho apenas repetiu algo que ouviu e não é difícil descobrir de quem.
Foi o próprio Bolsonaro (pai) que disse, na Câmara dos Deputados: “Sou a favor sim de uma ditadura, de um regime de exceção“.
Ou: “Não há menor dúvida, [se fosse presidente] daria golpe no mesmo dia! Não funciona! E tenho certeza de que pelo menos 90% da população ia fazer festa, ia bater palma, porque não funciona. O Congresso hoje em dia não serve pra nada, xará, só vota o que o presidente quer. Se ele é a pessoa que decide, que manda, que tripudia em cima do Congresso, dê logo o golpe, parte logo para a ditadura“.
Ou: “Pau-de-arara funciona. Eu sou favorável à tortura, tu sabe disso“.
Ou: “Através do voto você não vai mudar nada nesse país, nada, absolutamente nada! Só vai mudar, infelizmente, quando, um dia, nós partirmos para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime militar não fez. Matando uns 30 mil, começando com o FHC, não deixar pra fora não, matando! Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente“.
Alguém tem dúvida que aquilo que o filho de Bolsonaro falou é somente a repetição do que diz o pai?
ESSES JOVENS
O candidato a vice de Bolsonaro, o sagaz Mourão, foi por outro caminho: declarou que o filho de Bolsonaro foi vítima de um “arroubo juvenil”.
“Arroubo juvenil”, antigamente, era algo que se cometia aos 16 anos, no máximo aos 20 anos.
Mas o filho de Bolsonaro tem 34 anos – e vai para o segundo mandato de deputado federal.
É verdade que, no primeiro mandato, sua única iniciativa conhecida é um projeto para permitir que os passageiros de avião viajem armados, abolindo qualquer controle (nas palavras do projeto apresentado pelo filho de Bolsonaro, “o embarque armado consiste no ingresso na aeronave portando consigo a arma de fogo, com possibilidade de acesso imediato ao instrumento e emprego em caso de necessidade, durante todo o período de voo”, sendo proibido às companhias aéreas qualquer anotação sobre “identidade funcional, número de registro da arma, quantidade de munições ou quaisquer outras informações relacionadas ao porte de arma de fogo”).
Nós, aqui, até que não somos contra o porte de armas em geral. Mas… dentro de um avião?
Portanto, talvez Mourão quisesse dizer, com “arroubo juvenil”, que o filho de Bolsonaro é algo retardado.
Não sabemos se é. Mas que ele não tem nenhuma autonomia, nenhum pensamento próprio, sendo apenas um papagaio, uma extensão ou “remake” do pai, um repetidor de suas aberrações e atentados à cultura e à civilização, isso é fato.
Aliás, nem voto ele tem. Tudo é do pai – com exceção, talvez, da careca.
Porém, mostrando que é macho pacas, o filho de Bolsonaro, quando viu a encrenca, declarou que “citei uma brincadeira que ouvi de alguém na rua”.
Como disse o ministro Alexandre de Moraes, do STF, “não é possível que simplesmente se afirme isso e depois se diga que estava brincando. Não se brinca com a democracia, não se brinca com o Estado de direito, não se brinca com a estabilidade republicana. Eleições, democracia, República são coisas sérias. E essa seriedade vem sendo garantida exatamente pela Constituição de 1988”.
Moraes estava em um evento comemorativo dos 30 anos da Constituição. E disse o que pensava: “É inacreditável que no Brasil, no século XXI, com 30 anos da Constituição, ainda tenhamos que ouvir tanta asneira vinda da boca de quem representa o povo. Tais afirmações merecem, por parte da Procuradoria-Geral da República, imediata abertura de investigação porque, em tese, há de se analisar o contexto geral, isso é crime tipificado na Lei de Segurança Nacional, pelo art. 23, inciso III: incitar a animosidade entre Forças Armadas e instituiçòes civis. É crime previsto pela lei” (v. “Isso é crime pela Lei de Segurança Nacional”, afirma Ministro Alexandre de Moraes sobre filho de Bolsonaro).
Quanto ao presidente do STF, Dias Toffoli, levou um tempo imenso para se manifestar – e só o fez depois que vários ministros do Tribunal (os já citados e outros, sobretudo o ministro Luiz Alberto Barroso e a ministra Cármen Lúcia) exigiram dele um pronunciamento.
Mas Toffoli emitiu apenas uma nota burocrática (“O Supremo Tribunal Federal é uma instituição centenária e essencial ao Estado Democrático de Direito. Não há democracia sem um Poder Judiciário independente e autônomo. O País conta com instituições sólidas e todas as autoridades devem respeitar a Constituição. Atacar o Poder Judiciário é atacar a democracia”).
Desde sua declaração de que o golpe de 1964, que instalou uma ditadura de 21 anos, não foi um golpe, Toffoli está tentando se compor com Bolsonaro e caterva.
Bem característico de um sujeito cuja carreira é devida, exclusivamente, a Lula e ao PT.
C.L.
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