Em entrevista ao HP, Deyvid Barcelar, coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP), falou sobre o movimento entre trabalhadores e empresários em defesa pela reindustrialização do país. Para Bacelar, “uma parcela dos empresários enxerga que há condições de termos uma pujante indústria. Um grande exemplo é a CNI (Confederação Nacional da Indústria), presidida pelo baiano Albano”, ressalta.
Para o líder sindical da CUT, “sem dúvida alguma é possível essa unidade numa frente ou num pacto entre empresários e trabalhadores pela reindustrialização. O pacto é necessário para enfrentar os inimigos da indústria brasileira”, que no seu entender “são os que vivem da especulação no mercado de capitais. Como diz Jessé Souza, ‘a nossa elite do atraso’”.
“E a Petrobrás tem um papel preponderante num programa de reindustrialização do Brasil”, ressalta. Para ele, a Petrobrás tem uma capacidade de investimento incomparável com qualquer empresa brasileira e também com relação à capacidade de investimento do Estado.
“Temos um país com a matriz elétrica 85% renovável. Nós temos um país que tem a sua matriz energética 52% renovável. Nenhum país do G20 tem essas características”. Deyvid também defendeu a exploração da Margem Equatorial, destacando que “hoje nós somos autossuficientes na produção de petróleo. O país já exporta mais de 2 milhões de barris de petróleo por dia e é inadmissível que haja a possibilidade de voltarmos a ser um país dependente de importação de petróleo”.
Considera que a Petrobrás é uma empresa pública estatal que precisa ser um instrumento de desenvolvimento econômico, social e sustentável, principalmente a partir da neoindustrialização brasileira.
Leia a seguir a íntegra da entrevista.
HP – Por que a FUP é favor da exploração da Margem Equatorial?
Dayvid Bacelar – A FUP é a favor da exploração da Margem Equatorial por conta da segurança energética brasileira. A curva de produção do pré-sal terá início a partir de 2032. E, devido a isso, o país necessita de novas margens exploratórias, a exemplo da Margem Equatorial e da Bacia de Pelotas.
Hoje, nós somos autossuficientes na produção de petróleo. O país já exporta mais de 2 milhões de barris de petróleo por dia e, para atender a demanda interna e garantir a nossa soberania energética, é inadmissível que haja a possibilidade de voltarmos a ser um país dependente de importação de petróleo.
É muito importante que tenhamos o licenciamento ambiental para que esse poço pioneiro seja perfurado e consigamos identificar se de fato há petróleo ou não, como já sinalizam os estudos geológicos e a produção de petróleo existentes na Guiana e em Suriname, essa grande reserva que vai desde o Amapá até o Rio Grande do Norte.
Mas a FUP também entende que essa nova reserva e descoberta, que já é uma das maiores do mundo, precisa ser utilizada de maneira diferenciada, principalmente de forma dialogada com as comunidades que serão impactadas na região norte e nordeste do país, fazendo com que, então, esse desenvolvimento econômico seja também social e sustentável. Que essa grande riqueza, a ser gerada através da exploração e produção de petróleo e gás na Margem Equatorial, seja utilizada para a transição energética justa e inclusiva.
HP – Qual pode ser o papel da Petrobrás num programa de reindustrialização do país?
D.B – A Petrobrás tem um papel preponderante num programa de reindustrialização ou neoindustrialização do Brasil. A Petrobrás tem uma capacidade de investimento incomparável com qualquer empresa brasileira e também com relação à capacidade de investimento do Estado. Então é uma empresa pública estatal que precisa ser um instrumento, como já disse, de desenvolvimento econômico, social e sustentável, principalmente a partir da neoindustrialização brasileira. Nós temos uma oportunidade ímpar que está em voga hoje, que é dessa nova indústria da transição energética.
Estamos falando não somente da geração de energia limpa ou renovável a partir da energia eólica ou solar, mas principalmente na produção de “combustíveis verdes” ou com baixas emissões de gases de efeito estufa ou combustíveis sustentáveis, principalmente a partir de uma tecnologia já existente na Alemanha e China, que precisa ser desenvolvida aqui no Brasil através do potencial que a Petrobrás tem, com o seu gigantesco centro de pesquisas, que é um dos maiores e melhores do mundo e com a sua capacidade atual de investimentos. A Petrobrás tem no seu planejamento estratégico a sinalização de investimentos em mais de 100 bilhões de dólares, desses 15,1 bilhões de dólares precisam ser destinados para a transição energética.
Por exemplo, na Bahia nós temos esse grande potencial de geração de energia eólica e solar, incomparável com todos os estados do Brasil e incomparável com vários países do mundo. Por que então não termos uma refinaria verde instalada no estado da Bahia? Precisamos aproveitar essa potencialidade, que é específica do nosso estado, utilizando esse gigante polo petroquímico e a indústria de mineração já existente no estado da Bahia, consequentemente no Nordeste e no Brasil.
Entendemos que a Petrobrás pode ajudar o Brasil a ser esse grande país produtor de energias renováveis. O objetivo é que a Petrobrás consiga fazer os seus investimentos em energias renováveis, em combustíveis sustentáveis, promovendo esse amplo diálogo com as comunidades quilombolas, as comunidades indígenas, ribeirinhas, os povos originários e os trabalhadores e trabalhadoras que precisam ter empregos garantidos e empregos de qualidade.
HP – Quem são os inimigos da indústria? A FUP apostaria numa participação de fato dos empresários da indústria num programa de desenvolvimento nacional baseado no fortalecimento do mercado interno e no investimento público?
D.B – Os inimigos da indústria brasileira, sem dúvida, são os grandes rentistas, ou seja, aqueles que vivem apenas de investimentos financeiros ou da especulação no mercado de capitais. Como diz o Jessé Souza, “a nossa elite do atraso”.
O país sempre teve um grande potencial produtivo devido às suas características, pelas suas riquezas minerais, pelo seu povo trabalhador, pela sua condição de um país continental e com uma estabilidade política nos últimos tempos. Mas sofreu um processo de desindustrialização gigantesco nos governos Temer e Bolsonaro, por conta dos interesses desses rentistas e nossa elite do atraso, que nunca acreditou que o país pudesse ser uma potência internacional.
Nós temos aqui no Brasil uma das maiores taxas de juros do mundo, por conta dessa “independência do Banco Central”. Entendemos que essas taxas da Selic hoje, às alturas, como disse, uma das maiores do planeta, apenas atrapalham e também somam com essa luta contrária à indústria nacional feita pela nossa elite do atraso. Hoje, uma parcela desses empresários da indústria brasileira enxerga que há condições políticas, econômicas, jurídicas, legais, de termos uma pujante indústria a partir dessa neoindústria que tanto tem defendido o nosso vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin. Um grande exemplo é a CNI (Confederação Nacional da Indústria), hoje presidida pelo baiano Albano.
HP – É possível a unidade entre empresários e trabalhadores pela reindustrialização do Brasil?
D.B – Sim, sem dúvida alguma é possível essa unidade numa frente ou num pacto entre empresários e trabalhadores pela reindustrialização ou neoindustrialização do país. Como acabei de citar, tanto a CUT e as demais centrais brasileiras, como também a CNI, ou seja, os empresários da indústria brasileira, entendem que o país hoje tem condições de desenvolver essa neoindústria a partir de um pacto entre o governo do presidente Lula, os grandes empresários da indústria brasileira e a classe trabalhadora brasileira.
Até porque os empregos de qualidade, com maiores salários, com melhores benefícios, eles são gerados na indústria. Consequentemente, uma capacidade de consumir melhor nessas regiões. Então, há essa possibilidade. Os diálogos existem entre as centrais sindicais e principalmente junto à CNI. Agora, entendemos que os benefícios ou subvenções, subsídios que são dados pelo governo federal à indústria, como foi feito em governos passados, a exemplo do Lula 1, Lula 2, Dilma 1, eles precisam também serem revertidos em garantia e estabilidade de emprego, ou seja, uma maior geração de emprego com uma garantia de que a classe trabalhadora não será apenas utilizada para gerar mais-valia para esses grandes empresários.
HP – Dá para reindustrializar com as maiores taxas de juros do mundo e com déficit zero?
D.B – Infelizmente esse é o maior problema para esse programa de neoindustrialização, reindustrialização do país. Por conta disso, o presidente Lula avança na mudança da presidência do Banco Central e de sua diretoria, o que nos faz ter uma crença de que essas taxas de juros serão reduzidas. Até porque, como eu disse, a nossa elite do atraso vai preferir pegar o seu capital e investir na especulação do mercado de capitais. Para alguns da nossa elite, será um retrocesso, uma perda de possibilidade de ganho financeiro ainda maior. Então, sem dúvida, a taxa de juros é um grande inimigo desse processo de reindustrialização ou neoindustrialização no país. E as altas taxas precisam ser combatidas. Acreditamos, como disse também, que o novo presidente do Banco Central, Galípolo, enfrentará esse tema e que tenhamos um crescimento econômico e da nossa indústria ainda maior nos próximos anos de 2025 e 2026.
HP – A geopolítica internacional é favorável a um programa de desenvolvimento?
D.B – Hoje temos um país, por exemplo, com a matriz elétrica 85% renovável. Nós temos um país que tem a sua matriz energética 52% renovável. Nenhum país do G20 tem essas características. Então, óbvio que a Europa e a Ásia vão querer que o Brasil se torne apenas um exportador dessa energia para esses continentes no planeta. Jamais terão o intuito e interesse de verem o Brasil desenvolver as tecnologias do eletrolisador, dos aerogeradores, das placas fotovoltaicas, mesmo tendo, como dissemos, as condições ideais, tanto com relação a minérios críticos quanto a energias renováveis.
Para produzirmos esses combustíveis verdes, sintéticos ou sustentáveis, com baixa emissão de gases de efeito estufa, que são os combustíveis do futuro, é um desafio gigantesco que o Brasil terá pela frente. Atrair esses investimentos para o país e desenvolver essa neoindústria aqui nesse grande celeiro mundial, que poderá ser sim um grande exportador. Não dessa energia como commodity, mas dos combustíveis do futuro, que são oriundos de tecnologias que utilizam as energias verdes ou renováveis ou limpas. Por isso a Petrobrás é fundamental para conseguir ajudar o Brasil a desenvolver essa indústria.
CARLOS PEREIRA